2508
II SÉRIE — NÚMERO 62
Espera-se que o alargamento das bases de incidência, designadamente pela redução do campo dos incentivos fiscais, adiante justificada, e, sobretudo, a aceleração da expansão económica, para que contribuirá a existência de um sistema fiscal dotado de coerência e credibilidade, características que de todo faltam no quadro vigente, proporcionem uma perspectiva de estabilidade do nível das receitas.
Não constitui, na verdade, objectivo da reforma da tributação do rendimento o aumento do nível da fiscalidade, medido em termos de relação entre as receitas dos impostos e o produto interno — nível que já atinge expressão considerável em atenção ao grau de desenvolvimento económico do País.
Mas, se outras razões não existissem, designadamente a necessidade de salvaguardar a posição do erário, a própria desproporção existente entre o peso dos impostos indirectos e o dos impostos directos, com a imagem de regressividade do sistema que dela se extrai, desaconselharia a que, no âmbito da reforma, se visasse o decrescimento do nível da fiscalidade directa.
Finalmente, como linha geral de orientação, procuraram--se ainda introduzir progressos sensíveis no sentido da aplicação mais generalizada do princípio da tributação dos rendimentos reais e efectivos.
5 — Adopção imediata da fórmula unitária
Na realização de reformas fiscais em geral, e de reformas de tributação do rendimento em particular, é usual recomendar-se uma orientação gradualista, invocando-se para tal factores como a grande complexidade dos sistemas, os constrangimentos orçamentais, o peso da possível reacção de grupos de contribuintes mais directamente afectados com as modificações previstas.
A proposta de reforma apresentada em Portugal não deixa de atender, em numerosos pontos, àquela preocupação de gradualismo, mas rejeita-se sem hesitação que a mesma deva estender-se à implantação da própria morfologia básica do sistema.
Teria talvez sido lógico que à reforma do início dos anos sessenta, a qual manteve o sistema cedular-misto e inovou sobretudo nos métodos de apuramento do rendimento colectável, se houvesse seguido, o mais tardar na década imediata, a passagem a um estádio intermédio em que o imposto complementar assumisse já a posição de «imposto principal», gravitando no entanto ainda à sua volta os impostos parcelares, como formas de tributação «por conta» e operando por dedução colecta a colecta — porventura compor-tando-se inicialmente como tributações definitivas, mas adiante tornadas passíveis de restituição caso ultrapassassem a quota resultante da incidência globaJ. O sistema cedular--misto passaria, nesta perspectiva, de uma fase com nítido ascendente do elemento cedular para uma outra em que o predomínio da tributação pessoalizante estaria consagrado, faltando, então, dar o último passo pelo apagamento, como categorias fiscais autónomas, dos tributos parcelares.
Não foi esta, porém, a linha de desenvolvimento da nossa estrutura fiscal. Observou-se, ao invés, um retrocesso no sentido da preponderância dos elementos cedulares, marcada pela introdução da progressividade no âmago das próprias cédulas, num arremedo de pessoalização que, pela forma descoordenada como foi executado, levou inclusivamente à anomalia de inverter a discriminação qualitativa dos rendimentos, concebida na origem na óptica de protecção da fonte trabalho. E, enquanto os impostos cedulares eram desgarra-
damente promovidos a factores centrais de tributação, o imposto complementar afundava-se na zona das categorias mais débeis da tabela das receitas fiscais.
A involuçáo para o protótipo cedular, a circunstância de Portugal, em plena fase de integração nas Comunidades Europeias, ser o único país da OCDE a manter a «compartimentação» como característica dominante do seu esquema de tributação do rendimento, as possibilidades que a difusão das modernas tecnologias veio proporcionar em termos de tratamento informático das operações e de administração de um sistema mais exigentes aconselham a que se proceda sem mais delongas à instituição do sistema de tributação global, o qual é, aliás, o consagrado na Constituição de 1976.
Salta-se, assim, sobre o estádio intermédio do sistema misto com simples reforço da tributação pessoalizante e manutenção dos impostos parcelares «por conta» do principal, assumindo-se frontalmente a tributação unitária do rendimento.
O sistema unificado permite obviar a uma das injustiças mais gritantes a que conduz a fórmula dualista até aqui vigente em Portugal: a concentração nas camadas superiores de estrutura dos rendimentos (as atingidas pelo imposto complementar) de deduções pessoais, que só fazem verdadeiramente sentido quando referidas ao rendimento global, e da própria dedução especificamente destinada a assegurar o tratamento diferencial dos rendimentos do trabalho.
6 — Concepção de rendimento perfilhada
Na construção do conceito de rendimento tributável contrapõe-se a concepção da fonte que leva a tributar o fluxo regular de rendimentos ligados às categorias tradicionais da distribuição funcional (rendimento-produto) à concepção do acréscimo patrimonial que alarga a base da incidência a todo o aumento do poder aquisitivo, incluindo nela as mais-valias e, de um modo geral, as receitas irregulares e ganhos fortuitos (rendimento-acréscimo).
Em termos práticos, a principal diferença entre as duas concepções reside precisamente no tratamento fiscal das mais-valias, que, não sendo ganhos decorrentes da participação na actividade produtiva, são pela primeira excluídas da incidência do imposto.
A luz dos modernos princípios fiscais, e em particular do princípio da capacidade contributiva, a óptica do acréscimo patrimonial, que conduz a uma definição compreensiva do rendimento tributável, mostra-se superior à visão mais restritiva baseada na fonte do rendimento. E, embora o conceito extensivo de rendimento não seja uma componente essencial do modelo unitário, o certo é que este apela para uma concepção de rendimento tão ampla quanto possível.
Razões de justiça recomendam, aliás, a tributação das mais-valias, que constituem acréscimos de poder aquisitivo obtidos sem esforço ou pelo acaso da sorte, e que, aliás, tendem a concentrar-se nos escalões elevados de rendimento.
Acolheu-se, assim, com maior nitidez do que na anterior reforma (na qual as mais-valias, objecto de uma categoria fiscal específica, eram excluídas do âmbito da incidência do imposto complementar), uma concepção tendencialmente ampla de rendimento, incluindo, à semelhança do que sucede na maioria dos países da CEE, os aumentos inesperados no valor dos bens do quadro das categorias de rendimentos abrangidas pelo imposto único.
Ainda que tenham sido atentamente examinadas propostas teóricas recentes no sentido de substituiros impostos sobre o