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27 DE MAIO DE 1985

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Parece-me que houve uma certa deficiência de leitura da parte do Luís Monteiro ao referir os Amigos da Terra como sendo uma associação ambientalista.

De facto, somos uma associação ambientalista e ecologista. Só que procuramos dar um âmbito social e político muito claro à nossa actividade ambientalista. Aliás, ele sabe-o bem, pelo que a sua sugestão de que seríamos uns ambientalistas tout court parece-me fantasiosa. E ele também sabe bem que é fantasiosa, porque há um enfoque político claro e há posições que procuramos sejam o mais transparentes possível na nossa actividade.

Lamento que sobre este painel do ambiente — a que, aliás, foi dado um tempo mais reduzido em relação aos anteriores— as associações políticas partidárias, que foram tão férteis noutros pontos do programa, usando e abusando da oratória, se tenham restringido a meros comentários quase de ocasião.

Pausa.

O Luís Monteiro está ali a protestar, mas eu incluo o seu comentário num comentário quase de ocasião.

Parece-me que, de facto, quando se começa a discutir aqui questões que têm mais a ver com o nosso dia-a-dia, com os jardins lá de fora, com a natureza e com o mundo em que vivemos, já não há algum passado para condenar tout court, já não há um presente para escal-pelizar-se e, quanto a ideias de futuro, parece que é mais importante discutir os problemas imediatos do que discutir os problemas de longo prazo, que são, igualmente, os problemas do nosso presente.

Queria ainda referir um pequeno dado que tinha aqui na algibeira, mas talvez seja melhor deixar isso para a minha próxima intervenção, até porque não sei se ainda há mais pessoas inscritas.

O Sr. Presidente: — Há, sim.

O Orador: — Então eu deixo isto para uma próxima oportunidade.

Aplausos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Conferencista Pedro Passos Coelho, da Juventude Social--Democrata.

O Sr. Passos Coelho (JSD):—Sr. Presidente, vou fazer uma intervenção de circunstância, não obstante as objecções. Não queria ser o ponto de convergência deste debate, como também não queria ser o visionário do óbvio. No entanto, parece-me que há uma coisa que resultou bem — a menos que eu tivesse ouvido mal— das intervenções que ouvi: há um grande consenso à volta deste tema e das ideias e dos valores do ambiente.

O valor do ambiente é já bastante antigo e está associado mais à ideia de natureza do que de naturismo. Não é novidade para ninguém que a industrialização, a criação da cidade moderna e a emergência de novos grupos sociais vieram dar ao valor do ambiente uma conotação de um conteúdo difentes. Hoje em dia já não é apenas a iminência de uma catástrofe nuclear que preocupa as pessoas, já não é só a exploração desenfreada do mundo natural que preocupa as pes-

soas, bem como não é a falta de regulamentação da lei da caça, é a ecologia no seu todo, tanto vegetal, como animal, a poluição, a defesa da natureza.

Há dois valores importantes associados a este valor do ambiente que gostaria de salientar.

O primeiro é o de que não podemos pensar em conceber um modelo de desenvolvimento sem nos alienarmos deste valor do ambiente. O crescimento económico e a vida das pessoas já não estão desligados, nas suas consequências, dos modelos de desenvolvimento por que optarmos. Daí que, na transição para o século xxi, se temos de pensar num modelo de desenvolvimento do homem, teremos também de pensar num modelo de desenvolvimento em função da natureza e do quadro de vida em que o homem se deve mover. Neste aspecto, esta é a ocasião para perguntar por que razão é que se atrasa sistematicamente o plano de ordenamento do território. Por que é que isso não avança, tanto no aspecto legislativo como, por exemplo, no que se refere ao Ministério da Qualidade de Vida, que parece estar cada vez mais dependente dos negócios partidários do que do interesse nacional? É curioso criticarmos os ministros e os secretários de Estado quando há pessoas que podem realizar um bom trabalho ao nível do Governo e quando na prática as leis orgânicas não conseguem ser aprovadas, os orçamentos são canalizados em massa para sectores menos produtivos —nesta concepção moderna do que é um sector produtivo— e quando o valor do ambiente e as necessidades de ordenamento do território e de definição de prioridades de desenvolvimento estão presentes em todos nós.

O segundo valor que, a meu ver, está associado ao ambiente, à qualidade de vida e ao espaço físico em que o homem vive é o valor de solidariedade —há já bastante tempo que a JSD o defende — relativamente às gerações passadas e às futuras.

Em relação às gerações passadas, podemos sintetizar essa solidariedade referindo o caso do património cultural, histórico e natural, bem como outros que fazem parte da nossa vida e que não podemos rejeitar nem desprezar. Ê mau, por exemplo, recordar-me que ainda ontem havia quem dissesse que neste país havia pessoas que nunca tinham visto o mar. De facto, é ridículo que hoje em dia as pessoas tomem contacto com a natureza através de um ecrã. Não sei que valores e, inclusivamente, que suporte moral, que quadro de vida, que horizontes de consciência é que um contacto com a natureza através de um ecrã pode proporcionar a uma pessoa no século xxi.

Penso que a solidariedade em relação ao passado histórico e natural não pode deixar de estar presente na cabeça de todos nós e de uma forma activa. Portanto, quando admitimos que normalmente são estruturas partidárias e movimentos que orbitam mais na área esquerda do leque político português que têm uma maior actividade nesta matéria, sem suspeitarmos de outros interesses menos legítimos de aproveitamento da própria acção, cabe aqui perguntar às restantes forças partidárias, sociais e políticas — que têm legitimidade e consciência — por que razão é que não tomamos uma atitude mais activa em relação a esta matéria.

Eu sou um poluidor por natureza, pois fumo. Assim, poluo-me a mim e aos outros. De qualquer modo, estou na disposição de, à parte desta liberdade que me