I SÉRIE — NÚMERO 10
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Sucede que este anteprojeto vai muito mais além do que aquilo que está previsto na diretiva e introduz um
conjunto de soluções legais, que não estão previstas na diretiva, que têm um impacto muito forte no equilíbrio
da ordem jurídica nacional.
Aliás, essas dúvidas e essas dificuldades ficaram patentes na discussão pública promovida pela Autoridade
da Concorrência deste anteprojeto. Foram, na altura, apontadas as situações relacionadas com soluções
inadequadas ao nosso ordenamento jurídico e, sobretudo, soluções que colocavam em causa a congruência
sistemática do nosso ordenamento jurídico em matérias relativas a questões tão importantes como o conceito
da responsabilidade civil, prazos de prescrição, força probatória das sentenças estrangeiras, quantificação de
danos, prova e organização
Assim, o Governo teve a iniciativa de, em coordenação com a Autoridade da Concorrência, solicitar uma
reformulação desse primeiro anteprojeto no sentido de corrigir os lapsos que aí foram identificados, e daí a
transposição, em sede de Conselho de Ministros, desta diretiva para a ordem jurídica nacional através de
proposta de lei.
Portanto, esta iniciativa do PSD está hoje ultrapassada pela iniciativa do Governo e teremos oportunidade
de, em sede de especialidade, na comissão, discutir as soluções que são avançadas para a transposição desta
diretiva.
É que não chega transpor a diretiva, é necessário criar condições para que as soluções da legislação
comunitária sejam efetivas e não destruam aquilo que é o equilíbrio do nosso sistema judiciário.
Concordamos que o modelo do «public enforcement» deve ser complementado com o funcionamento do
«private enforcement», que permite que os privados possam ser ressarcidos pelos prejuízos sofridos com a
violação das normas da concorrência. No entanto, sabendo nós que a transposição desta diretiva tem
implicações profundas no nosso regime da concorrência, aprovado em 2012, e também na Lei da Organização
do Sistema Judiciário, aprovadaem 2013, é evidente que as preocupações do Governo, que levaram a que
fosse aprofundado o trabalho sobre o anteprojeto inicial da Autoridade da Concorrência, fizeram todo o sentido.
É evidente que esta proposta de lei, apresentada em sede de Conselho de Ministros, será discutida aqui na
Assembleia e, com certeza, irá ter soluções mais adequadas àquela que é a preocupação da transposição desta
diretiva.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP,
tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para quem, como nós, nesta
bancada, acredita na economia social de mercado, para quem, como nós, acredita que esta é a melhor forma
de, garantidamente, conseguirmos satisfazer as necessidades dos portugueses, temos de acreditar, ao mesmo
tempo, num modelo de regulação forte, num modelo de regulação que garanta a todas as entidades, muito
especialmente aos agentes económicos que são mais pequenos — e, em Portugal, a esmagadora maioria das
nossas empresas são pequenas e médias empresas —, um modelo que, na sua prática, garanta essa mesma
proteção.
Isto é muito importante no quadro nacional, mas é absolutamente fundamental no quadro de um mercado
comum europeu, em que as empresas portuguesas não estão a competir única e exclusivamente entre elas,
estão também a competir, muitas vezes, com grandes empresas internacionais.
Por isso mesmo, temos de conseguir ir mais longe e, para lá da regulação, que tem de ser sempre feita
através de entidades administrativas dotadas de independência, é fundamental que os próprios agentes
económicos, muito especialmente os agentes económicos de menor dimensão, possam ter os instrumentos,
possam ter uma lei que os proteja quando há abusos da concorrência, quando há abusos de posição dominante,
quando há práticas que são restritivas do próprio mercado e dessa regulação que o mercado tem sempre de ter.
Ora, é exatamente por isso que a diretiva de 2014 sobre «private enforcement» é para garantir a estes
pequenos agentes económicos a possibilidade de serem indemnizados quando há abusos das práticas de
concorrência nos mercados internos, mas é, também, absolutamente fundamental no mercado europeu.