11 DE JANEIRO DE 2014
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Recordo que um dia me disse que devemos estar na política com humildade e seriedade, devemos ser
firmes nas convicções e nos valores que defendemos.
Era um homem político, que estabelecia uma forte relação entre o pensamento político e a ação,
garantindo coerência às decisões políticas e de acordo com as convicções expressas.
Por isso, defendia que a credibilidade e a dignidade da função política dependia fundamentalmente do
comportamento do agente político. Tinha um grande sentido de Estado e de serviço público. Conciliador e
homem de bom senso, via no diálogo e no salutar confronto das ideias a via mais fácil para obter resultados
positivos das propostas políticas. Dizia que na política o bom senso é dos inteligentes, a arrogância é dos que
não têm argumentos.
Tendo convivido com Sá Carneiro, bebeu muito do seu humanismo e da sua visão social-democrata da
sociedade assente na solidariedade e na justiça social. Fervoroso militante e profissional competente do
planeamento familiar, participou, em 1977, na criação da Associação para o Planeamento Familiar e logo a
seguir abriu a primeira consulta pública e gratuita de planeamento familiar.
O País deve-lhe bastante pelo contributo que deu para os seus ganhos em saúde, colocando o País nos
cinco países do mundo com a mais baixa taxa de mortalidade materno-infantil.
Por isso, a associação médica mundial o colocou nos 65 clínicos mais dedicados às causas públicas no
campo da saúde.
Homem do Norte, sempre soube, com inteligência, com equilíbrio e sem bairrismos, falar em nome dos
interesses do Norte sempre que estes eram postos em causa.
As mulheres e os homens de Portugal devem-lhe este tributo e homenagem e nós políticos encontramos
no seu exemplo e dedicação à causa pública e de respeito pela função política motivo de reflexão sobre a
serenidade e bom senso que queremos para o exercício da atividade política.
Recordar a História e as suas personagens de nada servirá se não soubermos extrair daí os ensinamentos
necessários para fazermos melhor.
Obrigado, Albino Aroso.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.
A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Quando a Assembleia da
República entende homenagear alguém e unir-se, nessa homenagem, a alguém com a grandeza de Albino
Aroso aquilo sobre que podemos refletir é o que existia antes dele, o que ele fez e o que pode permanecer
para além da sua existência terrena, da sua ação.
O que existia antes de Albino Aroso? Doença evitável, morte por parto ou aborto clandestino ao nível dos
países menos desenvolvidos, esperança de vida à nascença, que era o espelho da clivagem proporcionada
por uma medicina privada apenas acessível aos mais abonados e uma saúde pública paupérrima destinada
aos pobres.
Do ponto de vista social e político, o estatuto da mulher era desvalorizado. Não existia como ser autónomo
e de pleno direito, mas apenas em função dos interesses da família. O que fez Albino Aroso? Ele sempre foi
contra este estado de coisas e invocava muitas vezes a sua mãe, por quem nutria um enorme respeito e que o
ensinou a respeitar as mulheres. E foi um lutador denodado contra o estado de coisas vigente, enfrentando
muitas incompreensões. Foi o promotor do planeamento familiar, com educação para a saúde e distribuição
gratuita de meios anticoncetivos, como instrumento de dignificação da mulher e das crianças também e foi um
defensor do Serviço Nacional de Saúde, no âmbito do qual a execução das suas políticas encontravam o
espaço próprio e ideal de concretização.
Foi um conceptualizador, um realizador, mas sobretudo um homem inteligente, denso do ponto de vista
científico, bom e um homem de bem, que encarava as dificuldades com um sorriso e que se servia delas para
avançar ainda mais na concretização daquilo em que acreditava, independentemente daquilo que dele
pensassem ou dissessem.
Tive o privilégio de ter mantido com ele longas conversas de trabalho, a colaboração em projetos
inovadores na área da luta contra o cancro e na política de saúde da mulher e da criança, mas também da
igualdade, quando tive essas responsabilidades, e o que mais recordo dele é a sua coerência, a sua coragem,
a sua ternura e a sua bondade.