I SÉRIE — NÚMERO 87
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onde é que o regime é mais favorável e tentar ao máximo orientar a sua atividade para esses regimes mais
favoráveis.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana
Mortágua, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há muito como evitar a conclusão e
como esconder o problema. Há um problema de legitimidade no nosso sistema fiscal. Não é só no nosso, mas
também no sistema fiscal europeu e até no sistema mundial, provavelmente, mas o nosso é aquele que
conhecemos melhor.
É que os pequenos contribuintes sentem que não conseguem fugir — e, no fundo, ainda bem que não
conseguem —, mas não só não conseguem fugir, como ainda têm uma mão pesadíssima sobre as suas
pequenas falhas ou irregularidades no cumprimento das obrigações fiscais. Quem se atrasar um dia a entregar
uma declaração de IVA ou de IRS ou no pagamento especial por conta leva pesadas multas, com intolerância,
porque temos um sistema fiscal muito exigente.
E não estou a dizer que isso é mau à partida; o problema é quando essa exigência não é replicada em quem
tem mais rendimentos, ou seja, em quem tem os rendimentos necessários para pagar aos advogados e às
consultoras que lhes construam esquemas de planeamento fiscal.
É porque, depois, andamos aqui — não digo o Bloco de Esquerda — com alguns pruridos em saber até onde
é que o planeamento fiscal é legítimo, quando é que deixa de ser ilegítimo, quando é que deixa de ser regular e
passa a ser irregular.
Eu diria que o planeamento fiscal em si é sempre ilegítimo e traz sempre um problema de injustiça ao sistema,
na medida em que há quem não consiga nem possa fazer e está sempre reservado àqueles que conseguem e
podem fazer. Isto aplica-se a contribuintes individuais e reflete-se diretamente na pirâmide do nosso IRS. É por
isso que sabemos que há cidadãos em Portugal que ganham muito mais e que têm muito mais do que aquilo
que declaram, e esse é um problema identificado hoje até por antigos diretores da Autoridade Tributária.
Mas também se reflete nas empresas, não só nas pequenas, que têm as mesmas dificuldades, mas
igualmente nas grandes. Há uma razão para todas as empresas do PSI 20 estarem na Holanda e no
Luxemburgo. Há uma razão para isto: não é porque giram a rede elétrica do Luxemburgo ou porque tenham
muitos supermercados na Holanda, mas porque usam estas jurisdições para fazer transferência de lucros e
conseguir pagar menos impostos em Portugal. A verdade é que todas elas dependem da atividade que têm em
Portugal, muitas vezes das rendas que ganham através da sua atividade em Portugal.
O Sr. Heitor de Sousa (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Temos muitas dúvidas de que simples mecanismos de troca de informação
possam resolver este problema de fundo, porque é um problema que está enraizado na forma de funcionamento
da economia, está legitimado pela atividade dos advogados, das consultoras, pela forma como se encara isto
como parte da atividade empresarial, o que não quer dizer, mais uma vez, que estas trocas de informação não
sejam essenciais para resolver o problema.
Mais uma vez, deixo perguntas muito breves: porquê 750 milhões de euros como limiar, quando claramente
é excessivo? Qual é o problema de tornar públicos estes relatórios, para que se possa perceber quais são os
esquemas utilizados e para que possa haver um conhecimento sobre estas medidas? Mas, mais importante do
que isto, tem Portugal os recursos e os meios humanos — as pessoas — formados para conseguir compreender
esta informação e dar-lhe o tratamento adequado? É que temos dúvidas de que tenha havido, de facto, um
investimento na Autoridade Tributária para que os profissionais, que, sabemos, são muito bons e fazem muito,…
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.