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I SÉRIE — NÚMERO 73

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Hoje, é amplamente reconhecido que a exposição de menores a situações de violência doméstica é

profundamente danosa do seu desenvolvimento saudável. O entendimento de que deve ser atribuído o estatuto

de vítima a estas crianças e jovens e deve ser criado um novo tipo legal de crime para proteger o seu livre

desenvolvimento tem vindo a ser partilhado por entidades muito diversas, como a Ordem dos Advogados ou o

Conselho Superior do Ministério Público.

É isso que hoje propomos, como, aliás, já propusemos no passado. Ainda assim, tem sido difícil obter uma

maioria nesta Assembleia para que este estatuto seja reconhecido e este tipo legal seja criado. Um dos

argumentos mais utilizados é o de que a exposição de menores a violência doméstica é, em si, uma forma de

violência doméstica e que a jurisprudência já assim o entende.

Discordamos que isto obste a esta clarificação, porque sabemos que é rara a jurisprudência que tem seguido

este entendimento e porque os menores afetados não podem ficar à mercê de uma interpretação que pode

salvaguardá-los como vítimas mas que tantas vezes não o faz.

Por isso, hoje, insistimos nesta proposta e, com o objetivo de obter o maior consenso possível, desde já

informamos que iremos requerer a baixa à especialidade do nosso projeto de lei.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Entramos agora nas intervenções das demais forças políticas. Tem a palavra, para a primeira intervenção, a Sr.ª Deputada Elza Pais, do Partido Socialista.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste Dia Mundial da Criança há — já aqui foi dito — uma dimensão simbólica ao falarmos neste Parlamento dos direitos das crianças e de tudo o que

nosso no ordenamento jurídico tem sido feito para as proteger.

Saudamos, por isso, todas as iniciativas legislativas que visem aperfeiçoar o atual regime legal para

robustecer os instrumentos de proteção das crianças vítimas de crime, no caso, vítimas de crime de violência

doméstica, e fazemos uma saudação muito especial aos mais de 48 000 subscritores da petição para a

aprovação do estatuto de vítima para crianças inseridas no contexto de violência doméstica, na figura das suas

primeiras subscritoras, Francisca Barros e Dulce Rocha.

Com efeito, a violência doméstica e a violência contra as crianças continuam a ser — já aqui foi dito — um

grande flagelo, que se mantém em patamares muito elevados, pese embora tudo o que temos vindo a fazer ao

longo destas décadas e tem sido muito. Isto exige de todos e de todas nós os mais redobrados esforços para

encontrarmos soluções inovadoras para continuarmos a combater e a proteger as crianças vítimas vulneráveis.

Os dados oficiais não deixam, Sr. Presidente, qualquer dúvida: dão-nos conta de que uma das primeiras

situações de perigo mais comunicadas às CPCJ (comissões de proteção de crianças e jovens) é a violência

doméstica, com 29% de casos comunicados; de que em cerca de 31% dos casos registados pelas forças de

segurança as ocorrências foram presenciadas por menores; o RASI (Relatório Anual de Segurança Interna)

deste ano dá conta de que a violência doméstica diminuiu 6,3% — não vou aqui trazer à discussão o

silenciamento ou as respostas públicas antecipadas para apoiar e proteger as vítimas —, mas, de todo modo, a

violência contra menores aumentou, ainda assim, ligeiramente.

O combate à violência doméstica — é sabido — tem, efetivamente, assumido prioridade central nas

governações socialistas. Está plasmado no Programa do Governo um conjunto de medidas para combater todas

as formas de violência, em particular contra as mulheres, incluindo os homicídios, bem como o aperfeiçoamento

dos mecanismos de proteção das vítimas, incluindo as crianças e os jovens.

Nesta linha, o Governo apresentou a essa Assembleia uma proposta de lei, que está a ser discutida, na

especialidade, e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou uma proposta de alteração a essa

proposta de lei, também em discussão. Pensamos que é no quadro desse debate que as propostas têm de ser

apreciadas, mas é importante, desde já, que se diga que as crianças não estão desprotegidas no nosso

ordenamento jurídico. Contudo, e temos visto isso ao longo destes tempos, nomeadamente nas audições que

fizemos no quadro da petição, tem vindo a configurar-se a importância de clarificar a lei em vigor, nomeadamente

o texto do artigo 152.º do Código Penal e o artigo 67.º-A do Código de Processo Penal, de modo a evitarem-se

dúvidas de interpretação na aplicação da legislação para se menorizarem efeitos negativos, que sabemos que

existem, de interpretações menos corretas que podem ser prejudiciais à proteção das crianças.

Nesta linha aponta o GREVIO (Group of Experts on Action against Violence against Women), que diz que

Portugal deve rever a definição de vítima e também que deve promover uma maior articulação entre o tribunal