I SÉRIE — NÚMERO 40
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Portugal não é apenas o quarto País com maior desigualdade salarial da Europa, é o País em que essa
desigualdade não tem parado de crescer, é o País em que um quarto da riqueza nacional está concentrada em
1% da população.
Não há nenhuma relação entre estes salários absolutamente astronómicos e o desempenho das empresas,
nem em termos operacionais, nem em termos da sua cotação na Bolsa.
Sabemos que nenhuma medida sozinha acaba com a desigualdade. Precisamos de medidas fiscais sobre o
rendimento e sobre o património. Precisamos de políticas públicas de distribuição da riqueza. Precisamos de
contratação coletiva, capaz de fazer subir os salários sem a chantagem da caducidade. Precisamos de aumentar
o salário mínimo.
Os Estados, enquanto estância reguladora da economia, podem e devem fazer mais. Foi isso que o Bloco
de Esquerda propôs em setembro deste ano, que fosse fixado um leque salarial obrigatório e que fossem
excluídas de quaisquer apoios públicos, benefícios fiscais, contratações ou rematações públicas, as empresas
que o desrespeitassem. Foi essa medida que o Partido Socialista, o PSD e o CDS chumbaram em setembro.
Hoje, o Partido Socialista traz-nos uma recomendação, que é a de fazer basicamente com que o Parlamento
não tome nenhuma decisão concreta, a não ser recomendar que se abra um debate sobre o assunto na
concertação social. Esta é, na verdade, uma recomendação que faz com que o Parlamento fique refém de um
acordo dos patrões, que já sabemos não existir, para tomar esta medida.
O Partido Socialista acha mesmo que é com o acordo de Francisco de Lacerda, de Pedro Soares dos Santos,
do Pingo Doce ou de António Mexia, da EDP, que se vão combater as desigualdades salariais? Alguém acredita,
Srs. Deputados?! É como se pedissem ao cozinheiro que decidisse em conjunto com o frango o que é que ia
fazer para o jantar! Ninguém acredita nisso, Srs. Deputados!
É por isso que nós, o Bloco de Esquerda, continuamos a propor que se combata a desigualdade salarial e
que se estabeleça uma proporção máxima entre o salário mais baixo e o salário mais alto dentro da mesma
empresa. Entendemos que o Parlamento pode, e deve, decidir sobre o assunto.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Por isso mesmo, porque o Parlamento pode, e deve, decidir sobre esta
matéria e não deve ficar refém do veto dos patrões, insistiremos justamente na possibilidade de o Parlamento
fazer uma lei que combata verdadeiramente as desigualdades salariais.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para concluir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Ivan Gonçalves.
O Sr. Ivan Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, agradeço os contributos que
foram dados. Tê-los-emos em conta, uns mais do que os outros, necessariamente.
Sr. Deputado José Soeiro, na proposta que apresentou em setembro, o Bloco de Esquerda reconhece que
esta é uma matéria complexa e que deve merecer uma regulamentação da parte do Governo. Isto também
estava previsto nessa proposta, quando se pressupõe que seja o Governo a definir não só os leques salariais
que são definidos para cada um dos setores de atividade, mas também a forma de penalização das empresas,
depois da implementação dessa proposta.
Aquilo que o Partido Socialista defende, precisamente porque esta é uma matéria complexa e em linha com
o que tinha sido discutido no Congresso do Partido Socialista e aprovado já há mais de dois anos nesse mesmo
Congresso, é que esta matéria passe, em primeiro lugar, pela concertação social, especialmente no que toca
ao estabelecimento de um rácio proporcional.
A nossa proposta não contém só isto, no entanto, entendemos que esta questão deve passar pela
concertação social, não para que o Parlamento esteja refém da concertação social, mas porque pensamos que
este é o mecanismo que privilegia a concertação entre os vários setores da nossa sociedade e porque queremos
uma lei robusta, à prova de todo o tipo de criatividades, e que deve, portanto, passar também, num primeiro
plano, pela concertação social.
Entendemos que este é um primeiro passo para que Portugal legisle sobre as desigualdades salariais.