10 DE MARÇO DE 2017
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Há muito que o papel do Estado deixou de ser o de dirigir a economia, ou os demais setores sujeitos a
regulação e a supervisão, mas antes passou a ser o de perceber que os fins a que o poder político se propõe
não se podem sobrepor aos interesses do bom funcionamento dessas áreas relevantes, sob pena de os
distorcerem e desviarem.
Essa independência das entidades reguladoras e de fiscalização tem de ser entendida nos dois sentidos e
não apenas num, conforme o Sr. Ministro afirmou do alto da tribuna.
Essa independência tem de ser feita face aos regulados, supervisionados e fiscalizados — caso contrário,
dar-se-á o fenómeno conhecido por «captura do regulador» — e também perante o poder político, porque essa
é a própria essência e razão de ser da regulação em qualquer setor, a sua impermeabilização, ou seja, a
faculdade de não ter de aceitar ordens e instruções, de aceitar as determinações ou conformar-se com os
desejos do poder político.
Em suma, a regulação e a fiscalização independentes contrapõem-se ao dirigismo do poder político. O
dirigismo registou-se como uma mera recordação histórica de experiências menos democráticas. A regulação e
a fiscalização independentes são filhas do melhor aprofundamento da democracia contemporânea e tornou-se
característica das sociedades livres e abertas. Ou não será realmente assim?
É esta a dúvida que estes últimos dias, estas últimas semanas, estes últimos 16 meses nos têm deixado.
Será que em Portugal, apesar das piedosas intenções de independência do regulador, que ainda agora o Sr.
Ministro ali fez do alto da tribuna, há ou não, por parte da atual maioria parlamentar, uma intenção de voltar aos
tempos da intervenção direta em todos os setores da sociedade, aos tempos em que todos obedeciam aos
desejos dos responsáveis políticos?
Do lado da extrema-esquerda mais radical, sabemos que o dirigismo nunca foi abandonado.
Protestos do BE.
Mas o que dizer do PS? Partilha ou não, o Partido Socialista, a desconfiança sobre a independência
necessária da regulação com os seus compagnons de route que, com ele, suportam o Governo?
Diz este PS que apoia a regulação — ainda agora o fez através do Sr. Ministro —, a supervisão e a
fiscalização independentes, mas já jura o contrário quando fala enquanto grupo parlamentar.
O presidente e líder do Partido Socialista fez afirmações gravíssimas sobre esta matéria. Alguns dos
principais dirigentes do Partido Socialista têm estado, nos últimos dias, em manobras evidentes de intimidação
das vozes independentes dos fiscalizadores, dos reguladores e dos supervisores, e isto é um facto político que
não pode ser deixado em claro.
O Partido Socialista não pode ter um rosto de Janus, com duas faces, uma em que se afirma pró-regulação
e pró-independência das instituições e outra em que, sorrindo para os seus companheiros da extrema-esquerda
radical, se afirma como um partido pró-dirigista, que não aceita a independência dessas entidades.
Não é possível assegurar, qualquer que seja a arquitetura institucional da supervisão, da regulação ou da
fiscalização de qualquer setor, incluindo o setor financeiro, a independência dessas entidades quando os
principais responsáveis políticos abalroam a dignidade dos reguladores, apoucam os seus protagonistas e, como
alguém já disse, fazem bullying fulanizado e em tom prepotente. Foi o que fizeram com o Conselho das Finanças
Públicas. É o que estão a fazer com o Governador do Banco de Portugal.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O senhor regressou aos tempos do MIRN (Movimento Independente para a
Renovação Nacional)!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — E se, de alguma forma, se compreende a posição da extrema-
esquerda radical marxista-leninista e, aqui e além, pintalgada de tons trotskistas,…
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Só lhe falta a braçadeira!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Está a voltar aos tempos do MIRN!