2 DE JUNHO DE 2021
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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, mesmo na parte final da sua intervenção, citou um autor — mais do que um autor, é uma figura que muito
apreciamos: Nelson Mandela. Dir-lhe-ia que há uma coincidência feliz na data de debate destas iniciativas, que
é a de serem debatidas no Dia da Criança. Devo confessar-lhe que não sou grande entusiasta dos dias disto e
daquilo — acho que já há dias para quase tudo e mais alguma coisa —, mas o Dia da Criança tem um significado
grande, uma simbologia grande, pelo que estarmos a discutir estas matérias no Dia da Criança obviamente que
também é relevante.
Referi-me à questão do autor para, em invocação do dia, escolher um dos grandes autores — talvez, até, um
dos maiores — da nossa língua, que tinha toda a razão quando dizia: «Grande é a poesia, a bondade e as
danças…/Mas o melhor do mundo são as crianças.» Portanto, a propósito de citações, cito Pessoa para explicar
a importância da data e a relevância do debate.
Temos discutido o tema muitas vezes e, se assim fosse, de facto, este debate nem seria necessário. Estou
de acordo que, numa sociedade avançada, evoluída, não deveríamos, sequer, ter necessidade deste debate.
Mas a verdade é que temos, a verdade é que ele está próximo de muitas coisas que discutimos, por exemplo
da Convenção de Istambul, que é uma matéria essencial e que prevê, precisamente, esta possibilidade. E
também é verdade que nós, que aqui temos discutido tantas vezes a violência doméstica, a centramos — e com
razão, não é sem ela — na mulher, que, sabemos estatisticamente, é a principal vítima da violência doméstica.
Mas não podemos ignorar — e temo-lo dito também outras tantas vezes — nem a violência contra idosos,
nem, sobretudo, a violência e a exposição das crianças em contexto de violência doméstica.
Há uma característica muito especial para a qual, de resto, esta petição, que teve quase 45 000 assinaturas
e que aproveito para saudar, cumprimentando e felicitando os peticionários, chamou a atenção nas suas
declarações: se, por exemplo, mesmo as mulheres que são vítimas de violência doméstica são, muitas vezes,
vítimas silenciosas, por várias razões, as crianças são ainda mais vítimas silenciosas, porque muitas vezes
partilham afetos com os agressores, não compreendem o que está a acontecer, têm um receio muito próprio
das crianças, e isso pode fazer com que essa situação traumática a que são sujeitas as acompanhe ao longo
da vida e, obviamente, seja determinante de um ponto de vista negativo.
Não diria que elas próprias se tornarão violentas por isso — depende, pois cada caso é um caso —, mas
todas as crianças expostas a este tipo de violência serão, seguramente, pessoas marcadas e que não
esquecerão, muitas vezes, aquilo que viveram e que presenciaram.
É por isso que o CDS se junta a esta discussão, no pressuposto e no enquadramento dos nossos valores,
segundo os quais os mais vulneráveis na sociedade têm de ser exatamente aqueles que têm de ser protegidos,
e juntamo-nos com um projeto dizendo, precisamente, que a criança não é, por assim dizer, uma vítima ou um
dano colateral da violência doméstica, não é uma vítima porque estava lá, é uma vítima direta da situação de
violência doméstica.
Por isso, estamos de acordo com a alteração do artigo 152.º e propomos também que, efetivamente, o
estatuto de vítima direta nas situações de violência doméstica seja atribuído às crianças, o que nos parece
integralmente justo, correto e consta, de resto, da petição que aqui foi apresentada.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, ainda para apresentar uma iniciativa legislativa, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os 45 000 peticionários, na pessoa da primeira subscritora, Francisca Barros.
A violência doméstica é um crime com milhares de vítimas em Portugal, na sua grande maioria mulheres. É
um crime hediondo, com consequências físicas e psicológicas prolongadas no tempo, mas não só para as
vítimas agredidas, também os menores expostos à violência doméstica sofrem estas consequências.
Em 2019, de acordo com o relatório anual de monitorização de violência doméstica do Ministério da
Administração Interna, das participações de violência doméstica às forças de segurança cerca de 31% foram
referentes a ocorrências presenciadas por menores. O mesmo relatório dá conta de que foram recebidas por
essas forças de segurança, em média, três participações de violência doméstica não por mês, não por semana,
não por dia, mas por hora. Ou seja, se um terço destes crimes são presenciados por menores, na próxima hora,
em média, haverá a participação de uma ocorrência de violência doméstica presenciada por menores. É um
dado muito preocupante.