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II SÉRIE — NÚMERO 72

Poderá depreender-se que o pensamento governamental em matéria de liberalização confunde a liberdade da comunicação social com o seu estatuto de propriedade. Ora nem a experiência nem as condições sociais portuguesas permitem concluir que uma total privatização dos meios da comunicação social conduza a uma efectiva liberdade destes, a um melhor desempenho de serviço público.

O teor do Programa do Governo não contribui, na sua globalidade, para minorar estas preocupações. Não só pelo que nele se afirma, mas também pelo que se omite. Em mais de 600 palavras dedicadas à comunicação social, o Governo acena com determinadas metas, mas evita pronunciar-se sobre os processos a que tenciona recorrer para atingi-las. Não podemos deixar de manifestar a nossa preocupação quanto à falta de esclarecimento sobre a forma como o Governo pretende percorrer as etapas intermédias para concretizar os seus objectivos.

3 — Outro princípio a que o Governo alude é o da «formação profissional», mas, nesse aspecto, limita-se a referir o Centro Protocolar de Formação Profissional de Jornalistas (CENJOR). Não deixa de ser estranho que, num país onde existem duas licenciaturas em Comunicação Social (Universidade Nova e Universidade Técnica) e um bacharelato em Jornalismo (Escola Superior de Jornalismo, do Porto), além do diploma conferido pela Universidade Católica de Lisboa (curso de Ciências da Informação), o Governo se limite a referir um centro de formação, ainda embrionário, cujos méritos ou deméritos não podemos, obviamente, avaliar. Podemos e devemos sublinhar — isso sim — que a situação profissional dos jornalistas não pode ser equacionada apenas em termos de cursos técnicos de formação profissional, antes pressupõe uma autêntica preparação no campo das ciências sociais e humanas. É outra omissão que que se regista, tanto mais que o Governo salienta que «prosseguirá uma política de apoio a todas as acções autênticas da formação profissional».

O CCS estará atento, no âmbito das suas atribuições e competências, a acções que objectivamente possam conduzir à instituição de formas de condicionamento ideológico dos meios de comunicação social e do jornalismo.

4 — Admite o Governo, no seu Programa, a manutenção do serviço público. Que, afirma-se naquele documento, deve, primeiro, restringir-se aos meios televisão e rádio, segundo, reduzir-se ao que é definido como mínimo. Importará considerar o que deve ser o serviço público em termos de comunicação social e o que se pode entender como mínimo.

Espaço de qualidade de informação, de isenção, de defesa e divulgação de valores culturais, nomeadamente de cultura portuguesa, espaço de resposta aos direitos dos vários sectores da sociedade, designadamente das minorias, actividade de cobertura de zonas geográficas menos favorecidas, o serviço público justifica-se — como, aliás, o admite o Governo no seu Programa.

O direito a informação é um direito democrático fundamental, aliás, consagrado na Constituição. A sua defesa é uma obrigação do Estado, o qual deve assegurar, directa ou indirectamente, as condições do exercício desse direito, em termos de verdadeiro serviço público.

Esta necessidade é acrescida — no paralelo com outras sociedades europeias, por exemplo, da Europa

comunitária, invocadas pelos partidários da tese da desestatização — pelas características específicas portuguesas. Por um lado, em termos de escassez do mercado de leitores e da ainda incompleta cobertura nacional por parte dos meios de comunicação social na sua generalidade (cobertura essa com lacunas que coincidem, em parte, com as zonas mais desfavorecidas e menos interessantes para a lógica empresarial privada); por outro lado, com a relativamente reduzida expressão do mesmo sector privado.

Destas circunstâncias parece resultar a inevitabilidade da manutenção de um sector público de comunicação social, com os objectivos referidos, quanto a qualidade, exemplaridade e missões prioritárias.

Deste modo, constitui motivo de apreensão a referência a um serviço público definido como mínimo. Se, por mínimo, se entende bastante, e no que se refere às características e missões que referimos, aceita-se a expressão, considerando-a, embora, no mínimo, ambígua. Se por um mínimo se entende uma redução do papel atrás sumariamente caracterizado, põe-se a solução em causa.

Pela nossa parte, importa definir, consensualmente

— através da participação do Governo, das forças políticas, culturais, sociais, etc, nomeadamente as representadas na Assembleia da República, órgãos de Estado diversos, como o Conselho de Imprensa e o Conselho de Comunicação Social, etc, além de instituições como a universidade, órgãos representativos dos profissionais da comunicação social, associações patronais, etc. —, o que se entende por sector público de comunicação social e qual a sua expressão bastante, e capaz, em termos de necessidades efectivas da sociedade portuguesa. Só dessa análise e dessa definição poderá sair a configuração do sector público.

5 — Cabe aqui uma breve, mas clara, palavra de consideração pelo papel histórico, no plano cultural e político, desenvolvido pelo sector público de comunicação social, pelos seus profissionais, jornalistas, trabalhadores em geral. Apesar de todas as limitações

— muitas delas externas ao sector e negativamente condicionantes da sua actuação —, apesar de alguns excessos ou de algumas insuficiências, este sector público (nomeadamente, a imprensa escrita, que, segundo este Programa, se pretende alienar) contribuiu, e continua a contribuir, de uma forma, em muitos aspectos, insubstituível, para o desenvolvimento cultural e cívico da nossa sociedade e para a sua estabilidade democrática. Muito haverá, deste modo, a esperar da sua modernização.

6 — Em consequência do que atrás fica dito, colocamos ao Governo e à consideração de todos quantos estão empenhados numa informação mais eficaz e, de facto, mais moderna, as seguintes questões:

a) Que entende o Governo, em termos práticos, por serviço público mínimo?

b) Está o Governo disposto a dialogar, a propósito da concretização do seu Programa, com órgãos de Estado, como o Conselho de Comunicação Social e o Conselho de Imprensa, e com organismos representativos do sector, como o Sindicato dos Jornalistas, a Associação da Imprensa Diária, a Associação da Imprensa não Diária, etc?