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23 DE NOVEMBRO DE 1984

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à conclusão de que uma vez que nelas não foi prevista a indemnização pela desocupação tal indemnização é ilegal.

Por outro lado, estas instruções datam de há quase 30 anos e no decurso desse período a evolução da sociedade portuguesa foi de tal ordem e sofreu tantas modificações, designadamente no mercado habitacional, que se era relativamente simples despejar um funcionário público do prazo de 30 dias de uma casa do Estado por ele ocupada, servindo esse prazo para ele arranjar outra, a situação actual leva a considerar praticamente impossível que a aplicação de um tal regime conduza a soluções de equidade.

Perante este panorama que é real e verdadeiro, bem poderia defender-se, em nossa opinião, a aplicação ao caso vertente da cláusula rebus sic stantibus, através do princípio contido no n.° 1 do artigo 437.° do Código Civil, que dispõe:

Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.

Quer isto dizer que mesmo partindo do princípio, que como vimos não é verdadeiro, de que os contratos celebrados com os funcionários em causa excluíam qualquer indemnização pela desocupação, sempre se poderia defender que as circunstâncias no mercado habitacional se alteraram de tal forma no decurso desses contratos que seria agora de atribuir tais indemnizações, considerando modificados nessa parte os contratos, e por aplicação dos princípios da boa-fé.

4 — Finalmente, existe ainda uma outra perspectiva para encarar o problema.

Verifica-se do processo que a Assembleia da República já de há bastante tempo tem vindo a desenvolver diligências no sentido de procurar obter habitações para os funcionários em causa, de forma que os mesmos desocupem as suas instalações no Palácio de São Bento.

Neste sentido pode citar-se o ofício, digo, nota do Sr. Director-Geral dos Serviços Parlamentares de 25 de Janeiro de 1982, o ofício deste mesmo Ex.™0 Funcionário de 23 de Julho de 1982, o ofício do Ex."00 Se-cretário-Geral desta Assembleia de 18 de Março de 1983, e o ofício da Ex.ma Secretária-Geral de 21 de Novembro de 1983.

Também o Conselho Administrativo, como já se referenciou, deu a indicação em 29 de Março do corrente ano de que se poderiam encetar conversações com os funcionários em causa a fim de lhes ser atribuída indemnização pela desocupação. E finalmente o despacho presidencial de 23 de Maio de 1984.

Tudo isto criou nos funcionários uma legítima expectativa de que a indemnização lhes irá ser atribuída.

Ora, sendo assim, estaríamos perante uma declaração unilateral por parte dos competentes órgãos da Assembleia no sentido de atribuir indemnização pela desocupação das casas em questão, e só essa promessa levaria à preclusão da demonstração da existência do direito à indemnização, por aplicação do princípio contido no artigo 458.° do Código Civil.

5 — Nestes termos, tira-se a seguinte conclusão:

Considerando que as instruções da Repartição do Património da Direcçáo-Geral da Fazenda Pública, publicadas no Diário do Governo, n.° 305, de 31 de Dezembro de 1956, não excluem o pagamento de indemnização aos funcionários despejados de casas do Estado; considerando que os contratos com estes celebrados remetem supletivamente para o regime geral de arrendamento previsto no Código Civil, e considerando, outrossim, o disposto nos artigos 458.°, 437.°, n.° 1, e 1096.° e seguintes deste mesmo Código, é legal a atribuição aos funcionários Jacinto Gonçalves Machado, Raul Santos e Alípio Dantas Oliveira de uma indemnização pela desocupação das casas que habitam no Palácio de São Bento.

E é este o meu parecer, que tenho a honra de levar ao alto critério de V. Ex.a

Lisboa, 28 de Maio de 1984. — O Auditor Jurídico, Costa Pereira.