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II SÉRIE-A — NÚMERO 51

5° Neste sentido-, orienta a execução da pena de modo a fornecer ao condenado modelos de comportamentos alternativos ao crime, descomprometidos de fundamentação ética, ou seja, independente da sua aculturação.

II

0 novo regime das penas e das medidas de segurança

A) Introdução

Dos principios-áncoras do sistema penal referenciados no capítulo anterior (culpa, proporcionalidade, vinculação à defesa de bens jurídicos e reintegração social) arrancam as alterações vertidas na reforma sobre a determinação judicial das penas e das medidas de segurança e sobre os pressupostos e os critérios da sua aplicação. Estas alterações obedecem às linhas mestras do modelo penal vertido na Constituição, e que subordina as sanções à legalidade, pessoalidade, igualdade, proporcionalidade, certeza, e determinação; mantêm a destrinça entre penas principais e acessórias, oriunda do Código de 1982; e procuram não desvirtuar a filosofia tolerante sobre a definição dos seus limites máximos, tradicional, no direito português (').

Et) Penas principais 1 — Alterações ao regime da pena dc prisão

Ela continua a ser'a linha dorsal do sistema sancionatório, dando-se por ceno queé insubstituível como resposta à criminalidade mais grave. E de igual modo, opta-se pela permanência da prisão de pequena duração para aqueles outros crimes médios òu de pequena gravidade em que, não produzindo a prisão um óbvio efeito dessocializador sobre o delinquente, exerça um «choque» benéfico ou tenha uma vantajosa eficácia intimídatória.

Os limites mínimo e máximo da prisão são, respectivamente, um mês e 25 anos. A reforma vem estabilizar o limite máximo de 25 anos, já possível no Código de 1982. Assim, enquanto até agora a sua entrada em cena acontecia no genocídio e discriminação racial (artigo 189.*, caso em que o limite máximo de 25 anos integrava a moldura penal), nos crimes de guerra contra civis, feridos, doentes e prisioneiros de guerra (n.° 2 do artigo 190.°, que o permitia por via do mecanismo de agravação da pena) no terrorismo (artigo 289.°, também por agravação) e era ainda possibilitado pelo regime da pena relativamente indeterminada (n.° 2 do artigo 83.°), a reforma aplica-a como limite máximo também da moldura do homicídio qualificado.

Este horizonte mais alargado dos 25 anos de prisão tem repercussões sobre as regras da parte geral que se referem

(') Escreve a este respeito, de modo lapidar, José António Veloso: «O Direito português tem uma tradição de leniência que remonta ao Antigo Regime e o singulariza notavelmente no contexto dos ordenamentos do continente europeu. N3o foram em geral utilizados entre nós os suplícios mais cruéis a que a partir do século xvi se recorreu abundantemente noutros países, mau grado a frequente aplicação — mas essa ainda na menos cruel das formas históricas — da morte pelo fogo, rios crimes contra a religião. Da benigna cultura penal a que se chegara já no período das Ordenações nada testemunha melhor que o assombro com que se gravaram na memória colectiva as terríficas execuções da época pombalina, cujo modelo o despótico ministro teve de ir buscar, por trafica ironia, às admiradas nações civis.» Cf. «Pena criminal» {Enciclopédia Polis. vol. ih, p. 1110.)

à punição do concurso. Assim, nos termos do n.° 2 do artigo 77.°, a pena aplicável a tais casos possuirá como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, podendo atingir os 25 anos.

Não é também impunemente que o tipo de homicídio qualificado tenha sido aquele que sofreu um aumento para 25 anos no seu limite máximo. É o mais grave dos crimes contra as pessoas, e a proporcionalidade entre crimes e penas compatível com um Estado constitucional que se ergue sobre o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1.° da Constituição da República Portuguesa) passa pela opção de fazer dele um paradigma de que nenhum outro o ultrapasse em desvalor.

O aspecto mais saliente da proposta é o reforço do carácter de ultima ratio cometido à pena de prisão, e que se espelha em várias alterações ao regime vigente.

Assim, nos casos de gravidade menor (prisão até 3 meses) define-se a possibilidade de aplicar novas penas de substituição: para além de conversão da prisão em multa, surgem outras penas não privativas de liberdade, e, no limite, de formas descontínuas de prisão: prisão por dias livres ou semidetenção. Nos casos de prisão até 6 meses consagra-se a possibilidade da sua substituição por multa ou por outras penas não privativas da liberdade.

A prisão por dias livres, provinda do Código de 1982, aparece agora temporalizada de forma a permitir o cumprimento integral da pena curta de prisão aplicada (subiu-se o número de períodos de 15 para 18, c fez-se corresponder a cada período 5 dias de prisão contínua, de modo a perfazer os 90 dias correspondentes ao limite máximo possível).

O carácter de última instância punitiva cometido à pena de prisão até 6 meses influencia, por coerência, os pressupostos da reincidência (artigo 75.°), que passa a depender da comissão de novo crime doloso punido com prisão efectiva superior àquele período, após ter havido lugar a condenação com trânsito em julgado por pena de prisão efectiva também superior a 6 meses. Entende a reforma que a gravidade da reincidência não justifica a aplicação do seu regime àquelas situações em que a multicriminalidade mereça, por razões de prevenção, sanções menos duras. Do mesmo modo, a pena relativamente indeterminada (que a lei aplica a delinquência especialmente perigosa — artigo 83.°) pressupõe a prática pluricriminal de comportamentos a que deverá corresponder prisão efectiva, deixando assim expressamente de fora os casos de suspensão da pena (artigo 50°) ou de aplicação de penas de substituição.

O critério de aplicação de penas substitutivas é claro: o juiz recorrerá a elas obrigatoriamente, a menos que logre demonstrar na sentença que a substituição não satisfaz as exigências de prevenção (:).

Z — A pena dc multa

Reforçada na proposta, a multa faz justiça ao modo como o Projecto Alternativo alemão de 1968. e com ele todo o pensamento da prevenção penal, que hoje se inscreve em significativa legislação europeia, a concebem: uma autêntica arma de arremesso conira as penas privativas da liberdade de curta duração

0) Neste sentido. J. Figueiredo Dias. Actus da Comissão Revisora. p. 19. E é o regime consagrado no artigo 44.°

(•') Na liderança desse objectivo, encontramos, já no final do século passado. Franz Von Liszt na Alemanha e Bonneville de Marsangy em França.