I SÉRIE — NÚMERO 9
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Não se decreta que os donos garantem a disciplina dos animais, garantem a limpeza e o asseio do seu
espaço e dos espaços comuns.
Não se decreta que todos os detentores de animais têm meios para cuidar deles e, portanto, não existe a
possibilidade de criarem mau ambiente em prédios em que convivem com outras pessoas.
Este é um caminho difícil, é o caminho das pedras e é preciso fazê-lo com os cuidados necessários para que
não se abram as portas aos que pretendem andar para trás.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Vá ver a letra da lei, Sr.ª Deputada!
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do Partido Socialista.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começamos por saudar a iniciativa legislativa e a questão que é colocada pelo PAN e pela Sr.ª Deputada não inscrita. De facto, ela toca
um aspeto que é importante e que diz respeito à vida e ao acesso à habitação de muitos milhares de pessoas;
no entanto, tem de ser enquadrada naquilo que é também o acesso dos vizinhos das pessoas que têm esta
necessidade, por um lado, e na posição do próprio senhorio, do titular da fração, por outro. Portanto, é na
conciliação de vários elementos, que não são simples de harmonizar no mesmo espaço, que este debate deve
ter lugar.
Ao longo dos anos, e foi bem referido nas intervenções anteriores, tem-se evoluído significativamente naquilo
que é o reconhecimento na lei civil, na lei penal, sobre o bem-estar animal como um valor a ter em conta,
também, na construção da nossa ordem jurídica. Aliás, se olharmos para outros países e para a resposta que
dão a esta mesma questão, ou seja, em que circunstâncias é que pode haver a presença de animais de
companhia no locado ou até, às vezes, em propriedade de um terceiro, encontramos soluções muito menos
avançadas do que aquelas que são as da legislação portuguesa.
Muitas vezes encontramos, de facto, uma total possibilidade de o senhorio impedir qualquer acesso de
animais de companhia por parte dos inquilinos e até temos circunstâncias em que é o próprio condomínio que
pode determinar restrições não apenas aos espaços comuns mas àquilo que se passa dentro das frações,
assumindo — precisamente porque como há trânsito e há o atravessamento das partes comuns — que isso, de
alguma maneira, pode influenciar a vida da comunidade naquele edifício.
Portanto, a legislação desses vários Estados que têm essas leituras mais intensas demonstra que o problema
não é de fácil solução e que a solução que temos de encontrar deve ter em conta não só a nossa realidade, não
só a proteção do bem-estar animal, mas também o equilíbrio da posição daqueles que, por um lado, são
proprietários e das outras pessoas que ali residem.
Os projetos de lei apresentados procuram ser cautelosos num determinado sentido, ou seja, procuram
identificar, tanto quanto possível, elementos objetivos para tentar justificar as circunstâncias em que pode haver
estes limites. Identificam o número máximo de animais por fração, identificam a detenção de animais perigosos
como sendo, também, um fator que, eventualmente, pode levar a esta proibição e referem a saúde pública, mas
verdadeiramente há um problema de base que é a construção das normas que apresenta estar feita ao contrário.
Ou seja, proclama primeiro um princípio de não discriminação (e aí sim, concordamos, em parte, com aquilo que
foi dito pelo Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo) e coloca-o no mesmo patamar daquilo que são as
cláusulas suspeitas de não discriminação constantes da Constituição da República em função da etnia, da
orientação sexual, da ascendência, etc. — elementos esses que, de facto, devem ponderar-se na criação de
uma cláusula de não discriminação porque respeitam, volto a dizê-lo, às categorias suspeitas do n.º 2 do artigo
13.º da Constituição —, a detenção de animais de companhia, que tem, de facto, um impacto que pode reverter-
se na vida de outras pessoas.
Portanto, não discordando da ideia de que é necessário legislar sobre o tema, temos de encontrar uma
solução equilibrada que encontre respaldo na Constituição, mas também na proteção dos senhorios, dos
inquilinos, das outras pessoas que ali residem e que atente à realidade do que é que estamos a discutir. É que
podemos encontrar num arrendamento rural de uma propriedade rural — e aí não chocará ninguém — uma
restrição desmesurada, essa sim chocante, que impeça a presença de um animal de companhia, obviamente.
No entanto, se estamos a falar de uma fração, de um T0 ou de um T1, num determinado contexto muito restritivo,