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15 DE JANEIRO DE 2021

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Dos seus contemporâneos aos admiradores nascidos no século XX e já neste século, Eça tem tocado e

influenciado todas as gerações, demonstrando que as questões que aborda são intemporais e inerentes à

condição que acompanha cada um de nós — sermos humanos.

Eça de Queiroz foi, sem dúvida, um visionário. Conseguiu antever algumas das grandes problemáticas e

modificações da sociedade que iriam influenciar os séculos vindouros. Vejamos o exemplo do romance A

Cidade e as Serras e do conto Civilização. Nestes, Eça narra a vida de um homem, Jacinto, materialista e

consumista, rodeado das mais sofisticadas e recentes inovações tecnológicas e culturais e com acesso total à

cultura. Um modelo do homem civilizado, mas também um paradigma da infelicidade, desanimado e

entediado, apesar do excesso em que vivia. Um homem desenraizado do solo e da cultura, que, ao buscar a

felicidade, empreende uma viagem, simultaneamente exterior e interior, de autoconhecimento. Na serra, no

Douro, junto da natureza, longe da comodidade e dos aparelhos científicos, encontra, então, a felicidade que a

civilização não lhe dava.

Foram muitos os seus contemporâneos que aprenderam a ler pelos seus livros, bem como as gerações

que se seguiram. Com Eça, aprendemos também a sentir e a pensar.

De escrita simples, fina, erudita e incisiva, com uma visão irónica dos políticos e das classes dirigentes,

capaz da observação íntima das paixões e contradições humanas, o legado de Eça de Queiroz não acabou

com a sua morte, é imenso o acervo da crítica da sua obra, são inúmeras as edições e traduções, as

adaptações ao cinema nacional e estrangeiro, ou a inclusão nos programas do ensino secundário.

Eça deixou-nos uma obra universal e de leitura ininterrupta. Escritor maior, marcou a língua portuguesa,

contribuiu para a expansão da cultura portuguesa sob o signo de um forte caráter humanista. No ano em que

se assinalam os 175 anos do seu nascimento e os 120 anos da sua morte, é amplamente justa e consensual a

propositura da concessão de honras de Panteão Nacional.

Aplausos de Deputados do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar os familiares de Eça de Queiroz, a Fundação Eça de Queiroz e também o PS pela iniciativa de conceder honras de Panteão Nacional

ao escritor Eça de Queiroz.

O escritor José Maria de Eça de Queiroz, vulto maior da literatura portuguesa e com projeção internacional

na sua época, foi também jornalista e cônsul, assim como um pensador inconformado e incansável.

É um exemplo do que, nos dias de hoje, poderemos designar por ativista, na senda incansável e de pendor

pedagógico de levar os seus leitores a pensar, usando a sua pena como arma, ou como farpa implacável,

como ele diria, certeira aos usos e costumes, mas também à elite burguesa, onde eram recrutados os

dirigentes políticos e os Deputados da Câmara, numa época em que se viva em Portugal o período da

Regeneração e o rotativismo partidário.

Jovem e recém-licenciado em Direito, em Coimbra, onde integrou a Geração de 70, com Antero de Quental

e Ramalho Ortigão, através da qual é introduzido o realismo, vem viver para Lisboa, onde, como o próprio diz,

traz Proudhon debaixo do braço.

É nessa altura que escreve, com Ramalho Ortigão, As Farpas, durante os anos de 1870 e 1871, que

constituem um registo da sociedade portuguesa, nos anos posteriores, irónico, caricatural, crítico e

pedagógico.

No final do século XX, em Portugal, o neoliberalismo fazia os seus primeiros avanços. Nessa altura, novos

cronistas, podemos dizer que na senda de Eça, faziam a mesma crítica feroz aos hábitos e costumes, desta

vez travestidos de novo-riquismo, preponderante politicamente, insuflado pelos dinheiros a fundo perdido que

vinha de uma Europa para a qual Portugal tinha acabado de entrar.

Enquanto isso, uma jovem professora de História, lia e discutia com os seus alunos passagens da crónica

dedicada à Câmara. Ilustra as fragilidades do rotativismo partidário e permite, ao mesmo tempo, o exercício de

empatia histórica e de, a partir do passado, aprender a ler o presente.