I SÉRIE — NÚMERO 103
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Curiosamente, nenhum deles está cá hoje. Não sei que significado isso tem e o mais provável é não ter
significado algum, e estou certo de que os que cá estiverem terão de encontrar o mesmo espírito de
compromisso.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Reforcei também, neste Parlamento, a convicção profunda que tenho
na liberdade e na democracia, porque é o valor e é o sistema, para lá das suas dificuldades e das suas
imperfeições, que nos permite a todos participar na sua construção diária. E, num tempo de ruturas, de
diminuição de liberdades e de retrocesso das democracias, dos regimes tomados por populistas ou minados
pela corrupção às democracias ditas iliberais, volta a ser necessário fazer uma profissão de fé na democracia.
Assisti a muito nestes 15 anos: um País que passou por uma fase de euforia e um País que passou por uma
crise profunda, em que a nossa soberania foi empenhada e em que foi preciso pagar um preço muito alto, em
sacrifício, para a podermos recuperar. Um País que, infelizmente, cresceu pouco e criou menos riqueza do que
aquela que esteve ao nosso alcance criar.
Num tempo em que podemos fazer escolhas mais livres, porque um País que cresce é sempre um País mais
livre, a pergunta que devíamos estar a fazer-nos era a de como garantir a sustentabilidade do nosso crescimento.
O que temos de fazer para que a economia de Portugal cresça em média 3% ao ano, na próxima década? Como
vamos garantir, nos próximos 10 anos, que a nossa balança comercial é globalmente equilibrada e que as
exportações representam mais de metade do nosso produto? Como vamos garantir que o desemprego, que,
depois da flexibilização da lei, tem estado sempre a cair, se mantém estável e duradouramente baixo, ao longo
dos próximos anos? Como vamos conseguir quebrar círculos de pobreza que se transmitem de geração em
geração? Como conseguimos garantir a um trabalhador, em tempos de globalização, que, pelo seu trabalho,
esforço e mérito, pode deixar mais aos seus filhos do que o que recebeu dos seus pais? Como podemos criar
condições para que aqueles que querem constituir a sua própria família o possam fazer e contribuir, assim, para
o aumento da natalidade, que é fundamental para assegurar a sustentabilidade do Estado social? E, já agora,
como construir uma sociedade mais inclusiva para os nossos idosos?
E o que queremos fazer quanto ao ambiente, nós que somos a primeira geração que começa a sentir os
efeitos das alterações climáticas e que temos o poder de, efetivamente, as contrariar, no que à responsabilidade
humana respeita? E o que estamos a fazer para preparar Portugal para a quarta revolução industrial, que já está
— usando um verbo muito em voga, mas que não existe ainda no dicionário — a «disromper» a nossa economia
e o nosso mundo laboral?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A resposta a estas questões vai ter de ser alcançada, mais do que no
confronto, na capacidade de compromisso. E não vos escondo hoje, aqui, a minha preocupação quanto às
dificuldades de se estabelecerem esses compromissos.
Assistimos a um tempo de quebra de convenções que existiram durante uma grande parte da nossa
democracia, de compromissos que, no passado, nunca haviam necessitado da palavra escrita para serem
honrados. Pela primeira vez, governa quem não ganhou as eleições; pela primeira vez, preside a esta Câmara
alguém que não foi indicado pelo grupo político com mais Deputados.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Coitadinho!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Pela primeira vez, os acordos de concertação social não são
respeitados no Parlamento. E até o respeito pelo princípio da subsidiariedade com a economia social é, pela
primeira vez, colocado em causa na prestação de cuidados de saúde e na assistência aos portugueses.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Preocupa-me tanto o desrespeito pelas convenções quer na América
do Sr. Trump, quer na Europa dos extremismos e dos populismos, como no Portugal dos dias de hoje. O que
não posso aceitar é a duplicidade de padrões!
Todos estes fatores, acrescidos de uma agenda mediática que está a ser capturada por epifenómenos que
são conjunturais, reduzem a capacidade de intervenção desta Câmara.