I SÉRIE — NÚMERO 9
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O primeiro é o voto n.º 152/XII (3.ª) — De pesar pela tragédia ocorrida ao largo de Lampedusa,
apresentado pela Presidente, mas que tem o contributo empenhado de todos os grupos parlamentares
(Presidente da AR).
O voto é do seguinte teor:
«A tragédia da última semana, ao largo de Lampedusa, atingiu centenas de seres humanos fugindo de um
destino insuportável. Repetiu outras tragédias, mostrou as portas da Europa como lugar de sonho e lugar de
inferno! Mulheres, homens e crianças, os gritos que ecoaram nas palavras magoadas da Presidente da
Câmara de Lampedusa: ‘Quanto tempo mais terei eu de alargar o cemitério da minha terra?’, perguntou às
instituições europeias. No Mediterrâneo, em vinte anos, a morte de mais de 20 000 refugiados!
A tragédia atinge-nos a todos porque nos responsabiliza a todos. Lampedusa expõe as insuficiências da
política europeia nas formas de dor e de sangue.
O problema dos refugiados e da imigração ilegal reclama regras europeias justas e claras. Reclama, por
isso, um forte consenso europeu, capaz de responder às muitas dimensões do problema. Entre as políticas de
auxílio ao desenvolvimento e as estruturas normativas da União e dos seus Estados-membros. Reclama
políticas coerentes e integradas garantindo um estatuto de dignidade aos refugiados e imigrantes.
Responder a Lampedusa é, desde logo, tomar a sério o combate para o desenvolvimento e os direitos, é
promover a ajuda ao reforço das democracias dos países de origem, ajuda feita no diálogo e na solidariedade.
Porque o segredo do desenvolvimento está na qualidade das instituições democráticas com a sua cultura
inclusiva. São as instituições democráticas que garantem a justiça e a liberdade, são elas que dão curso ao
progresso económico e ao asseguramento da qualidade de vida e da dignidade das pessoas. Isso leva a uma
estratégia europeia de iniciativas conjuntas com os poderes centrais e as comunidades locais dos países de
origem. Uma estratégia que promova o crescimento da sociedade civil para que as reformas venham ‘de
dentro’, que promova a cooperação e o diálogo com os líderes sociais e as elites políticas.
Responder a Lampedusa é convocar o ativismo político nos diferentes Estados da União Europeia, visando
encontrar as respostas para os desafios do desenvolvimento, da cooperação e do respeito pelos direitos
humanos. É mobilizar vontades e recursos para um relacionamento com os países menos desenvolvidos
assente na igualdade e na reciprocidade. É combater os flagelos sociais e as atividades criminosas que se
alimentam da pobreza, do desempego e do subdesenvolvimento como as redes de tráfico. Mas é, sobretudo,
afirmar valores na necessária cooperação europeia. Porque a solidariedade europeia é, com efeito, aqui
implicada como método e como fim.
Lampedusa desperta-nos para todas as ações e decisões reclamadas pela condição dos exércitos de
pobreza e amargura. Desperta-nos sobre as imagens dos campos de detenção, do regresso ‘impreciso’ aos
países terceiros, sobre as imagens do acesso inconseguido e fatal, tantos lugares como Lampedusa!
Nenhum tema como a imigração desqualifica tanto os velhos paradigmas da política. Ponta do iceberg de
um mundo em mudança, desafio que é feito contra as fortalezas do egoísmo, a imigração convoca-nos para
uma ação que não parte do resultado mas das causas! Desafia-nos para interpretar e regular os movimentos
demográficos e a sua matriz da globalização. Desafia-nos, enfim, para um entendimento consequente da
comunidade internacional como comunidade moral!
É que Lampedusa, com os seus naufrágios da má sorte e da desdita, magoa a justiça e a civilização. Diz-
nos do muito que há para fazer, diz-nos para dizer basta!»
Srs. Deputados, como sabem, este voto vai ser objeto de debate, dispondo cada grupo parlamentar de 2
minutos
Está já inscrito para intervir o Sr. Deputado António Rodrigues, do PSD, a quem dou a palavra.
O Sr. António Rodrigues (PSD): — Em primeiro lugar, quero cumprimentar particularmente a Sr.ª
Presidente da Assembleia da República por esta iniciativa, por nos trazer a oportunidade de fazer uma
reflexão sobre um problema que, sendo de direitos humanos e sendo uma questão humanitária, é, acima de
tudo, também um problema político.
Não deveriam ser as centenas de mortes a convocar-nos para esta reflexão, nem tão-pouco deveria ser a
questão de discutirmos de quem é a jurisdição — se é de Itália se é da União Europeia. Este é um problema
político que carece de resposta política, que carece de uma intervenção de todos nós.
É uma discussão em que, mais do que refletir, mais do que debater, urge agir.