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II SÉRIE — NÚMERO 71
vão trabalhar. Por outro, são, na maioria dos casos e particularmente na Europa, protegidos adequadamente pela legislação local, recorrendo, para o efeito e se o quiserem, a esquemas de aposentação ou assistência médico-social que implicam prestações por parte da entidade patronal —o Estado Português— que este cumpre. E se, por vezes, o não fazem, de tal facto não poderá ser responsabilizada a Administração, pois tal se deve à vontade de não efectuarem os descontos exigidos e que são a contrapartida das regalias usufruídas. Isto porque eles próprios encaram a sua situação com carácter de transitoriedade, não estando interessados em esquema de aposentação ou outros, dos quais, por não haver intenção de permanência suficientemente longa, não poderão vir a beneficiar. Ou então porque, simplesmente, pretendem a fruição de regalias sem a contrapartida fiscal correspondente.
1.5 — Existe, portanto, uma diferença de estatuto entre o pessoal assalariado local e o pessoal administrativo e auxiliar do quadro do Ministério dos Negócios Estrangeiros colocado no estrangeiro. Diferença de estatuto que se radica em considerações de carácter funcional —ao pessoal administrativo é exigível responsabilidade, confidencialidade e eficiência em maior grau que ao pessoal assalariado e para isso é suposto encontrarem-se adequadamente preparados — e considerações de carácter pragmático — para tarefas mais rotineiras de apoio burocrático c administrativo, de volume variável no decurso do tempo, procura-se pessoal de contratação local, bem como para tarefas (limpeza, porteiros, empregadas domésticas, etc.) em que seria absurdo enviar pessoas expressamente de Portugal.
Desse modo, a definição de um critério de fixação de vencimentos necessariamente tem de atender à diferenciação das situações, nomeadamente ao facto de que, ao mandar-se alguém de Lisboa que tem de instalar residência num país estrangeiro, se cria uma situação completamente diferente da contratação de alguém localmente, suposto já possuir a suficiente inserção no meio. E isto tanto vale para os estrangeiros, que constituem a maioria dos assalariados locais, como para os portugueses que procuram no estrangeiro emprego e que o conseguiram em organismos dependentes do Estado Português. Ora, como já se disse, para este pessoal assalariado local os direitos e obrigações são regulados não pelo Estado Português, mas pelo direito local, e, nessa medida, a fixação do salário e a definição dos direitos e obrigações processam-se de acordo com as condições do mercado de trabalho para profissões semelhantes. Por exemplo, uma mulher de limpeza num consulado em França tem um salário equiparável ao de uma mulher de limpeza de um grande armazém; um dactilógrafo numa embaixada na Europa tem um salário semelhante a um dactilógrafo de uma empresa "situada na mesma capital europeia em que se situa essa embaixada.
É óbvio que se verifica com frequência haver pessoal assalariado local que ficou contratado por tempo suficiente para criar expectativas de permanência indefinida. É óbvio ainda que existe pessoal assalariado local que demonstrou na prática ser diligente, competente e responsável, e que, nessa medida, ao Estado Português interesse manter ao serviço, promover profissionalmente e dar uma perspectiva de futuro, permitindo uma ascensão profissional que vai dá cate-
goria mais baixa de escriturario-dactilógrafo à mais elevada de vice-cônsul, passando por secretário de 2.ª classe, de 1.ª classe, assistente-tradutor e chanceler. Mas a esses, ao criar-se-lhes uma expectativa legítima de emprego permanente, compete-lhes inscreverem-se nos serviços de previdência, assistência na doença e reforma, etc., a que têm direito pela legislação local ou por acordos bilaterais firmados com o Estado Português; a esses também cumprirá pagar os impostos, taxas e prestações que essas regalias implicam, pois que a parte que for devida pela entidade patronal — o Estado Português — também será paga, e tem-no sido quando é o caso.
Mas isso não deverá esconder que o seu estatuto não é de funcionário público e não pode a Administração, num contexto geral de contenção de despesas, encarar a perspectiva de uma qualquer integração na função pública de largas centenas de pessoas (cerca de 1500) que não possuiriam em muitos casos as qualificações curriculares e habilitações literárias exigíveis ao restante pessoal de administração pública de categoria equivalente, não passaram pelo mesmo processo de selecção, nomeadamente concurso de entrada e ascensão numa carreira, e, na maioria dos casos também, seriam estrangeiros. E, mais uma vez se afirma, isto não quer dizer que fiquem desprotegidos face a eventuais arbitrariedades, pois a eles se aplicam a legislação local e os esquemas de previdência em sentido lato de que queiram usufruir, nunca tendo recusado a entidade patronal a prestação que a lei local lhe impuser.
1.6 — Face ao que precede facilmente se entenderão as diferenças entre os vencimentos de funcionários públicos colocados no estrangeiro e pertencentes aos quadros do Ministério dos Negócios Estrangeiros e os salários do pessoal eventual assalariado localmente, pois uma coisa é criar condições de vida com um mínimo de dignidade a pessoas qualificadas expressamente mandadas trabalhar para o estrangeiro e outra é o aproveitamento, a título supletivo, nas condições de oferta e procura de trabalho, de pessoas já radicadas nesses países. Mas não serão tão excessivas quanto se julgará. Assim, por exemplo, um funcionário do quadro administrativo colocado em França ganha neste momento 3550 francos franceses e um assalariado local que desempenhe tarefas burocráticas, de menor responsabilidade, acentue-se, mas de execução aparentemente semelhante, ganhará, conforme a sua categoria, entre 2700 e 3400 francos franceses.
Por outro lado, a diferença de vencimento entre o pessoal do quadro diplomático e o pessoal do quadro administrativo é aquela que lhe é atribuída pela letra inerente à sua categoria. E quanto às verbas complementares recebidas, estas são de natureza diferente, pois para os primeiros têm a natureza de um subsídio de representação destinado a possibilitar uma vida social que o costume e a prática diplomática tradicional pressupõem intensa e que, a não existir, praticamente extinguiria a razão de ser de representantes portugueses no estrangeiro, e para os segundos têm a natureza de um subsídio de residência, plenamente justificado pela necessidade de criação de condições condignas de vida, sem as quais haveria a maior dificuldade em encontrar pessoal disposto a partir. Na prática, e nos termos da lei, são estes subsídios distribuídos por despacho ministerial, por rateamento da dotação orçamental global competente, e têm sido