I SÉRIE — NÚMERO 105
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A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Além de mais, isto implica a construção de campos de contenção fora do território
europeu. Estamos de novo na velha máxima: longe da vista, longe da responsabilidade política. Não é, pois,
aceitável a proposta que a Áustria está a fazer e que era já uma proposta antiga da própria Áustria.
Portanto, estamos perante propostas, achamos nós, que comprovam os receios e alertas que temos vindo a
deixar sobre o rumo da política europeia para as migrações, mas também sobre uma visão mais geral, que se
está a construir, da Europa fortaleza, idealizada desde sempre por alguns mas que agora é levada à prática com
o aval de todos. E digo de todos porque as conclusões do último Conselho Europeu deram o aval de todos os
países da União Europeia a este tipo de política.
Da leitura dos documentos oficiais da presidência austríaca percebe-se, de facto, que existe esta
concentração de elementos que têm a ver com a vertente mais securitária da União Europeia. Não deixa de ser
revelador da verdadeira natureza do projeto europeu que a rapidez com que se avança nas propostas de
militarização e securização de fronteiras externas — e possivelmente, de alguma forma, das fronteiras internas
— se faça alicerçada nos argumentos da vaga migratória e na suposta invasão, que não existe de maneira
alguma.
Estamos perante a utilização de argumentos falsos, que têm sido a base da xenofobia e de movimentos de
extrema-direita e que estão a ser precisamente os mesmos argumentos que estão a ser utilizados por países
da União Europeia para justificar os avanços na Cooperação Estruturada Permanente, no reforço do
investimento na NATO, para justificar a fantasia da necessidade de criar fronteiras externas cada vez mais
fechadas.
Sr.ª Secretária de Estado, para terminar, o Bloco de Esquerda não aceita nem respalda qualquer destas
posições, nem qualquer da terminologia que tem sido utilizada e que tememos vá ser acirrada pela presidência
austríaca.
As prioridades da próxima presidência agoiram tudo de mau: fechamento de fronteiras externas e o possível
endurecimento nas fronteiras internas; políticas de expulsão de pessoas e seleção de quem pode ou não pode
ficar em território europeu (onde é que já vimos isto?); pagamento a países terceiros para fazerem o trabalho
que caberia à União Europeia; tentativa de dar uma falsa importância às questões do Estado de direito ou
políticas do euro ou de convergência, quando o próximo quadro financeiro plurianual apenas responde à
militarização e esquece a coesão.
Enfim, um conjunto de prioridades políticas que arredam, em definitivo, os valores proclamados da
solidariedade e do respeito pelos direitos humanos.
Sr.ª Secretária de Estado, a partir das últimas conclusões do Conselho e dos documentos que existem desta
presidência, estes valores deixaram de ter qualquer aplicação prática por todos os países da União Europeia
que aceitaram estas terminologias.
Assim, a questão que fica para o Bloco de Esquerda é se vai o Governo utilizar o poder de veto que tem —
já o deveria ter utilizado antes de ter assinado as conclusões do último Conselho Europeu —, se vai ter a
coragem de levar a cabo aquilo que tem dito sobre a defesa da solidariedade, a defesa dos direitos humanos e
se vai ou não pactuar com aquilo que são as propostas políticas da presidência austríaca.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas, do Partido
Socialista.
O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: As eleições
gerais austríacas de outubro de 2017 foram seguidas com alguma expetativa e, como sucede agora
frequentemente, também com alguma apreensão.
Chegou a haver receios da vitória de um partido antieuropeu, e até antivalores fundamentais da Europa,
populista e a raiar o xenófobo. Esse partido, o FPÖ (Freiheitliche Partei Österreichs,), não venceu, mas ficou
perto e, de alguma forma, forçou os partidos tradicionais da construção europeia a colarem-se à sua agenda,
particularmente anti migrações.
A composição parlamentar ditou um governo de coligação, integrando o referido FPÖ. Sinal dos tempos,
aquilo que em 2000 havia sido fundamento para dura reação da União Europeia — a entrada no governo do