I SÉRIE — NÚMERO 108
44
Não iniciámos agora o debate sobre o que o Estado não investiu e podia investir, já o dissemos há muitos
meses: 1600 milhões de euros de diferença entre o défice necessário para sair do procedimento de défice
excessivo e o défice registado efetivamente.
Para que o Ministro Mário Centeno fosse elogiado por Wolfgang Schäuble, houve 1600 milhões de euros a
menos de investimento onde era urgente fazê-lo.
Teria sido possível investir os 800 milhões de euros em novos investimentos e substituição de material
obsoleto no Serviço Nacional de Saúde, um investimento que reforçaria o acesso da população à saúde e
pouparia milhões a prazo porque reduziria as contratualizações ao privado.
Teria sido possível fazer as obras urgentes em todas as escolas degradadas, pois 300 milhões de euros de
investimento evitariam que mais um ano letivo começasse, para tantos, em más condições.
Teria sido possível contratar os auxiliares que faltavam. Foram 30 milhões de euros que faltaram nas escolas
e não tinham de ter faltado.
Teria sido possível investir 400 milhões de euros na requalificação da ferrovia, garantindo mobilidade,
contrariando o abandono e promovendo a coesão territorial.
Teria sido possível duplicar as equipas de sapadores florestais, pois 20 milhões de euros fariam toda a
diferença para um País mais seguro.
Teria sido possível um outro investimento em áreas onde sobram proclamações e falta orçamento, da cultura
à ciência, e que são essenciais ao desenvolvimento.
Cada uma destas poupanças forçadas e escusadas é uma oportunidade perdida. Foram 1600 milhões de
oportunidades perdidas, não foram cortes — isso foi o que a direita fez e o País lembra-se bem da diferença —
, nem foi quebra da confiança nos orçamentos aprovados.
Todos se lembram também de como cada orçamento retificativo da direita vinha com um novo corte nos
rendimentos de quem menos tinha. Esse tempo passou.
Do que falamos hoje, sim, é de uma nova exigência. Não podemos perder nenhuma das oportunidades de
recuperar o País da devastação da austeridade.
Aplausos do BE.
Sr.as e Srs. Deputados, está hoje afastada a insegurança que a direita trouxe ao País. Trabalhámos para
isso. Já não há medo de ouvir o anúncio do corte na pensão ou no salário cada vez que se liga o noticiário. A
segurança do respeito constitucional foi reposta. Portugal recuperou confiança e isso não é coisa pouca.
Mas as ameaças não são poucas, nem distantes. Um mundo crescentemente inseguro e instável exige-nos
toda a prudência.
Precisamos de recuperar instrumentos essenciais da democracia económica, de funções estratégicas e
serviços públicos que são garantias constitucionais.
Quando olhamos para a instabilidade do sistema financeiro, sabemos que a entrega do BANIF ao Santander
foi um erro, como é um erro entregar o Novo Banco à Lone Star.
O Estado pagou as perdas e mandou entregar ao estrangeiro. Ficámos mais frágeis.
Num País com uma dívida pública tão elevada e com o programa do BCE que tem protegido a subida de
juros a terminar em breve, este não é um problema que possamos continuar a ignorar.
Do mesmo modo, temos de olhar todos os setores estratégicos da economia.
Veja-se o caso dos CTT: uma empresa pública rentável que foi vendida pelo PSD e CDS. Os CTT privatizados
deixaram de assegurar sequer o serviço postal elementar, como concluiu até o próprio regulador, a ANACOM
(Autoridade Nacional de Comunicações), com falhas e ausências que, só por si, já exigiriam a reversão da
privatização. De que se espera para recuperar os CTT?
Na energia, o sistema de rendas excessivas, que a privatização do setor instalou, continua. É um crime contra
os consumidores e contra a economia.
É preciso libertar a economia real do peso de uma fatura energética abusiva, baixar os custos energéticos
das famílias, de todas!, e não apenas das mais vulneráveis, como começámos a fazer com as tarifas sociais.
Este é o momento de avançar nesse caminho. Já vamos muito atrasados. Por que espera o Governo?
Como podemos ter um programa de desenvolvimento, inovação e coesão se a gestão dos setores
estratégicos não obedece a qualquer lógica que não a da acumulação acionista?