I SÉRIE — NÚMERO 28
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em particular para a mãe — terem de passar todo o processo do parto de uma criança e verem um projeto de
vida, um projeto familiar nascer já sem vida.
Todos sabemos que, de facto, estes primeiros dias são essenciais, mas há algo a que nós, enquanto
legislador, e a sociedade somos chamados a dar resposta. Além de termos o dever de agir como uma aldeia,
de estimular estes pais e mães a conseguirem ter um suporte que apoie a sua dor, um suporte que lhes
permita seguir em frente, sem estipular qualquer tipo de prazo, nomeadamente legal — como se o luto tivesse
de estar condicionado a estes dias —, caberá aqui à lei influenciar a própria sociedade, reconhecendo o direito
ao luto de 20 dias, quer dos pais e mães que perdem o filho quer das mães com perda gestacional, nestes
casos, mas também aumentando o prazo para quando se perde um ente querido, porque também não faz
qualquer sentido que alguém que perde um companheiro de uma vida tenha tão pouco tempo para se
restabelecer.
Hoje somos todos chamados a reconhecer que o atual regime é insuficiente para proteger a saúde
psicológica, o bem-estar destes pais e destas mães e também para proteger a nossa sociedade perante o
dever emocional que todos têm de poder viver a alegria, mas também a dor.
Aplausos do PAN.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para apresentar o projeto do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Haverá, porventura, entre nós e, certamente, nas galerias desta Sala quem tenha a experiência aflitiva de que hoje falamos. Pela minha parte,
não posso imaginar a dor de perder um filho, mas sei, como, aliás, sabemos todos e todas, que é cruel a lei
que temos, que confere apenas cinco dias de luto para este acontecimento inexprimível e traumático.
A Acreditar — Associação de Pais e Amigos das Crianças com Cancro, que cumprimento e saúdo com
imenso reconhecimento e respeito, fez uma petição para alargar esse período para 20 dias e recolheu, em
poucos dias, mais de 80 000 assinaturas. O mote da petição que desencadeou este debate diz o essencial: «O
luto de uma vida não cabe em cinco dias».
Na verdade, como aqui já foi dito, o luto pode durar toda a vida, ele é diferente de pessoa para pessoa,
varia ao longo do tempo, vai e vem, depende daquilo em que acreditamos, de como enquadramos as nossas
experiências, mas também das circunstâncias da nossa rede social e familiar, de tantas coisas.
Certamente não será também em 20 dias que se faz este caminho longo, mas uma coisa é certa: a
previsão legal de um período tão curto — de cinco dias apenas — para recuperar de um evento tão traumático
é claramente desfasada da realidade e das necessidades de quem trabalha. Como se pode contar que ao fim
de cinco dias as pessoas estejam em condições emocionais de ir trabalhar? Mas não é só a dimensão
emocional, são também as vicissitudes do próprio processo burocrático que lhe está associado, é tudo o que é
preciso fazer e reorganizar.
Por isso, dar este passo, que a petição que hoje debatemos solicita ao Parlamento, é de um elementar bom
senso e de elementar sensibilidade. Na realidade, os prazos são curtos para qualquer situação das que estão
previstas no Código do Trabalho associadas ao luto. Dois dias pelo falecimento de um irmão não será pouco?
É pouco.
Assim, entendemos que, aproveitando que estamos a revisitar estas normas do Código, deveríamos ajustar
o conjunto destes prazos, aumentando todos numa proporção equilibrada. Se, no caso da perda de um filho,
os cinco dias são chocantes e devem mudar, seria igualmente justo prever um prazo mais generoso para
outras situações, contemplando assim mais tempo para um processo que é sempre duro de múltiplos pontos
de vista.
Dir-se-á que, em alguns casos, as entidades empregadoras já vão além dos períodos definidos na lei para
este efeito, e é verdade. Mas isso demonstra, no fundo, que existe o reconhecimento de que a lei está aquém
do que deve ser a prática.
Por outro lado, há quem tenha argumentado, nomeadamente nas audições que fizemos, que há
trabalhadores que podem querer voltar ao trabalho rapidamente e que isso pode fazer parte do seu processo.
Com certeza que sim, mas isso será sempre uma escolha sua, mesmo que a lei lhe dê o direito a um período