16 | I Série - Número: 032 | 22 de Dezembro de 2010
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É esta a estratégia de abrir caminho à entrada dos privados neste sector, nomeadamente numa área onde, por exemplo, no transporte aéreo e no transporte ferroviário, assistimos já a importantes movimentações dos interesses privados e dos grupos económicos das transnacionais.
É verdadeiramente isto que está em causa: uma política de classe para baixar salários, para ameaçar e chantagear o futuro dos trabalhadores do sector, mas também abandonando à sua sorte milhares e milhares de portugueses do interior do País e suprimindo centenas de quilómetros de caminho-de-ferro, suprimindo serviços e horários, mesmo nas áreas metropolitanas. Quando ouvimos a argumentação de que há pouca procura, de que as pessoas são poucas, não merecem o comboio, não merecem o transporte público, perguntamos: então e o corte de serviços ferroviários na Grande Lisboa e no Grande Porto? Então e o corte de circulações no transporte fluvial, na linha do Seixal para Lisboa, na Transtejo, na zona onde a linha tem tido exactamente maior procura na hora de ponta da manhã?! É uma inconsistência absoluta que deixa à evidência o verdadeiro propósito deste Governo e desta política de direita, em que PS e PSD convergem, que é a destruição do serviço público e a abertura do caminho à privatização.
Srs. Membros do Governo, esta é uma política inaceitável, que está a conduzir o País ao desastre, que vai tornar pior a acessibilidade dos portugueses ao transporte público e ao serviço público, que vai pôr mais pessoas (aquelas que podem), e ainda mais do que antes, a utilizar o transporte individual, com terríveis consequências para a própria dívida externa do País e para a factura energética da nossa economia.
Srs. Membros do Governo, deixo uma última nota para referir que quando ouvimos dizer — e ouviremos, certamente, neste debate — que é preciso aumentar o preço dos transportes porque desde 2008 não havia aumentos, queremos aqui reafirmar com muita clareza o seguinte: desde 2008 o preço dos combustíveis baixou — nesta altura, estamos a retomar o mesmo caminho de subida do preço dos combustíveis — , mas a verdade é que quando baixou o preço dos combustíveis não baixaram as tarifas; as tarifas mantiveram-se altas e as pessoas foram penalizadas. E agora, com os salários reduzidos e as reformas congeladas, um aumento do tarifário de 3,5% a 4,5% é verdadeiramente criminoso do ponto de vista social e mesmo em termos económicos.
Não podemos, pois, aceitar esta política que, com a bênção do PSD, o Governo quer impor.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Vera Jardim): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.
O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda traz hoje aqui a debate um tema genérico sobre política de transportes. Não é fácil falar sobre uma coisa que não existe. O Governo não tem política de transportes, pelo que esta é uma matéria difícil de debater aqui, no Parlamento.
Repare-se que plano estratégico de transportes é coisa que não temos. Foi prometido em 2005, esteve em discussão pública em 2004, mas estranhamente hibernou, misteriosamente desapareceu. Não há plano estratégico de transportes e esta é a melhor demonstração de uma ausência de estratégia por parte do Governo, que não consegue definir a sua própria estratégia.
As dívidas das empresas públicas no sector dos transportes, que eram de 17 000 milhões de euros em 2009, cresceram 10% em relação a 2008. Que fez o Governo? Não fez nada sobre esta matéria, não fez nada relativamente à diminuição do endividamento das empresas de transportes e hoje tem pela frente o descalabro do sistema de transportes. E quando é necessário cortar 15% nas despesas, escolhe-se o caminho mais fácil, que é o do despedimento sem regra.
As autoridades metropolitanas de transportes são outra novela de cinco anos, que, no final, deu um novelo, que «não ata, nem desata». Perdeu-se aqui também, com a questão das autoridades metropolitanas de transportes, uma boa oportunidade de coordenar sistemas de transportes e de darmos, se calhar, com isto, um primeiro passo para conseguir ganhos de eficiência e redução de custos nesta matéria.
A ferrovia é outro sector em que o Governo, em vez de apostar na rede convencional, aposta no TGV. TGV este que «não anda, nem desanda», símbolo maior da insensatez por parte do Governo. Curiosamente, o Governo não está sozinho na defesa deste investimento. É assim que se desviam recursos que deveriam ser aplicados na promoção da rede convencional e na estabilização das empresas do sector dos transportes.