24 DE JUNHO DE 2021
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Por isso, há uma coisa que a direita deve saber: é que não haverá qualquer solução à direita sem que a
criminalização do enriquecimento ilícito seja uma realidade, no que depender do Chega e no que no Chega a
sua força depender.
Disse o Sr. Deputado Jorge Lacão: «sejamos democratas». É isso mesmo que os portugueses esperam
ouvir esta tarde, «sejamos democratas», enquanto olham para o presidente de câmara que está a ser julgado
por corrupção, enquanto olham para o presidente de junta que desviou dinheiro para carros pessoais e que
andou a fazer viagens com o dinheiro dos contribuintes — meus amigos, sejamos democratas! Afinal, têm de
ter cuidado com aqueles que só acham que a democracia é um processo e que estão cá para a destruir,
porque são os mauzões, e que, quando puderem, farão deste Parlamento uma Câmara unitária e securitária.
Mas não é assim, Sr. Deputado: é que entre ser democrata e olhar para as pessoas como estúpidas, vai
uma grande diferença, entre dizer que somos democratas e gozar com os portugueses, vai uma enorme
diferença. Os portugueses veem-se com a maior carga fiscal de sempre, veem-se a pagar impostos que nunca
mais acabam e veem que políticos, ou não políticos, conseguem pôr o dinheiro atrás das costas, sair pela
porta de trás e desaparecer sem serem vistos, uns em Cabo Verde, outros nas Filipinas, outros, aqui, na
Ericeira ou em Cascais,…
Protestos do PS.
… a gozar com quem paga o salário dos portugueses e com quem, efetivamente, faz de Portugal um país
que ainda possa ser decente.
Mas diz também o Partido Socialista que insistir no erro é um disparate. Não sei se insistir no erro é um
disparate ou não. Há muitos erros na História que começaram por ser defendidos por um e passaram a ser
defendidos por cem, por mil, por um milhão, por vários milhões. Ontem talvez fôssemos poucos, hoje somos
muitos e um dia creio que poderemos ser milhões a defender aquilo que, efetivamente, é o correto.
O que não poderemos dizer, porque não temos esse direito, é que qualquer solução que queira criminalizar
o enriquecimento ilícito, não pelos deveres declarativos, mas pelo aumento injustificado do património, colide
de frente com a presunção de inocência ou com os direitos humanos.
O que não podemos dizer aos portugueses é que a razão pela qual ex-primeiros-ministros, como aquele
que referi, sairão impunes de grande parte dos seus crimes é porque os direitos humanos, a presunção de
inocência e o «sejamos democratas» assim o exigem. Boa sorte, a explicar isso aos portugueses!
E boa sorte a explicar que aqueles que tinham o dever primeiro de gerir e zelar pela coisa pública foram os
primeiros a enriquecer à sua custa e a desaparecer, escudados por uma lei que já poderia ter sido alterada e
não o foi porque a esquerda e a extrema-esquerda não o quiseram.
A verdade, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, é que o Partido Socialista está no Governo há sete anos,
tem, ou teve, uma maioria estável durante cinco anos e tem o PCP sempre pronto a dar-lhe a mão em todos
os anos que se seguirão, com medo de eleições antecipadas. Com todo este cenário extraordinário, como é
que não se consegue aprovar uma norma sobre o enriquecimento injustificado ou ilícito?
Com uma maioria parlamentar clara, que os portugueses concederam em 2015 e 2019, só não a aprovam
se não quiserem. Mas a regra e a justificação vão sempre ser as mesmas: «Ah, não podemos, por isto; não
podemos, por aquilo; não é o momento, mais para a frente será.» Entretanto, a legislatura acaba, já não
estarão em maioria e a culpa será da direita que não quis fazer o seu trabalho.
Tem sido este o papel do PS e da esquerda nos últimos anos e é contra isto que temos de nos elevar,
porque as maiorias desta Casa vão e vêm, ao sabor das eleições, as maiorias desta Casa vão e vêm, ao
sabor da vontade dos portugueses, mas o enriquecimento ilícito e as suas vítimas continuarão a persistir na
memória de todos e na destruição de Portugal.
Portugal tem descido sistematicamente nos índices de transparência e contra a corrupção. Portugal tem
sido dos países do mundo onde um primeiro-ministro está a ser julgado, e de forma inacreditável, perante a
opinião pública. Portugal tem descido sistematicamente, na avaliação da OCDE (Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Económico), na luta contra a corrupção, na luta contra a fraude fiscal e
branqueamento de capitais e na luta contra o tráfico de influências.