15 | I Série - Número: 009 | 4 de Outubro de 2008
nenhuma consequência daí resulte. O que isto significa é que, ao quadro actual de «inconstitucionalidade por omissão» que o Governo tanto refere (por não haver uma lei que impeça a concentração), o Governo responde legalizando-a! No tocante aos «poderes de influência», a proposta do Governo permite que uma só empresa de comunicação social detenha metade da circulação ou audiências, mas, se ultrapassar esse «limite», basta que se demonstre que estão salvaguardados o pluralismo e a independência e o processo é arquivado!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Com esta proposta, o Governo estabelece como obrigatória a propriedade privada nos media, impedindo toda e qualquer entidade pública de ter actividades de comunicação social, e fálo sem qualquer fundamentação, sem um único argumento, para além do preconceito ideológico.
Ora, o Governo, mais uma vez, não respondeu à pergunta do PCP sobre esta matéria.
E a questão aqui não é a de saber se o Estado ou alguma entidade pública deve ou não deve, em dado momento, ter actividades de comunicação social; a questão é se pode ou não pode. E a resposta do Governo é: proíba-se! Está aqui uma certa concepção de democracia, em que o pluralismo, o direito constitucional dos cidadãos a informarem-se, a informar e a serem informados, o direito de as pessoas exprimirem as suas opiniões e a liberdade de expressão no espaço público são, afinal, um privilégio dos ricos, principalmente dos muito ricos.
É, no fundo, uma questão de classe, em que o Governo PS assume uma opção muito clara.
E não tenhamos medo das palavras. Relativamente ao Jornal da Madeira, sabem V. Ex.as muito bem que o PCP, desde há muito, enfrenta os desmandos de manipulação e silenciamento que ali acontecem. Mas a solução não é a proibição geral de as entidades públicas terem jornais, como, de resto, o combate ao «jardinismo» não se faz acabando com a autonomia regional.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Primeiro, porque isso significa que, para o Governo PS, o Jornal da Madeira poderia fazer tudo o que tem feito, desde que não fosse público, porque aí já não havia qualquer problema; depois, porque o Governo, com isto, está, afinal, a dizer que, em matéria de independência perante o poder político e económico, só o capital privado é de confiança. Se não fosse tão grave, Sr. Ministro, seria a piada do ano.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Perante uma proposta destas, não é para admirar que o Sr. Ministro, instado na comissão por um Deputado do PS a dar exemplos de outros países com leis de não concentração, se tenha lembrado — vejam bem! — da experiência da Itália do Sr. Berlusconi!...
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ah foi!?...
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Pouco faltou para dizer que «o segredo está na massa»! Esta proposta de lei do Governo não tem uma palavra sobre imprensa regional, sobre imprensa temática ou especializada, sobre canais temáticos de televisão ou rádio, sobre portais de informação na Internet e sobre o domínio do mercado publicitário; nada tem de concreto sobre os mecanismos de medição e apuramento de audiências; e não tem sequer uma palavra sobre as famosas «sinergias» no plano laboral, que mais não são do que um ataque aos direitos e a exploração levados ao extremo.
Esta proposta de lei do Governo, engalanada como factor de pluralismo, de independência e de não concentração da comunicação social, acaba por ser não mais que um «seguro de vida» para os grupos económicos que já hoje dominam o sector.
O problema está no preço que o País e a democracia têm de pagar por isso. E também aqui está a fronteira entre políticas de direita e de esquerda.