24 DE JUNHO DE 2021
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Olha que bonito! Eu tenho património que não sei como explicar, o que é que faço? Faço o Modelo 10 do
IRS: «Olhe, foi assim, o património caiu-me do céu, agora está aqui. Foi um incremento de Categoria G, levem
lá com isto e esqueçam!» Isto é o projeto do PCP. E se quiser pedir-me esclarecimentos, peça que eu tenho
aqui o seu projeto e sei bem que se há coisa que este projeto não faz é combater a corrupção e combater o
enriquecimento ilícito.
Sr.ª Deputada Cláudia Santos, eu tinha de guardar para si uma grande parte desta intervenção. Quando diz
que a riqueza incompreensível num cargo político devia ser criminalizada, de facto, é verdade. Mas isso é só a
conversa do Partido Socialista, porque todas as vezes que isso aqui veio votaram contra. Com cartas do Victor
Hugo ou sem cartas do Victor Hugo, e se quiser cartas do Lenine, também lhe envio, a verdade é que o PS só
quer é votar contra.
José Sócrates dizia que não porque não era o momento, António Guterres dizia que não porque a questão
não se está a colocar lá fora e a Dr.ª Cláudia Santos diz que não porque o Victor Hugo não gosta e porque
gosta muito do nosso sistema judicial penal e da nossa tradição. Cada um escolhe os motivos que entende!…
A verdade é esta: o PS não quer criminalizar o enriquecimento ilícito, porque se quisesse, na sexta-feira,
trazia aqui o enriquecimento ilícito. Ou vai dizer que não tem meios para o fazer, com cento e não sei quantos
Deputados para preparar um projeto?! Tinha todas as formas e momentos para o ter feito e não o quis fazer.
Disse que a presunção de inocência é um motivo atendível. E é, sem dúvida, Sr.ª Deputada. Por isso, no
nosso projeto, fizemos questão de referir o motivo justificado, que caberia ao próprio para justificar como é que
aquele património ocorreu. É que não há outra forma de fazer isto!
A outra forma é seguir esta via do PCP, que é aumentar obrigações declarativas e criminalizar uma
obrigação declarativa. Isso, sim, é um truque — um truque penal! —, porque é dizer que o crime não está no
enriquecimento está em falhar uma obrigação declarativa.
A Sr.ª Deputada sabe isso muito bem, porque isso já foi dito não por mim mas por muita gente antes de
mim, e muito melhor do que nós os dois que aqui estamos hoje sentados. Portanto, se esses o dizem, e a Sr.ª
Deputada sabe bem que o dizem, o que estamos a fazer com estas propostas é criminalizar obrigações
declarativas acrescidas. E isso, com uma pena de prisão até cinco anos, é risível, risível face ao nosso
ordenamento jurídico e risível face aos ordenamentos jurídicos lá fora, como a Sr.ª Deputada sabe bem.
Temos é de ter coragem de resistir e dizer que o que estamos a criminalizar é aqueles que enriquecem
sem justificação. Isso é que devíamos ter coragem de fazer: criminalizar quem não tem um mínimo de
justificação, porque, de facto, o dinheiro não cai do céu. Se eu começar a andar de barco e se chegar de avião
ao Parlamento, não podemos dizer que é tudo normal, com o meu salário de Deputado.
Portanto, é isso que temos de dizer, sem papas na língua — claro, para os portugueses perceberem que é
isso que queremos criminalizar —, e não andar aqui à volta com as cartas do Victor Hugo e as cartas do Papa,
porque o que precisamos é de criminalizar o enriquecimento ilícito.
Sr.ª Deputada, no filme Feios, Porcos e Maus havia a expressão seguinte: «andar à procura de trabalho e
pedir à Virgem Maria para nunca o encontrar». É isto o que o PS faz com o enriquecimento ilícito, ou seja, vem
aqui falar do Victor Hugo, falar disto e daquilo, mas quando chega ao momento de votar: «Ai, é a democracia;
ai, são os direitos humanos; ai, é a presunção de inocência». Boa sorte a explicarem lá fora o que é a
presunção de inocência na luta contra a corrupção e contra o enriquecimento ilícito.
Sr. Deputado José Manuel Pureza, reservei também para si uma parte significativa desta intervenção
porque disse — e disse com firmeza, com aquela firmeza que o caracteriza — que este agendamento era um
truque.
Procurei lembrar-me de quais tinham sido os agendamentos do Bloco ao longo dos últimos tempos. Além
das tretas habituais das nacionalizações, que vêm sempre a reboque — depois o PCP vem atrás do Bloco,
etc., etc., —, acho que se há partido que não pode falar de truques no Regimento e no Estatuto, Sr. Deputado,
é o Bloco de Esquerda. E não me faça falar mais!… Acho que, neste momento, o Bloco falar de truques no
Regimento e no Estatuto não é o mais indicado, mas isso ficará com a sua consciência.
Agora, há uma coisa a que o Sr. Deputado tem de responder sobre se quer ou não — disse o Sr. Deputado
— criminalizar este comportamento em titulares de cargos políticos. E os outros? Repito, e os outros?! Ficam
fora do projeto do Bloco de Esquerda?
O próprio Bloco, que pôs cartazes pelo País inteiro a dizer, «Meus senhores, o dinheiro não cai do céu!»,
vem agora à Assembleia dizer que só quer criminalizar os titulares de cargos políticos. E os outros, Sr.