I SÉRIE — NÚMERO 59
4
Srs. Deputados, vamos começar com as declarações políticas, pertencendo a primeira ao Bloco de
Esquerda.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados: A dívida pública
portuguesa representa já 130% de toda a riqueza produzida no País e leva todos os anos 8000 milhões de
euros só em juros. É mais do que o Estado investe em todos os níveis de educação e de investigação.
Este Governo tomou posse fazendo do pagamento da dívida e do controlo do défice o objetivo central da
sua governação. Foi sempre em nome deste pagamento que Passos Coelho foi justificando o corte nas
pensões, o corte nos salários, o aumento de 30% em todos os impostos, a degradação do serviço público, do
serviço de educação, de saúde, os aumentos dos transportes ou da eletricidade.
Três anos depois, o que é que aconteceu? Para trabalhadores, desempregos e pensionistas, os
rendimentos nunca pararam de descer; já a dívida, essa, nunca parou de aumentar.
Onde o Memorando garantia que a dívida estaria nos 114% do PIB no final de 2013, hoje estamos nos
130%. O Governo que fez do pagamento da dívida a sua bandeira foi aquele que mais aumentou a dívida
pública em Portugal.
Mas esta semana, com uma candura desarmante, o Presidente da República veio explicar o plano da
direita para controlar a dívida. O plano apresenta, no entanto, três pequenas falhas — é irrealista, é
irresponsável e é impossível.
Aplausos do BE.
É irrealista, porque defende para 30 anos consecutivos aquilo que não foi conseguido num único ano. É
irresponsável, porque impõe o empobrecimento de todo o País em nome de uma meta que sabe ser
impraticável. E é impossível, porque nunca nenhum país do mundo, nem os Estados Unidos, nem a
Alemanha, conseguiu atingir as metas defendidas por Cavaco Silva e por este Governo.
Pese embora toda a retórica inflamada de Paulo Portas, o plano da direita para pagar a dívida é mais do
mesmo, mas mais forte. O Presidente da República usou os números que o Governo tenta esconder.
Diz-nos Cavaco Silva que durante 30 anos, e todos os anos, Portugal terá de ter, no mínimo, taxas de
crescimento do PIB de 3% e saldos primários de 4%.
Em 40 anos de democracia, Portugal nunca conseguiu atingir estes valores num único ano, quanto mais
em 30. Pior: nunca nenhum país do mundo o fez. Mesmo os países mais ricos, como a Alemanha, só
atingiram estas metas durante dois anos nos últimos 17.
Sejamos claros: o que nos propõem é continuar este nível de austeridade por três décadas e, com mais
cortes e sem investimento, atingir níveis de crescimento e de excedentes orçamentais que nenhuma das
economias mais ricas do planeta conseguiu. Isto só tem um nome, Srs. Deputados: chama-se má-fé.
A pergunta que se impõe é esta: se o Governo sabe que estas metas são inviáveis, por que é que insiste
num plano suicidário? E a resposta também está à vista: a sustentabilidade da dívida sempre foi a menor das
preocupações da direita. Assim tem sido e assim continuará a ser na pós-troica. A dívida é o pretexto para
impor a austeridade que corta salários e retira direitos a quem trabalha ou a quem trabalhou.
Aplausos do BE.
A transferência de rendimentos do trabalho para o capital é o único elemento que está a ser ajustado na
economia portuguesa.
Sr.as
e Srs. Deputados: Não há nada mais irrealista do que dizer que um país cada vez mais pobre,
acorrentado aos humores de Bruxelas e do FMI durante os próximos 30 anos, terá condições para pagar a
dívida e, sobretudo, terá condições para oferecer a quem cá vive um futuro melhor.
Mas é exatamente este plano — irrealista, irresponsável e impossível — que dá corpo ao tratado
orçamental. O que este tratado defende é que, independentemente de quem seja eleito, o dogma desta
austeridade continuará a ser aplicado. Não é por acaso que Cavaco Silva fala em consensos até 2035, quando