I SÉRIE — NÚMERO 37
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A evidência última de que o Governo falhou são os dados dos últimos 15 dias que surpreenderam os
responsáveis. E não foi só o número recorde de casos diários, foi sobretudo a subida inédita do índice de
contágio, que ninguém sabe e mal tenta explicar. A surpresa do Governo é sinónimo de desorientação e de falta
de uma estratégia clara de combate à pandemia.
Aqui chegados, após vários períodos de estado de emergência, com a pandemia descontrolada, os hospitais
à beira da rotura e os profissionais à beira da exaustão, a incompetência do Governo só parece deixar uma via:
confinar, confinar, dar cabo do que resta da economia e da saúde mental das pessoas.
Perante esta escolha dramática, seria lógico que o Sr. Presidente da República e o Governo procurassem o
maior consenso possível à volta do caminho a seguir e tivessem em conta as críticas que o Iniciativa Liberal tem
feito ao estado de emergência, desde o início: as limitações de liberdades desnecessárias, os poderes
excessivos, a falta de exigência de fundamentação científica das medidas.
Para os mais distraídos, é melhor ser ainda mais claro: estas foram críticas do Iniciativa Liberal ao estado de
emergência e não às medidas de contenção que provaram ser eficazes no combate à pandemia.
Mas o decreto que hoje aqui discutimos vai exatamente em sentido contrário: não promove consenso, antes
estimula clivagens.
É um decreto que volta a ampliar os poderes à disposição do Governo, que introduz, ou reintroduz, sem
qualquer evidência da sua necessidade ou utilidade, medidas como controlo de preços, a interferência do Estado
em negócios privados de distribuição ao domicílio ou a obrigatoriedade do teletrabalho.
É um decreto que mantém as restrições à liberdade dos trabalhadores do SNS e que acha que exigir ao
Governo a devida justificação das medidas que se tomam se resume a uma menção, de fugida, ao «melhor
conhecimento científico».
É um decreto que abre o caminho para uma crise social e económica ainda mais profunda e que seria
evitável; um decreto que mostra que não se aprendeu nada e que, em vez de arrepiar caminho, o Governo
ensaia uma fuga para a frente.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Um decreto assim, pior do que os anteriores, só pode contar com
o nosso voto contra.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
A medida mais eficaz de combate a esta e a outras pandemias é o aumento do salário mínimo nacional para os
900 €. Esta é a medida mais relevante, exatamente porque origina a criação de uma enorme bomba de oxigénio,
fundamental para garantir os direitos e as necessidades de subsistência e de acesso à habitação.
Não se pode exigir confinamento, se a questão da habitação não estiver resolvida. Não se pode exigir
confinamento, quando as pessoas têm dificuldades em satisfazer necessidades de aquecimento, necessidades
alimentares, necessidades, até, de adquirir materiais de higiene.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Apoiado!
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Por isso, é preciso repetir, sucessivamente: a pandemia da
pobreza agrava a pandemia sanitária. E esta é a guerra que nós devemos travar, a única necessária.
Não vou votar favoravelmente este estado de emergência, por não o considerar essencial para a
implementação de medidas mais eficazes, como o investimento no SNS, na saúde mental, na contratação de
mais médicos e profissionais de saúde, no apoio aos trabalhadores da cultura, trabalhadores independentes e
trabalhadores informais.
Na vacinação, também não se pode esquecer os lares ilegais. Não se pode esquecer os direitos das
emigrantes e dos emigrantes. Não se pode esquecer ainda que não é preciso estado de emergência para que
haja um apoio eficaz e imediato ao empresariado, à restauração, ao turismo.