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25 DE FEVEREIRO DE 1994

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A Convenção introduz a possibilidade de dissociar o Estado em que alguém é condenado de outro em que a pena pode ser aplicada nos casos em que esta não seja uma pena privativa da liberdade. Orienta-a o propósito de fomentar a aplicação dos meios sancionatórios substitutivos da clássica pena de prisão num país diferente daquele em que ocorreu a condenação, sempre que isto se afigure mais idóneo para conseguir a sua reinserção social.

A matéria sobre que a Convenção versa é, pois, subsidiária da execução de sentenças estrangeiras e subjaz--lhe a preocupação de incrementar a cooperação judiciária internacional em matéria penal. No seu horizonte está igualmente o propósito de contribuir para a maior harmonia legislativa possível entre os Estados signatários neste domínio.

Sublinha-se ainda que o domínio de aplicação pessoal da Convenção se circunscreve aos delinquentes estrangeiros que tenham sido destinatários de medidas não privativas da liberdade (como é o caso da liberdade condicional, da prisão por dias livres oü do regime de prova). Isto significa que estão excluídas do seu âmbito as reacções criminais que antecedem a audiência (como é o caso da possibilidade de suspensão do processo, que o artigo 281.° do Código de Processo Penal Português prevê em certas circunstâncias).

2 — Os princípios que informam a Convenção correspondem aos do projecto de acordo tipo relativo à transferência da vigilância de pessoas condenadas ou em liberdade condicional, aprovado pelo Conselho Económico e Social em 25 de Maio de 1986, na sequência das conclusões e recomendações do 7.° Congresso das Nações Unidas.

E são:

a) Princípio da soberania nacional ou da não sobreposição de Estados no processo de execução das medidas (artigo 6.°) — significa que a competência do Estado do julgamento termina a partir do momento em que o Estado da administração da pena aceita a transferência da vigilância. Na prática, ele traduz-se na atribuição ao Estado-administração da total responsabilidade pela execução da sentença, sem sofrer ingerência do Estado que julgar;

b) Princípio da «dupla criminalidade» (artigo 4.°) — para que a transferência tenha lugar é necessário que as leis de ambos os Estados (do julgamento e da administração da medida de vigilância) considerem o comportamento como crime. Isto obriga a uma permanente atenção aos casos de discriminalização de comportamentos, que cada vez mais frequentemente ocorreu por processos legislativos de transmutação de crimes em contra--ordenações (ilícitos de mera ordenação social);

c) Princípio do respeito pelos direitos da vítima — significa que estes não poderão ser prejudicados pela transferência. No entanto, a densificação do princípio não é feita pela Convenção, a qual deixa em aberto a determinação das prerrogativas da vítima face ao acordo de transferência;

d) Princípio non bis in idem — preclude a hipótese de haver dois julgamento (neste caso, em Estados diferentes) pelo mesmo comportamento criminoso;

e) Princípio da adaptação (artigo 11.°) — impõe uma harmonização entre as legislações pelo Estado da administração, de modo que a execução não redunde em agravamento da sanção aplicável.

3 — O objectivo de reinserção social que a Convenção acolhe (concretizado nela através da possibilidade de o

delinquente cumprir a sanção penal num meio social mais favorável à sua recuperação) segue na esteira de outros desincentivos legais às consequências de uma concepção retributiva do direito penal, que, aliás, as modernas leis nacionais vêm também rejeitando.

De facto, o pensamento criminal combate cada vez mais o princípio da retribuição, que fora uma das teses fundamentais da escola clássica de direito penal (sempre combatida, como se sabe, pelos positivistas). E é esta perspectiva que, atendendo à personalidade do delinquente e à natureza e gravidade do seu comportamento criminoso, permite fazer a primeira e consequente individualização da pena.

Numa primeira fase, a individualização da pena foi aplicada e desenvolvida sobretudo durante a fase penitenciária. Tratava-se de identificar o regime mais adequado para que, sem liberdade, fosse o delinquente induzido a retomar, sem reincidência, à vida em sociedade.

Mas são possíveis e disseminam-se progressivamente outras formas de individualização: sejam as usáveis pelo juiz no momento de aplicação da sentença, sejam as incorporadas na lei, medidas não prisionais aplicáveis a certos tipos de delinquentes.

4—A primeira declaração que o Estado Português formula justifica-se pela posição que o direito processual penal português tomou em relação à revelia De facto, a nossa lei penal adjectiva apenas admite a não comparência do arguido na audiência em situações muito restritas (cf. os artigos 332.° e 334.° do Código de Processo Penal), na sequência de uma vasta e profunda reflexão doutrinária (cf., por todos, Figueiredo Dias, La Protection des Droits de VHomme dans la Procédure Pénale Portuguaise, relatório apresentado ao colóquio preparatório do XII Congresso Internacional de Direito Penal, em Hamburgo, de 1979, in Boletim do Ministério dá Justiça, 1980, n.° 291.°, p. 180).

Conclusões

1 — Os princípios que inspiram a Convenção para Vigilância de Pessoas Condenadas ou Libertadas Condicionalmente compatibilizam-se com a filosofia sancionatória penal que a ordem jurídica portuguesa acolhe, máxime, as preocupações de adequação da pena aplicável aos objectivos de reinserção social dos delinquentes. E enquadram-se no esforço de harmonização das grandes linhas que orientam a legislação penal dos países membros do Conselho da Europa.

2 — Portugal apresenta uma declaração que se traduz na exclusão da vigilância, execução ou aplicação integral de condenação proferida à revelia. Explica-a a orientação do direito penal adjectivo português nesta matéria, restritivo da aplicação de decisões processuais penais a pessoas ausentes.

Parecer

Estão reunidas todas as condições legais e regimentais para que a proposta de resolução n.° 47/VI suba a Plenário e a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias recomenda a sua aprovação.

Palácio de São Bento, 23 de Fevereiro de 1994. — A Relatora, Maria Margarida C. Silva Pereira. — O Presidente da Comissão, Guilherme Silva.

Nota. — O relatório e parecer foi aprovado por unanimidade (PSD. PS e PCP)

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