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I SÉRIE — NÚMERO 89

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O capital nunca aceitou este avanço civilizacional e criou instrumentos ardilosos para afastar a lei:

transformou todo o período normal de trabalho em tempo de trabalho efetivo; eliminou pausas; impôs diversas

flexibilizações e aumentou a intensidade e os ritmos de trabalho.

Hoje, o horário de trabalho, a sua fixação e cumprimento, o respeito pelos tempos de descanso, as respetivas

condições de pagamento e de compensação e a articulação com a vida familiar, pessoal e profissional assumem

uma enorme atualidade.

Sr. Presidente, Sr. Deputados: Na passada segunda-feira, o PCP realizou uma audição parlamentar,

amplamente participada, sobre «Horários de trabalho: combate à desregulação, 35 horas, respeitar direitos».

Os relatos dos trabalhadores e das suas organizações representativas provam que estas matérias são um

dos alvos de maior ataque por parte do patronato. Aliás, os relatos confirmam de forma evidente a quem serviram

as alterações à legislação laboral promovidas pelo Governo PSD/CDS em 2012.

À boleia da dita competitividade, sucessivas alterações à legislação laboral resultaram sempre em

degradação dos direitos dos trabalhadores, corporizando novos conceitos, que apenas recuperam velhas ideias

de desumanização do trabalho (adaptabilidades, bancos de horas, entre outros).

Hoje, no nosso País, cerca de 75% dos trabalhadores são atingidos pela adaptabilidade de horários, pelo

recurso abusivo ao trabalho por turnos e ao trabalho noturno, pela generalização do desrespeito e do

prolongamento dos horários, com consequências profundamente negativas.

Os exemplos são gritantes: nas minas da Somincor, em Castro Verde, existem pressões da administração

para impor horários concentrados de 12 horas de trabalho no subsolo; na Tyco e na Kemet, em Évora, onde

desde há vários anos são praticadas as 12 horas de trabalho diário, a administração da Kemet impõe a marcação

de férias em regime concentrado e seis dias de trabalho gratuito, mesmo após condenação do Tribunal da

Relação de Évora.

No Grupo REN, onde há falta de trabalhadores para cumprimento cabal dos turnos, é negado o direito ao

descanso obrigatório e os horários são organizados quinzenalmente, obrigando os trabalhadores a uma

instabilidade permanente.

Na Siderurgia Nacional, no Seixal, a administração impõe 12 horas de trabalho diário, inclusive ao sábado e

domingo, com reflexo no aumento dos acidentes de trabalho, desgaste físico e psicológico dos trabalhadores,

despedimentos e posterior subcontratação através de empresas de trabalho temporário.

Na área da hotelaria e da restauração, em muitos locais de trabalho não são respeitados os tempos mínimos

de descanso, existindo trabalhadores que saem do local de trabalho à 1 hora da manhã e voltam ao trabalho

logo na manhã seguinte, passadas 6 e 7 horas.

Na Lisnave Yards, em Setúbal, os trabalhadores são obrigados a prestar 1800 horas de trabalho efetivo,

divididas em dois semestres, onde 270 horas, no regime de adaptabilidade, são prestadas de segunda a sábado,

mas também nos feriados, o que pode ir até 15 dias de descanso semanal e complementar sem qualquer

acréscimo de remuneração.

No âmbito do Serviço Nacional de Saúde a carência de profissionais, em particular de enfermeiros, leva a

situações inaceitáveis, onde são devidas milhares de horas de descanso a estes trabalhadores.

Nas empresas de limpeza, a imposição das 35 horas semanais é um expediente para não garantir o

pagamento do salário mínimo e dos seus aumentos.

Na verdade, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o aumento do horário de trabalho é diretamente proporcional

ao aumento dos lucros dos grupos económicos.

É urgente combater a desregulação dos horários de trabalho.

É urgente garantir o respeito pelos seus limites diários e semanais, garantir dois dias de descanso semanal

e a revogação dos bancos de horas, de adaptabilidades, dos horários concentrados e do combate ao

prolongamento da jornada diária com o abuso do trabalho extraordinário.

É urgente garantir as 35 horas a todos os trabalhadores, seja na Administração Pública, seja no setor privado,

reduzindo os horários de trabalho para as 35 horas semanais sem perda de remuneração nem de outros direitos,

no setor privado, como contributo para criar postos de trabalho e combater o desemprego.

É urgente reforçar os direitos trabalhadores por turnos.

É inadiável colocar os avanços científicos e tecnológicos ao serviço do crescimento e desenvolvimento do

País, da redução do horário e da penosidade do trabalho.