I SÉRIE — NÚMERO 84
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Ministro tinha acabado de apresentar Ricardo Salgado ou Zeinal Bava como um exemplo a seguir pela sua
exigência, método e mundividência.
Hoje, parecerá um exemplo descabido, bem sei, mas há sete anos, logo após o colapso do BPN, também
nos diriam que seria impossível um Primeiro-Ministro elogiar Dias Loureiro nos mesmos termos. As palavras
de Passos Coelho são a prova provada de que o tempo tudo apaga se não forem tomadas medidas e o pior
que poderia acontecer, Srs. Deputados, depois desta Comissão, era ficar tudo na mesma.
Esta Comissão de Inquérito tinha, no nosso entender, três propósitos: tornar transparente aos olhos dos
cidadãos a ascensão e o colapso do maior grupo nacional; avaliar o funcionamento das instituições que
permitiram, por ação ou omissão, essa mesma queda; e garantir que o conhecimento que hoje temos seja
aproveitado para alterar de forma consequente as regras e o funcionamento do sistema financeiro.
Comecemos pelo primeiro ponto. Hoje é quase impossível encontrar uma pessoa que nunca tenha ouvido
falar no GES ou do papel comercial. Nunca foi exposta de uma forma tão crua a forma como funciona e se
movimenta a elite económica e financeira neste País.
O império Espírito Santo, elogiado anos a fio pela sua visão empresarial, era, afinal, um «gigante com pés
de barro». A organização familiar escondia a mediocridade da gestão, assim como a complexidade da sua
estrutura mascarava negócios fracassados e adiava a eminente falência.
A complexidade e opacidade das estruturas financeiras tornou-se um fim em si mesmo. Esquemas de
financiamento cruzado, engenharia fiscal, dinheiros obscuros, políticas de crédito descontroladas, fuga aos
supervisores… Este modelo de negócio — que é, na verdade, o modo financeiro dos nossos dias — não
prosperou sozinho; alimentou-se da promiscuidade com o setor político e empresarial.
O BES não é o GES, diziam-nos. Mas o BES era acionista da PT, que emprestou 900 milhões ao GES. O
BES não era o GES, mas o BES vendeu aos seus clientes 1800 milhões de dívida do GES. O BES não era o
GES, mas era ao BES que o braço angolano do GES devia dinheiro.
O BES era o GES porque a lei nunca impediu uma confusão que o Banco de Portugal não soube ou não
quis desfazer.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Banco de Portugal, em novembro de 2013, toma conhecimento de
irregularidades nas contas do Grupo Espírito Santo. Esse era o momento em que Carlos Costa deveria ter
afastado Ricardo Salgado do BES. Mas não o fez. Em vez disso, entreteve-se, durante longos meses, num
falso «braço de ferro». Com esta benevolência, o supervisor criou as condições para sucessivas violações da
blindagem do Grupo. O BES nunca deixou de ser o GES.
Enquanto isso, tardou a comunicar o que sabia à CMVM. A passividade do Banco de Portugal permitiu que
circulasse, durante meses, papel comercial de um grupo que o regulador sabia quase falido.
Aquando da resolução bancária, o Banco de Portugal voltou a falhar, ao dizer aos clientes que a provisão
associada a estes títulos tinha transitado do BES para o Novo Banco.
Como se não bastasse, o País assistiu incrédulo ao momento em que um comentador televisivo,
especialista, aliás, em fugas de informação do Conselho de Ministros, anuncia em primeira mão a resolução
bancária, solenemente confirmada 24 horas depois pelo Governador Carlos Costa.
Em todo este processo, o Governo escolheu o Banco de Portugal como escudo e como arma a repetida
garantia de que desta vez não seríamos chamados a pagar os erros de um grupo privado.
É difícil acreditar que o Governo nunca tenha tomado conhecimento ou participado na intervenção do BES.
Mas, se o que diz é factual, então o alheamento e desinteresse face ao destino do maior grupo português é
verdadeiramente irresponsável.
De uma forma ou de outra, vamos pagar. Seja pela quota da Caixa Geral de Depósitos no Fundo de
Resolução, pelos complexos ativos por impostos diferidos, pelo risco de litigância ou pela hipótese de a banca
privada não assumir o potencial prejuízo com a venda do Novo Banco. Pagaremos, como, aliás, pagámos
sempre.
Nos últimos sete anos, vamos em seis escândalos financeiros, resolvidos sempre com intervenção direta
ou indireta de dinheiros públicos. A realidade tem-nos mostrado, da forma mais dura, que a banca é
demasiado importante para ser deixada nas mãos dos banqueiros.