I SÉRIE — NÚMERO 9
38
humano e não ficarmos por discursos piedosos ou por discursos hipócritas quando acontece uma tragédia
destas.
É bom que esta tragédia seja um motivo de reflexão precisamente para que os Estados da União Europeia
adotem uma outra política de imigração mais aberta ao mundo, respeitadora dos direitos humano, em vez de
se fecharem numa Europa fortaleza, como se o resto do mundo não existisse e como se os países da União
Europeia não tivessem responsabilidades nas tragédias que vêm ocorrendo.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório, do BE.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, saudamo-la pelo voto de pesar aqui apresentado e
queremos também dizer que a sensibilidade e a força desta mensagem na procura de um consenso alargado
não devem fazer ignorar as diferenças sobre a forma como cada um de nós olha para esta Europa e para este
massacre.
É por isso que o Bloco de Esquerda vos quer dizer o seguinte: esta ilha foi convertida numa morgue, esta
morgue corresponde aos custos da Europa fortaleza. Não podem dizer que não sabiam, não podem dizer
sequer que não foram avisados de que os custos eram estes. Nos últimos 20 anos, foram milhares de mortos;
no último semestre, pelo menos foram 800 pessoas, homens mulheres e crianças.
Foram avisados: sabiam que estes eram os custos da política da Europa fortaleza com a qual pactuaram e
que construíram.
Falemos de hipocrisia — dos governantes, dos poderes e da própria justiça, se assim quiserem.
Recordemos que os maiores de 14 anos serão acusados do crime de imigração ilegal, não ignoremos que os
pescadores que salvaram os 155 sobreviventes podem ser acusados do mesmo crime, do crime terrível de
auxílio à imigração ilegal — vejam só se isto não é uma tremenda hipocrisia —, e perguntemos o que acontece
à dita polícia marítima que virou as costas, que deixou passar. O que é que acontece a esta horrenda violação
da lei da assistência marítima?
Hipocrisia e vergonha!
É uma vergonha acrescida quando ignora toda a História, a nossa história como europeus: uma Europa de
milhões de emigrantes, de europeus que se espalharam pelo mundo nos últimos séculos; uma Europa
corresponsável nas desigualdades e na pobreza das populações do continente africano. Esta Europa é
responsável por estas desigualdades que levam os homens e as mulheres desse continente a procurarem
com os seus recursos, com imensa dificuldade e com imenso sacrífico, a pensar que aqui é possível ainda
encontrar uma resposta. E o que a Europa fortaleza, a Europa muralhada faz é deixá-los no mar, é deixá-los
morrer.
Por isso, Sr.ª Presidente, reconhecendo a generosidade imensa, a consciência e a lucidez desta
mensagem, não há outra alternativa para nós que não uma outra política de imigração, que respeite os seres
humanos, que atente às causas da procura dos que vêm de outros países e que pensam que a Europa os
pode acolher, os pode respeitar e dar uma outra alternativa de vida.
É uma outra política de imigração que se impõe. Não é uma questão de mais dinheiro ou de mais
policiamento, é uma questão de respeito pela dignidade humana, pelas pessoas, pelas suas causas e por uma
Europa que deveria ser a Europa dos povos, a Europa da tolerância, a Europa da democracia. E se assim não
for, cada minuto de silêncio que as senhoras e os senhores façam vale muitíssimo pouco perante esta Europa
da vergonha, que deixou morrer famílias inteiras.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, em primeiro lugar, óbvia e
naturalmente, queria cumprimentar a Sr.ª Presidente, pela relevância da iniciativa que traz hoje à nossa
reflexão e pela forma equilibrada, ponderada e séria com que nos traz este tema à discussão.