I SÉRIE — NÚMERO 17
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro
Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Membros do Governo, Sr. Deputado Miguel
Frasquilho, devo dizer-lhe que, conhecendo o seu pensamento e registando as suas intervenções ao longo
dos últimos dois anos e meio, noto uma alteração de alguma parte do seu raciocínio. É porque aquilo que,
agora, é o alívio de podermos deixar a troica sair em maio ou em junho de 2014 contrasta com aquele que era
o alívio, no início deste Programa de Ajustamento, de, finalmente, ter chegado a troica para fazer o que ainda
não tinha sido feito. Era isso que nos diziam o Sr. Deputado, a direita e o Governo: que a troica era bem-vinda,
porque o seu programa era para fazer aquilo que ainda não tinha sido feito no País.
Mais: o Sr. Primeiro-Ministro, não contente, dizia que queria ir para além da troica, porque essa era a
necessidade do País.
Ora, hoje, percebemos o que é a troica. Percebemos bem na vida de cada um e de cada uma o que
significa a austeridade e sabemos bem como, para este Governo, as escolhas não vão para lá do óbvio. É que
aquilo que nos dizia o Sr. Ministro da Defesa, no seu combate ao óbvio da política, não passa sequer na prova
da ação deste Governo.
O óbvio, para este Governo, é cortar nos salários. Tentou em 2012 e em 2013 e tenta agora para 2014,
tendo começado, ainda antes de fazer um Orçamento do Estado, com o corte de metade do subsídio de Natal,
em 2011.
O óbvio, para este Governo, é cortar nas pensões ou mantê-las congeladas para quem ganha abaixo do
salário mínimo e dizer que as pessoas estão condenadas a empobrecer.
O óbvio, para este Governo, é um programa de empobrecimento do País.
Por isso, Sr. Deputado, conhecendo o seu raciocínio, pergunto-lhe se não era necessário ir para além do
óbvio.
O Governo quis, nas suas escolhas, atacar sempre o mercado interno, através do ataque ao rendimento
das famílias. É certo que não o fez só atacando o rendimento das famílias, também o fez atacando diversos
setores da economia. O IVA aplicado à restauração não é o único exemplo, mas é o maior dos exemplos. Não
o fez por ausência de escolhas, fê-lo por vontade.
Na proposta de Orçamento para 2014, o Governo diz que quer cortar 2211 milhões de euros em salários e
pensões e ao mesmo tempo diz que apenas vai cortar na banca e no setor energético 150 milhões de euros,
mas avisa: «Não se assustem, porque depois damos um desconto no IRC».
Ora, estas bondades para com os grandes grupos económicos e para com a banca e estas eternas
maldades para com as famílias, ou seja, o modelo de ajustamento que ataca os salários através do ataque aos
rendimentos, o modelo de ajustamento que, atacando o mercado interno, diz que nós só teremos futuro com o
mercado externo, são as escolhas deste Governo.
Não atire com a ideia de que o Bloco de Esquerda não acredita nas exportações. Creio que todos nós
esperamos que as exportações continuem a crescer mês após mês. Contudo, sabe (e creio que sabe mesmo,
como nós sabemos) que não é só pelas exportações que o País viverá. É essa a diferença de fundo que nós
temos e é essa a razão que falta ao Governo.
O Governo tenta destruir o mercado interno em troca das promessas de investimento, como dizia o Sr.
Deputado, que possam vir, «os amanhãs que cantam».
Deixo-lhe, então, a primeira pergunta: onde estão «os amanhãs que cantam» do presente no que respeita
às promessas feitas há meio ano sobre aquele incentivo fiscal ao investimento? Não se vê nada!
Sei que leu as Grandes Opções do Plano e nelas não há uma indicação de que o investimento esteja a
recuperar, não há uma indicação de que afinal as isenções e os benefícios que foram criados para os grandes
grupos económicos tenham uma repercussão no investimento.
Então, se avaliarmos pelo emprego, o que esta proposta do Orçamento do Estado para 2014 nos diz é que
o desemprego continuará a crescer em 2014. Por isso, não há investimento de monta, não há resultado na
vida das pessoas, pois não há criação de emprego!
Ora, se não há resultado por esta via, se o Governo insiste novamente, em 2014, em atacar as pessoas
atacando o mercado interno e o rendimento das famílias, onde está a saída deste nó górdio da economia?