17 DE JANEIRO DE 2019
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Quanto aos meios materiais e humanos, essa é outra questão. Aí também temos chamado a atenção para a
necessidade urgente de a Polícia Judiciária e o Ministério Público serem dotados com os meios suficientes para
um combate mais eficaz a uma forma de criminalidade cuja investigação é, naturalmente, complexa.
Mas, relativamente a estes dois institutos, podemos dizer que em relação ao enriquecimento injustificado
estamos de acordo com a necessidade e a possibilidade de se evoluir legislativamente sobre esta matéria, não
nos termos que já foram declarados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, e se na primeira vez ainda
podemos dar o benefício da dúvida quanto à sua aprovação, na convicção de que ela não seria inconstitucional,
na segunda vez ela foi claramente intencional. Portanto, tendo em conta o primeiro acórdão, era mais do que
óbvio que a insistir-se numa solução como aquela em que a maioria parlamentar de então insistiu, ela estaria
condenada ao fracasso, mas quer-nos parecer que é possível — e os trabalhos que têm sido desenvolvidos na
Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas demonstram que é
possível — que venha a haver um entendimento relativamente a uma consagração legal do combate ao
enriquecimento injustificado. Por isso é que até propusemos que, no âmbito dos trabalhos dessa Comissão, se
desse prioridade a esta matéria, procurando resolvê-la do ponto de vista legislativo na base do entendimento do
denominador comum a que for possível chegar. E estamos convictos, estamos otimistas quanto à possibilidade
de, a curto prazo, poder chegar a um entendimento.
Posição diferente temos relativamente à delação premiada. Sabemos que a ordem jurídica portuguesa tem
já alguns institutos, cautelosos, e ainda bem, de direito premial, que tiveram o nosso apoio. Mas a possibilidade
de o Ministério Público poder negociar, ainda por cima sem controlo judicial, com um denunciante, ou seja, com
alguém que cometeu um crime, que é corrupto e que tenciona ilibar-se denunciando outro alguém que pode até
nem ter cometido crime nenhum, faz com que o Ministério Público participe num verdadeiro negócio com alguém
que se pretende ilibar de crimes que cometeu, e é, do nosso ponto de vista, uma afronta ao Estado de direito.
Portanto, connosco não poderão contar para introduzir medidas legislativas no nosso País que contrariem
frontalmente o princípio da legalidade no exercício da ação penal e que constituam uma verdadeira afronta a
um Estado de direito democrático. Portanto, delação premiada, do nosso ponto de vista, não.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do
CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer
que, ao contrário do que se poderia deduzir de algumas intervenções que ouvimos, esta matéria é importante e
faz todo o sentido, porque o que está aqui em causa e que constitui a matéria de fundo que traz esta petição,
assinada, como aqui foi dito, por mais de 4000 pessoas, é o combate à corrupção.
De resto, percebendo as preocupações do Sr. Deputado José Manuel Pureza, por exemplo, e percebendo a
sua argumentação, parece-me muito óbvio o que os peticionários estão a querer dizer a esta Câmara: estão a
dizer que os partidos têm nos seus programas esta matéria como matéria importante, mas se não legislam,
então, devolvam a palavra aos cidadãos para um referendo. É isso que estão a dizer.
O que não quer dizer — e aí partilho de algumas opiniões que já ouvimos — que esse referendo fosse
possível, porque, logo à partida, um referendo sobre duas matérias diferentes e em simultâneo não seria viável
nem realizável.
No entanto, conhecemos o que tem sido feito e o que não tem sido feito em termos legislativos nesta matéria
e vamos analisar as duas matérias aqui em causa.
Quanto à delação premiada — passe a expressão à brasileira, por assim dizer —, não tem acolhimento no
nosso ordenamento jurídico e, na nossa opinião, não faz sentido que o tenha nos termos em que ela existe no
Brasil. No entanto, quero lembrar que temos já vários institutos e vários avanços que, não sendo o regime da
delação premiada à brasileira, são avanços significativos e positivos de um regime que, no nosso ordenamento
jurídico, se chama de colaboração premiada. Temos a atenuação de pena no combate à droga, temos o agente
auxiliar na recolha de prova decisiva, temos também uma colaboração especial, em processo penal, na recolha
de provas determinantes em relação a determinados agentes de crimes e temos a redução de coima nos casos
do regime jurídico da concorrência.