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II SÉRIE — NÚMERO 47
Passando a um outro ponto, o da política cambial, têm-se levantado algumas dúvidas sobre se a taxa de câmbio real não se revalorizará em 1986 — digo revalorizará. Levanta-se também a questão da necessidade de uma desvalorização competitiva do estudo face à situação de entrada na Comunidade Económica Europeia e à desprotecção das indústrias nacionais.
É dado, por vezes, como exemplo o caso espanhol e isto não nos parece correcto. Aliás, quanto ao caso espanhol, presentemente o principal objectivo da política cambial espanhola é a manutenção do nível da taxa de câmbio, de modo a evitar inflação importada e a suprimir algumas dificuldades de controle da inflação. Neste ponto, portanto, a Espanha não se está a afastar muito de Portugal quanto à orientação da política cambial.
Quanto aos restantes pontos da política cambial são conhecidas as nossas posições e os primeiros resultados em matéria de inflação parece que não deixam de confirmar o acerto da nossa orientação.
Passando a um terceiro ponto, que é o do orçamento do sector público administrativo, tem-se considerado, por vezes, que este apresenta careacterísticas únicas, dado o aumento de despesas e receitas que inclui. Nem sempre se tem a preocupação de tornar comparáveis os orçamentos de 1985 e de 1986 quando se fazem afirmações deste género, corrigindo, designadamente, receitas e despesas com a CEE, com o Fundo de Abastecimento, IVA e eficiência do sistema, rendimentos de propriedade — refiro-me à conta remunerada do Tesouro, em particular —, ex-FET, recuperação de atrasados, liquidados e não cobrados e juros da dívida pública. Todos estes componentes devem ser tomados em conta quando confrontamos os orçamentos de 1985 e de 1986.
Poderá dizer-se que o financiamento é um aspecto crítico em 1986, como, aliás, o tem sido nos outros anos, colocando-se dúvidas quanto à suficiência dos 14,5% de crescimento do crédito para financiar o investimento no sector produtivo, passando daí a defender--se que o défice do sector público administrativo deveria baixar mais.
Conforme está previsto, dir-se-á que assistiremos simultaneamente a uma política monetária inflacionista e a fenómenos de crowding out. Ora, assegurar mais crédito ao sector produtivo e, simultaneamente, fazer crescer menos a massa monetária são objectivos incompatíveis em grande parte, a menos que o sector público administrativo reduzisse substancialmente as suas necessidades de financiamento. Muito bem: isto é realizável e altamente recomendável; repito, a redução substancial das necessidades de financiamento do sector público administrativo seria altamente recomendável se o Fundo de Abastecimento pudesse gerar, efectivamente, um excedente muito superior ao inicialmente previsto. Mas alguns senhores deputados têm propendido a viabilizar esta hipótese ao fazer uma proposta quanto aos preços dos combustíveis em sentido contrário ao que se está a passar na Comunidade Económica Europeia.
Uma das propostas que, suponho, tem sido ventilada implica que se mantenham aproximadamente constantes os presentes diferenciais para o Fundo de Abastecimento. Isso significa que a revisão da fórmula de fixação de preços à PETROGAL e outras distribuidoras não terá qualquer reflexo no orçamento do Fundo de Abastecimento, sendo, antes, quase inteiramente repercutida para os consumidores e utilizadores. Sig-
nifica também que o excedente do Fundo de Abastecimento para além dos 27 milhões de contos previstos não ultrapassará — é uma primeira estimativa — 15a 20 milhões de contos. Perder-se-á, assim — sublinho este ponto —, a hipótese de implementar uma política monetária mais controlada e de amortizar uma parte da dívida pública, porque, uma vez extinto o Fundo de Abastecimento, a sua dívida passa para a dívida pública.
A ser aprovada tal proposta, as condições de gestão macroeconómica da economia portuguesa alterar-se-iam substancialmente, sobretudo devido a um aumento significativamente superior do consumo. Isso não acarretará, este ano, grandes dificuldades em termos de balança de transacções correntes se se mantiverem as presentes perspectivas, mas criará condições para que em 1987 e nos anos seguintes, onde, seguramente, não continuarão os ganhos de razão de troca deste ano e, antes pelo contrário, é provável que a situação se inverta, surjam défices elevados e, consequentemente, restrições à expansão do investimento. Não podemos esquecer que se em 1987 os termos de troca voltarem a quedar-se próximo do nível de 1985, para manter uma taxa de crescimento do investimento da ordem dos 10% e mesmo com o consumo a crescer só 2,5% em 1987, chegaremos a um défice da ordem dos 1000 milhões de dólares.
Passando a aspectos mais específicos do relatório da Subcomissão, e perdoar-me-ão se o seguir página a página — saltando, embora, muitas delas —, na p. 34 diz-se que há um aumento de receitas correntes de 39,7%. Se excluirmos, todavia, a recuperação de atrasados, as transferências para a Comunidade Económica Europeia, as receitas do ex-FET, os juros activos e as receitas adicionais do IVA, o crescimento das receitas correntes é de apenas 19%. E, como o Governo tem referido várias vezes, o confronto deve ser feito com bases comparáveis. De facto, 1986 não é totalmente comparável com 1985, temos de expurgar algumas das componentes que aparecem nas receitas correntes de 1986 para que a comparação se possa fazer.
Num outro ponto da p. 34 diz-se que o aumento da taxa de fiscalidade passa de 17,7% em 1985 para 18,7% do PIB em 1986. O nosso comentário é o seguinte: se excluirmos a recuperação dos atrasados e as receitas anteriormente pertencentes ao ex-FET aquele indicador passa de 17,7% ou 17,8% para 18,1%, e não para 18,7%. E se, como parece razoável, imputarmos os atrasados a 1985 teremos um decréscimo de 18,3% para 18,1%.
Um outro ponto ainda da p. 34 do relatório diz çue o aumento das despesas correntes é da ordem dos 27,2%. O nosso comentário é o seguinte: se excluirmos a contribuição financeira para a CEE e se excluirmos os juros, o crescimento é apenas de 14%. Aliás, a apreciação da evolução das despesas na p. 80 do relatório contradiz substancialmente a apreciação genérica feita nesta p. 34.
Depois, na p. 40, diz-se que as receitas do sector público administrativo cresceram 40% ou 40,7% e diz--se que as receitas da Segurança Social e as receitas cos fundos autónomos também crescem. O nosso comentário é o seguinte: neste ponto o relatório está novamente ferido da dificuldade em confrontar anos çue não são confrontáveis sem alguns acertos prévios. Por exemplo, quanto à Segurança Social o relatório parece