29 DE NOVEMBRO DE 2017
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Sem prejuízo de outras iniciativas já tomadas ou em curso, nomeadamente respeitantes ao ressarcimento
dos chamados «lesados», à revisão do modelo e da arquitetura de regulação e supervisão ou à transposição de
diretivas, mormente a chamada «DMIF II», os portugueses não perceberiam que, perante uma nova
circunstância, o Parlamento nada tivesse feito no âmbito das suas competências, depois de ter identificado e
concluído pela ocorrência de más práticas comerciais, insuficiente ou inexistente gestão de conflitos de
interesses e limitada ou ineficaz ação dos organismos reguladores e de supervisão.
Depois de uma análise detalhada não só das conclusões e recomendações das diferentes CPI, mas também
do processo legislativo europeu e nacional, incluindo aquele que se encontra em curso, o Grupo Parlamentar do
Partido Socialista realizou um longo conjunto de audições, onde se incluíram reguladores, supervisores,
representantes do setor, assim como associações de defesa do consumidor/cliente bancário, além das recém-
formadas associações de lesados que, após os eventos conhecidos, foram emergindo nos últimos anos.
Este trabalho, como é evidente, não ignorou os limites impostos pela legislação europeia. O sistema
financeiro nacional não existe numa ilha nem pode estar sujeito a um enquadramento legislativo que divirja de
forma significativa daquele que existe noutros países europeus e que emana da legislação europeia. Não pode
por razões legais e não deve por razões económicas. As nossas propostas têm em consideração esse contexto
e as limitações que este impõe a qualquer legislador.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista lançou esta iniciativa assumindo três fases distintas.
Em primeiro lugar, foi enviado a um conjunto alargado de stakeholders as conclusões e recomendações de
cinco CPI, que tiveram como objeto o setor bancário, tendo cumulativamente sido enviado um documento
enquadrador da iniciativa e um convite para audição. Neste âmbito, foram ouvidas as seguintes entidades:
Associação de Defesa dos Clientes Bancários, Associação de Lesados do BANIF e do Santander Totta,
Associação Movimento Emigrantes Lesados Portugueses, Associação dos Enganados e Indignados do Papel
Comercial, Associação Portuguesa de Bancos (APB), Associação Portuguesa de Consumidores e Utilizadores
de Produtos e Serviços Financeiros, Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, Autoridade de
Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários,
Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, Sindicato Independente da Banca e Sindicato Nacional dos Quadros e
Técnicos Bancários.
Em segundo lugar, neste conjunto alargado de audições foram discutidas as diferentes alternativas
legislativas e resolutivas, contribuindo para a formação de propostas no quadro dos objetivos políticos
enunciados pelo Grupo Parlamentar.
Em terceiro lugar, esse conjunto de propostas foi debatido numa conferência parlamentar, realizada a 27 de
junho, no Auditório António Almeida Santos, na Assembleia da República.
O que hoje debatemos é o resultado final desse processo.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista definiu como
objetivos nucleares introduzir legislação de proteção de clientes e trabalhadores do sistema bancário e
financeiro, em particular perante práticas comerciais agressivas, que implicam a adoção de riscos não
percebidos por agentes de mercado não qualificados e garantir uma separação clara e nítida na relação com
clientes, entre a entidade financeira colocadora de títulos de dívida e capital e os grupos que detêm ou são
detidos por essa entidade bancária.
Neste âmbito, e em particular nos casos das CPI à resolução do BES e do BANIF, foram identificadas práticas
de venda agressiva, com aplicação insuficiente dos instrumentos de adequação do produto financeiro ao perfil
dos investidores, sem levar em linha de conta a idade, o historial de investimento de cada indivíduo e quantas
vezes com práticas alegadamente de mis-selling.
Deve ainda dar-se destaque ao trabalhador bancário — quantas vezes também ele subscritor de produtos
financeiros —, que coloca estes instrumentos em circunstâncias que nem sempre podem ser consideradas
adequadas, pressionado por objetivos de desempenho que não contribuem para um processo comercial que
permita a necessária perceção de risco por parte de clientes.
Por outro lado, individualmente, os trabalhadores tomaram, em muitas circunstâncias, produtos financeiros,
recorrendo a empréstimos, acentuando conflitos de interesses e, numa relação pouco saudável, eram
simultaneamente devedores, acionistas, obrigacionistas e entes de comercialização. Nalguns casos relatados,
foram, sem dúvida, dos que mais perderam: perderam o emprego, perderam investimentos, ficaram com dívidas
e, nalguns casos, arrastaram consigo os familiares.