I SÉRIE — NÚMERO 31
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Na altura, enquanto alguns se lamentavam pelos respetivos concelhos ficarem reduzidos a um pequeno
número de juntas de freguesia outros lutavam para a proposta ser alterada e para que o máximo de juntas de
freguesia fossem poupadas, designadamente na área rural.
Apenas a título de exemplo referir que, para muitos municípios deste País, esse trabalho significou uma
redução das freguesias rurais a agregar de 50% para 25%. Mais ainda, a flexibilidade que às assembleias
municipais foi concedida em termos de processo de pronúncia permitiu que, nos concelhos que souberam
aproveitar essa oportunidade, os esforços de agregação fossem concentrados em áreas urbanas, preservando
ao máximo as freguesias rurais. Santa Maria da Feira é disso um bom exemplo.
Estou certo, e posso afirmá-lo, que não fora pelo trabalho de um conjunto de Deputados do PSD, entre os
quais o signatário, a proposta de lei que o Governo apresentou e que viria a ser votada na generalidade no
princípio de março significaria que muito mais juntas de freguesia deixariam de existir bem como, sobretudo,
as salvaguardas relativamente à manutenção da identidade e património das freguesias não seriam as
mesmas que hoje existem.
Embora o signatário não faça parte da Comissão de Ambiente e Poder Local, não deixou de ter voz ativa
em 14 propostas de alteração que foram apresentadas a essa proposta do Governo.
O PS, que passou de negociador desta reforma a crítico da mesma, não apresentou nenhum modelo
alternativo nem tão-pouco uma única proposta de alteração à que estava em cima da mesa.
Na política como na vida ter a coragem de decidir implica fazer opções.
Se o meu trabalho e o daqueles que, como eu, manifestaram a sua crítica nos locais próprios serviu para
assegurar que fossem respeitados princípios que consideramos fundamentais e que passam pela preservação
da identidade histórica, cultural e social das comunidades locais, designadamente a manutenção do nome das
freguesias que são agregadas, então foi bem empregue.
Se o meu trabalho serviu para que ficasse assegurada a possibilidade da participação das autarquias locais
na concretização da sua própria reorganização administrativa, quando alguns legitimamente temiam uma
reforma que fosse feita de cima para baixo, sem possibilidade de participação das próprias freguesias, então
foi bem empregue.
Se o meu trabalho serviu para que fosse assegurada flexibilidade no desenho dos mapas de reorganização
administrativa, então foi bem empregue.
Se o meu trabalho permitiu uma redução adicional das exigências de agregação de freguesias e um
financiamento adicional (uma majoração de 15% do FFF) às freguesias que voluntariamente se decidissem
agregar, então foi bem empregue.
Ainda assim, o signatário não desconhece que os interesses eleitorais imediatos e a vontade de capitalizar
o descontentamento das populações levaram a que em muitos sítios do País o processo de pronúncia fosse
boicotado.
O resultado prático dessa postura é que muitos políticos se desresponsabilizaram de um mapa autárquico
que eles, melhor que ninguém e com o conhecimento do terreno, teriam condições de fazer.
A partir do momento em que o ex-Secretário de Estado da Administração Local do Governo PS negociou o
ponto 3.44 do Memorando da troica ficou estabelecido, em termos práticos, que Portugal não poderia
continuar com o mesmo número de juntas de freguesia.
Relembre-se, aliás, a recente confissão do ex-Ministro da Presidência do Governo Sócrates, Pedro Silva
Pereira, ao Jornal de Notícias, de que a ideia inicial quando o acordo com a troica foi assinado era, pura e
simplesmente, acabar com dois terços das freguesias do País!
Embora hoje poucos se lembrem que a reforma administrativa constava do programa eleitoral do PS (e não
podia ser de outra forma já que a mesma constava e consta do Memorando), é de reconhecer que a versão
final da reforma prevê o fim de um quarto das juntas de freguesia, bem menos do que aquelas que um
Governo socialista tinha em mente.
Se o atual líder socialista, agora tão crítico da reforma, chegar algum dia a Primeiro-Ministro não voltará
nunca atrás, estou certo, com a reforma administrativa, a não ser que a queira aprofundar ainda mais, no
sentido que alguns seus colegas de partido desejaram enquanto membros do anterior Governo.
Em bom rigor não é agora que o mapa administrativo tem de ser reorganizado. Em bom rigor, não é agora
que as freguesias têm que se agregar ou até, para utilizar uma expressão incorreta mas demagogicamente
mais do agrado de alguns, que se vão «extinguir freguesias». O atual mapa administrativo teve a sua morte