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17 DE FEVEREIRO DE 1993

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acumulada, porque senão decretava, de todo em todo, a incompatibilidade.

Donde se conclui que o que preocupa o legislador é a possível corrupção do actor público, ou melhor, é a consideração de que nos casos que envolvem corrupção, o nível de prejuízos para o interesse público pode atingir limites inaceitáveis que importa evitar.

Mas sendo assim, a questão da moralização da classe parlamentar não (em uma lógica totalmente igual à de outros agentes políticos, como os executivos políticos, membros do Governo e membros de câmaras, mas em que a sua capacidade de decisão por si próprios leva o legislador a ter preocupações mais exigentes e, portanto, a criar incompatibilidades totais, mesmo que, em parte, não garantam totalmente os objectivos.

2 — Entidades abrangíveis

O que se deixa dito leva-nos a distinguir duas categorias de agentes públicos:

a) Por um lado, aqueles que têm capacidade de decisão na máquina administrativa ou no aparelho produtivo de bens do Estado, como os membros do Governo, os altos cargos da Administração Pública a nível nacional, regional e local, e os gestores de empresas do Estado;

b) Por outro, aqueles que não podem decidir nada na gestão concreta do País, mas que, actuando na área do poder político, se relacionam com os seus detentores, cuja actuação, mesmo que de modos diferentes, fiscalizam, ou seja, entidades que podem dispensar apoios ou críticas aos executivos políücos: desde logo os titulares dos parlamentos, como os deputados europeus, nacionais, municipais, e os profissionais do que justamente se tem vindo a designar «o quarto poder», os responsáveis da imprensa e os jornalistas políticos, formalmente acreditados ou não, junto dos órgãos do poder.

Nos primeiros casos, a incompatibilidade tem de ser a regra. Mas o interesse geral ou certos direitos individuais legalmente protegidos podem ficar prejudicados por favores pagos com benesses financeiras. Daí que para todos eles se justifique a declaração de património, de rendimentos e de interesses.

No segundo caso, sem dúvida que a legislação referida deve aplicar-se aos representantes do povo a todos os níveis de actuação e também aos responsáveis da imprensa, mesmo privada, administradores, directores, jornalistas de temas políticos, dado que também esta pode promover ou destruir os políticos com capacidade de decisão sobre assuntos públicos em troca de benesses de variada ordem, desde atribuições financeiras, assessorias ocultas, promoções por jogos de influências, etc.

3 — Publicidade das declarações

A questão da confidencialidade ou da publicidade do conteúdo das declarações constitui o aspecto mais polémico deste debate.

Por toda a parte, a questão da institucionalização das declarações vai vencendo as resistências dos sectores

receosos das consequências desta transparência (sobretudo quando ela não é enquadrada de modo ineficaz), para calar a opinião pública, às vezes excessivamente sensibilizada por este repto.

Certos sectores habituados a dados comportamentos ou influenciados por uma cultura política em que o respeito da privacidade do indivíduo continua a encontrar argumentos mesmo em relação a figuras públicas, sentem-se, com ou sem razão, atacados ou desnudados.

Por isso, o reduto em que a batalha ainda pode ser relativamente ganha, cedendo na aparência, mas continuando no fundo a vencer a resistência, é o da confidencialidade.

A solução portuguesa tem origem num projecto da ASDI e foi fruto, em concreto, de um acordo pacífico entre o PSD, o PS e o CDS, na sessão legislativa de 1982-1983 e fim da n Legislatura, o qual propiciou num texto avançado, pois abrange o património, os rendimentos e os interesses, cria sanções jurídicas e permite a publicidade.

O autor deste relatório participou nesse acordo em representação do bloco parlamentar da AD, com a consciência declarada de que se tratava de um texto experimental, em face do vazio total e da impreparação generalizada para a institucionalização destas declarações. Mas a insuficiência que então apontou prendia-se sobretudo com o âmbito das entidades abrangidas, tendo-se atrevido a avançar apenas com uma proposta para incluir os titulares de cargos de gestão em empresas públicas.

Estava longe de imaginar, tendo presente outras experiências estrangeiras, que esta lei viesse a ser acusada de inoperante, por falta de publicidade do conteúdo das declarações, quando, na verdade, o legislador consagrou mecanismos com virtualidades para permitir o seu conhecimento, por livre iniciativa do Tribunal Constitucional, segundo regras a consagrar no seu regimento interno, ou por iniciativa e no interesse concreto de qualquer cidadão.

Com o passar dos tempos, não parece que haja novos argumentos a acrescentar aos que tradicionalmente têm sido objecto de acalorados debates nos vários países.

A favor da confidencialidade podemos invocar:

a) O direito à vida privada, que também se deve aplicar, na medida do possível, aos homens políticos;

ti) A ineficácia prática da existência de registos públicos;

c) O facto de a publicidade propiciar o antiparlamen-tarismo latente ainda na opinião pública portuguesa, com o consequente descrédito da classe política perante aquela;

d) O princípio da confidencialidade não é absoluto, permitindo a comunicação, quando justificada;

A favor da publicidade podemos invocar:

a) Quem aceita uma função pública sabe que isso implica uma certa e necessária limitação ao direito à vida privada, aliás frequentemente posto em causa noutras vertentes do dia-a-dia dos políticos;

b) O interesse público (traduzido quer na transparência e moralização da vida dos políticos e outros homens com funções públicas quer no direito à informação dos cidadãos num regime a quem cabe escolher os homens que os dirigem ou de quem dependem os seus administradores, quer o necessário controlo público das instituições demo-