I SÉRIE — NÚMERO 24
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Portanto, nada me dá tanto desprazer, desgosto, pesar, quanto estar aqui a dizer exatamente o contrário e
estar a dizê-lo a si, Sr. Secretário de Estado, a quem reconheço que, no debate connosco, teve sempre uma
atitude de elevação e respeito.
Mas tenho de dizer aquilo que vejo, e aquilo que vejo é um ensino superior em que as pessoas estão a viver
sob uma incerteza terrível. São pessoas que deram décadas da sua vida ao que consideram ser o País do
futuro, que são aquelas de que nós precisamos, mas que agora não sabem se conseguirão manter os seus
empregos. São pessoas que têm uma promessa de um programa FCT-Tenure, que, passe a infelicidade do
nome, o que já discutimos aqui várias vezes, afasta as pessoas comuns da própria universidade e do ensino
superior, sabendo nós que muitas universidades e muitas instituições do ensino superior, incluindo politécnicos,
não acompanharão.
Ainda por cima, temos as notícias de ontem dos projetos do Concurso Estímulo ao Emprego Científico: os
primeiros dados indicam uma autêntica razia, em particular numa área sobre a qual perguntei tantas vezes, sem
nunca conseguir que a Sr.ª Ministra dissesse uma vez uma palavra, que é nas humanidades e nas ciências
sociais.
Pese embora o Sr. Secretário de Estado tenha dado o corpo ao manifesto nessas ocasiões, falando em nome
de uma área que, aliás, é comum a nós dois e a muitos outros nesta Casa, a verdade é que não se entende
uma Ministra que não tenha uma estratégia, uma visão para as humanidades, para as ciências sociais, para as
letras e para as artes no ensino superior.
É que «universidade» acarreta uma ideia de universalismo. É o espaço das ideias e da discussão das ideias
sobre como funciona o mundo, como funciona a economia, como funciona a sociedade, como funcionam as
próprias ideias. Portanto, o que temos aqui é uma oportunidade perdida.
Diria que um Governo apoiado pelo PS, que tem a seu favor um Ministro — com «M» maiúsculo — da Ciência,
Tecnologia e Ensino Superior que foi Mariano Gago, aqui apresenta um exemplo a contrario, daquilo que não
se pode fazer.
Não vou falar, por exemplo, das notícias dos últimos dias acerca da cessação de contratos com as
universidades americanas onde se faziam programas de investigador visitante com os nossos cientistas e
investigadores em geral.
Podemos discutir essa decisão, se ela é boa ou se ela é má, mas anunciá-la, de forma improvisada, no fim
de um governo de gestão, sem fundamentação, é um erro tremendo. Se há espaço na sociedade portuguesa
em que se pode discutir estratégia e em conjunto é precisamente no ensino superior, porque é aí que é possível
envolver as pessoas. No entanto, nunca tivemos, neste Parlamento, uma discussão séria sobre o modelo de
financiamento do ensino superior.
Esse modelo, no entender do Livre, deve assentar num tripé em que a atividade económica deve ajudar a
financiar um fundo estratégico para o ensino superior, para fazer os laboratórios, as bibliotecas, os programas
de futuro que não se compadecem com os quatro anos dos ciclos governativos. O Estado deve assegurar
despesas de funcionamento, e devemos discutir, sim, a ideia de pessoas que beneficiaram do ensino superior
e que estão nos primeiros escalões de rendimentos, nos 10 % mais ricos deste País, que ajudem a um fundo
de apoio ao estudante do ensino superior para as bolsas, para as cantinas, para as despesas que os estudantes
tenham. Se muitos de nós beneficiámos na prática de ter estado no ensino superior, teríamos todo o orgulho,
toda a vontade de ajudar as gerações de estudantes que vêm a seguir a nós.
Podemos dizer o que quisermos destas ideias — que não são suficientemente boas, que as queremos
estudar mais, o que quer que seja —, mas temos de as discutir. E não as discutimos!
Nunca o modelo de financiamento foi discutido a sério neste Parlamento, nunca ele foi discutido a sério com
a comunidade académica. Talvez com o CRUP (Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas) e com
o CCISP (Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos), mas mesmo aí não punha as mãos no
fogo.
O Livre apresentou uma proposta que o PS e o Governo têm a oportunidade de apoiar hoje. É um aumento
de 35 milhões para a FCT. É razoável e é uma proposta que ainda permite mitigar alguns dos danos. Por favor,
hoje faça o que é certo e apoie essa proposta.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção sobre este artigo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do
Ensino Superior, Pedro Nuno Teixeira.