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8 DE OUTUBRO DE 1986

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seis reclusos. Na circunstância, três guardas prisionais perderam a vida e dois outros ficaram feridos, um deles com gravidade.

Pelo meu Despacho n.° 77/86, de 29 de Julho, formalizando a indicação já verbalmente transmitida ao Sr. Director-Geral dos Serviços Prisionais, determinei a instauração de um inquérito, a efectivar em 30 dias.

Este prazo foi cumprido pela; serviços.

No relatório de íl. 331 a fl. 342 v.°, o Sr. Inquiridor ressalta vários aspectos que entendo útil destacar.

Assim, e desde logo, os reclusos Germano Ramos Raposinho e Vítor Clemente Cavaco haviam conseguido alcançar, mercê do seu comportamento aparente, uma «aceitação por parte da generalidade dos guardas e funcionários» do Estabelecimento Prisional. «Considerados bons mecânicos, [tornavam-se] úteis ao funcionamento das oficinas de mecânica auto, em que inevitavelmente as viaturas particulares dos guardas e funcionários são reparadas». Daí o bom «clima» de que beneficiavam e que se enquadrou numa permissividade de rotina. Um condicionalismo análogo estivera subjacente à evasão em 1983 de quatro perigosos reclusos, precisamente do mesmo Estabelecimento Prisional.

1.2 — Ê de crer, ao que resulta do relatório, que a evasão estivesse a ser preparada já há bastante tempo, designadamente entre o Raposinho e um outro recluso (Tolentino José Carvalho Correia). Com a recaptura, em 17 de Dezembro de 1985, do Vítor Clemente Cavaco, este passou «a participar no plano da fuga, que passaria então a ser realizada pelos três [reclusos], utilizando uma pistola de madeira que estava a ser feita pelo Vítor Clemente Cavaco».

E, efectivamente, essa pistola veio a ser utilizada nesta evasão.

O recluso José Faustino Cavaco foi transferido para o Estabelecimento de Pinheiro da Cruz do Hospital Prisional de São João de Deus. Porque neste estava a planear uma fuga, o José Faustino Cavaco veio a propor a sua inclusão no «grupo» já formado para a preparação da evasão.

Ocorreram então dois factos a que o Sr. Inquiridor atribui justificado relevo.

Passo a transcrever:

1 —O José Faustino Cavaco propõe a vinda de uma arma verdadeira de sua pertença, passando então o «grupo» a delinear a forma como a mesma arma seria introduzida no estabelecimento.

2 — O Germano Ramos Raposinho e o Vítor Clemente Cavaco conseguem que a chefia da guarda sancione a sua pretensão de ficarem os dois a residir na mesma cela, ao arrepio das mais elementares regras de bom senso e segurança, conhecida a amizade forte que os unia e a participação numa fuga conjunta.

Prossegue o Sr. Inquiridor:

Ficando juntos os dois [...] criou-se assim a melhor possibilidade de passarem a dispor de todas as possibilidades de planearem e discutirem pormenores da fuga. Se juntarmos a este facto o à-vontade de movimentos de que os reclusos desfrutavam em Pinheiro da Cruz, sobejamente

documentado ao longo deste processo, e ainda a circunstância de os recreios serem em conjunto, chegando-se a registar aos sábados e domingos a concentração de todos os presos no descampado [...] que genericamente é designado por recreio, fácil é ver o à-vontade existente, que permitiu todos os possíveis e necessários contactos entre os componentes do grupo, sem que tal pudesse causar suspeitas.

Salienta ainda o Sr. Inquiridor a facilidade com que os reclusos se deslocavam às celas uns dos outros.

1.3 — Conseguiu o Germano Raposinho ser afectado a faxina da lavandaria.

Aliás, como se refere no relatório do inquérito, a escolha de faxinas naquele Estabelecimento Prisional não era feita de forma muito regular.

Com efeito, «na generalidade dos estabelecimentos prisionais, a escolha dos faxinas é acto deveras ponderado, como que decisão do conselho técnico, pro-nunciando-se os vários departamentos sobre a conveniência e inconveniência da escolha, que vem a ser publicitada na Ordem de Serviço. No caso vertente, a chefia da guarda de Pinheiro da Cruz pôde, como regra normal de conduta, destinar o Germano Ramos Raposinho ao serviço da lavandaria».

Dava-se, para mais, o caso de na lavandaria existir um clima de total à-vontade, «chegando mesmo os reclusos a escriturar as informações e o expediente diverso, que os guardas se limitavam a assinar».

Tratava-se de um estado de coisas anormal e revelador de desorganização do serviço.

1.4 — Perante isto, a lavandaria passou a ser ponto de reunião normal dos elementos do grupo e a fornecer esconderijo para a arma e munições, bem como pretexto para a total liberdade de movimentação do Raposinho no bloco administrativo e na portaria, «em desrespeito das indicações dadas pelo director».

Com a saída em liberdade do ex-recluso João de Jesus Pinto, que era o que levava toalhas e panos ao bloco administrativo e portaria, passou o Germano Raposinho a desempenhar essa tarefa.

1.5 — Foi então conseguida a introdução de uma pistola (a utilizada na evasão) no Estabelecimento Prisional. A possibilitação desse facto excepcionalmente grave resultou do aliciamento, feito pelo Germano Raposinho, de um outro recluso (Maximiano Nunes Cordeiro).

Como se diz no relatório do inquérito a este propósito:

A arma, que era pertença do José Faustino Cavaco, veio trazida do Algarve pela mulher deste e pela irmã do Germano Ramos Raposinho, fazendo dela entrega ao Maximiano Nunes Cordeiro, bem como de munições, junto à vacaria do Estabelecimento Prisional [...] Acabando por receber 56 000$, o Maximiano Nunes Cordeiro lez entrar a arma no Estabelecimento pela forma com se descreve no auto de fl. 308 a fl. 310. Poderá perguntar-se como é que o pessoal de serviço à portaria não vem a detectar a entrada da arma à portaria. Bastará recordar que, apesar da existência de detectores de metais no Estabelecimento, não havia nenhum desses aparelhos, em versão manual, em uso à portaria para controle dos reclusos que entram e saem do Esta-