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8 DE OUTUBRO DE 1981

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próprio. Mas tal já se encontra na Constituição, simplesmente noutro sítio. A que propósito transferir para os princípios fundamentais essa ideia, tanto mais quanto é certo que se tirou daqui a autonomia das autarquias locais, que certamente será tanto ou mais importante nos princípios fundamentais do que transferir a ideia dos órgãos de governo próprio?

Contudo, esse aspecto, a meu ver, não é o mais importante. O mais importante é o papel que agora se passou a dar aos estatutos. É que os estatutos, no n.° 2 do artigo 6.° da Constituição, são dotação das regiões, são, digamos assim, a matriz da autonomia. Os estatutos são os estatutos da autonomia e das regiões. No projecto de lei da AD, os estatutos deixam de ser isso. As regiões passam a vogar no ar e os estatutos são os dos órgãos de governo. Esta proposta da AD, cujo significado não pode passar despercebido, não foi uma mera ligeireza verbal. Isto tem um sentido muito claro e político que, obviamente, não pode deixar de merecer a atenção. Pela nossa parte, não é apenas atenção, mas rejeição. Em todo o caso, creio que isto não pode passar despercebido com a ideia de que se trata apenas de uma correspondência entre o querido e o dito.

A nosso ver, é positivo que a AD, perante a chamada de atenção que esta discussão tem permitido, tenha, digamos, descido um bocado com os pés à terra e tenha visto que isto não tem ponta por onde se pegue, isto é, não tem pés nem cabeça

Ao contrário daquilo que se tem dito, que, como uma reformulação, é possível tirar alguma coisa desta proposta, creio que a mesma não tem emenda e a única solução, de facto, é, pura e simplesmente, retirá-la O que está na Constituição está bem; aquilo que se propõe é mau. Só há, pois, uma solução, é a dè dizer que o que está na Constituição está bem e que aquilo que se propõe é mau; logo, retira-se. De facto, a proposta não tem ponta por onde se lhe pegue.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI):—Sr. Presidente,

Srs. Deputados: Começaria pelas últimas afirmações do Sr. Deputado Vital Moreira, salientando algumas divergências em relação ao que ele disse.

Julgo que o artigo 6.° da Constituição está bem, pois são fórmulas felizes e sintéticas. Se há infelicidade, ela está, a meu ver, em dizer-se: «[...] autonomia das autarquias locais [...]», em vez de «[...] autonomia do poder local [...]».

Contudo, há também, a meu ver, uma infelicidade — em que ainda não se atentou — quanto à actual epígrafe. Dizer-se «Estado unitário» é uma epígrafe pobre, que não corresponde ao conteúdo do artigo. O artigo não se limita a dizer que Portugal é um Estado unitário —também o era na Constituição de 1933 ou na de 1911 —, avança, consagrando três princípios fundamentais: o da autonomia dos Açores e da Madeira, o da autonomia do poder local e o da descentralização democrática da Administração Pública.

Paradoxalmente, a Aliança Democrática, que muda a epígrafe, vem, por seu lado, empobrecer o conteúdo do artigo. Julgo que a actual epígrafe não é

satisfatória; penso que a epígrafe, que eu próprio sugeri, «Estado unitário regional» merece meditação e reflexão, pois envolve problemas de extrema delicadeza; contudo, atrever-me-ia a sugerir uma outra epígrafe que porventura abrangeria as três realidades que estão hoje contempladas no antigo 6.° da Constituição: a de «Estado unitário descentralizado».

Portugal é um Estado unitário, mas não apenas; é um Estado descentralizado em três níveis: a descentralização, que se traduz na autonomia político--administrativa dos Açores e da Madeira, a descentralização que se traduz na autonomia do poder local e a descentralização que se traduz no princípio, infelizmente neste momento ainda mais programático do que perceptivo, da descentralização da Administração Pública É uma sugestão que lanço. A fórmula «Estado unitário descentralizado» seria a que melhor corresponderia ao conteúdo essencial do artigo.

Divergindo do Sr. Deputado Vital Moreira, queria ainda dizer —e porventura a minha interpretação será considerada surpreendente— que penso que z fórmula proposta pela Aliança Democrática para o n.° 2 do artigo 6.°, embora incorrecta, porventura redundante e enrolada, apesar de tudo, tem dois sentidos importantes, com os quais estou de acordo.

Em primeiro lugar, consagra-se em sede de princípios fundamentais que a autonomia das regiões autónomas consiste em terem órgãos de governo próprio. Isso é particularmente importante. As províncias ultramarinas, por exemplo, antes de 1974 tinham estatutos poü'tico-administrativos, dizia-se que tinham órgãos de governo próprio, mas não eram verdadeiramente órgãos de governo próprio. Salientar que as regiões autónomas têm órgãos de governo próprio pode ter sentido específico neste momento em sede de princípios fundamentais. As regiões autónomas não têm apenas estatutos, como também têm de ter órgãos de governo próprio. Deveria acrescentar-se «[...] órgãos de governo próprio electivos» para fixar a correspondência com o princípio democrático. Não me parece que seja inútil aqui, em sede de princípios fundamentais, falar-se em órgãos de governo próprio. É um aditamento com interesse.

Em segundo lugar, dizer-se no n.° 2 do artigo 6.° «[...] regidos por estatuto político-administrativos [...]», ao contrário do que o Sr. Deputado Vital Moreira me pareceu dizer, tem, a meu ver, também utilidade. Tem a utilidade de salientar que os estatutos das regiões autónomas não têm a natureza de verdadeiras constituições, são estatutos dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas. Não se diz que são as regiões que são regidas por estatutos, são os órgãos de governo próprio que são regidos por estatutos. Quer dizer, a função específica dos estatutos é uma função orgânica, é uma função de disciplina da organização própria das regiões e não é, de forma alguma, uma função material de estabelecimento de uma qualquer constituição que vá para além dos órgãos específicos das regiões.

Quanto ao conceito, que eu próprio sugeri, de «Estado unitário regional», devo dizer que um Estado é regional desde que tenha regiões autónomas. O dizer-se que o Estado é regional não significa que seja todo ele dividido em regiões autónomas; significa apenas que, na perspectiva global do Estado, se tome em conta a existência de regiões autónomas. É isso