0066 | II Série A - Número 003 | 28 de Setembro de 2000
Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores de 11 de Outubro de 1933 - à nova realidade das instituições internacionais surgidas no pós Guerra.
O Protocolo em apreço, sendo de natureza meramente formal, está associado a um fenómeno da maior relevância para a actual conjuntura internacional.
Neste sentido, entendemos aprofundar ligeiramente a temática do tráfico de Mulheres e Crianças, porque julgamos fundamental o debate, na sociedade portuguesa, de questões que, infelizmente, são frequentemente remetidas para o lumpen da agenda política nacional.
2) do Tráfico de Mulheres e Crianças
O final da guerra fria e o acentuar dos fenómenos da interdependência e da globalização têm produzido alterações contraditórias no seio do sistema internacional.
Processos antitéticos como a integração económica e a fragmentação política; a expansão dos ideais da paz e da democracia e o aumento dos conflitos localizados em diversas áreas do mundo; a prosperidade económica do Norte e a pobreza crescente do Sul; o aumento dos meios de comunicação social e de informação, como a Internet, e, o ainda reduzido acesso aos mesmos, têm produzido consequências gravosas para a definição de uma Nova Ordem Mundial, mais justa e equilibrada.
Alguns daqueles processos e suas consequências são causa directa dos fenómenos que hoje aqui nos prendem: tráfico e exploração de mulheres e crianças.
2.2) das definições
A compreensão desta temática obriga a uma aclaração de conceitos. Importa, então, tentar definir aquilo que entendemos por tráfico de seres humanos. De acordo com um relatório apresentado à Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (Cfr. Parliamentary Assembly of the Council of Europe, "Report on Traffic in women and forced prostitution in Council of Europe member states" (Rapporteur: Mrs. Wohlwend, Liechtenstein, Group of the European People's Party), Doc. 7785, 26 March 1977, pp.5-7).têm sido apresentadas, por vários organismos, diversas definições.
Um perito do Conselho da Europa afirma que existe tráfico de mulheres quando uma mulher é explorada, por e para beneficio financeiro de outra pessoa, num país que não o seu, consistindo o tráfico na organização da estadia ou da emigração, legal ou ilegal, de uma mulher, mesmo com o seu consentimento, do seu país para outro, levando-a, seja através de que meios for, a prostituir-se ou a enveredar por qualquer forma de exploração sexual (Id., ibid. - tradução livre).
Por seu lado, a Organização Internacional para as Migrações explica que o tráfico ocorre quando: a) um/a migrante é ilegalmente envolvido (recrutado, raptado, vendido, etc.) e deslocado, tanto dentro das suas fronteiras nacionais como para fora delas; b) intermediários (traficantes) obtêm lucros, económicos ou outros, por meio de fraude, coacção e outras formas de exploração que violam os direitos fundamentais dos migrantes (Cfr. Http://www.iom.int (tradução livre). Para uma definição mais pormenorizada apresentada pela OIM - Cfr. Parliamentary Assembly of the Council of Europe, "Report on Traffic in women and forced prostitution in Council of Europe member states" (Rapporteur: Mrs. Wohlwend, Liechtenstein, Group of the European People's Party), Doc. 7785, 26 March 1977, p.6).
Outra definição possível é ainda aquela que explica que o tráfico de mulheres significa todo o transporte legal ou ilegal de mulheres ou o seu comércio, com ou sem consentimento inicial, para fins económicos, com o objectivo subsequente de prostituição forçada, casamento forçado ou outras formas impostas de exploração sexual (idem, p.7. - tradução livre).
Por último, e segundo Maria Eduarda Azevedo, "Na sua essência, o tráfico de mulheres constitui uma das modalidades e corresponde a uma manifestação do tráfico de seres humanos, em si o mais aviltante desrespeito dos direitos fundamentais, cuja consagração jurídico-formal e garantia de exercício efectivo devem constituir os eixos nucleares da acção política em qualquer Estado de Direito Democrático" (Actas Provisórias da Conferência sobre "Prostituição e Tráfico de Mulheres", Sala do Senado, 18 de Março de 1997, p. 7).
Neste ponto é fundamental abordar, também, a temática do tráfico de crianças. A primeira ideia que interessa reforçar é que o tráfico de crianças é, igualmente, uma clara violação dos seus direitos, expressos em vários instrumentos internacionais como a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.
O tráfico de crianças serve uma série de "mercados" entre os quais: a venda para adopção em países industrializados; o tráfico de órgãos; e o comércio e a exploração sexual que está em franco crescimento, uma vez que a progressão de doenças infecto-contagiosas, como a SIDA, têm contribuído para uma acentuada procura de prostitutas cada vez mais novas (Cfr. IOM, "Trafficking in Children: Exploitation Across Borders", in "Trafficking in Migrants", Quarterly Bulletin, N.º 10 - March, 1996, p.1).
2.3) da situação internacional actual
O tráfico de mulheres e crianças é na actualidade um fenómeno em franco crescimento. De acordo com um Working Paper (Cfr. European Parliament, Working Paper, "Trafficking in Women", Civil Liberties Series, Libe 109 EN, March 2000, 1-79) apresentado pelo Parlamento Europeu, em Março deste ano, as causas do tráfico de mulheres oriundo da Europa Central e Oriental (Apesar deste Working Paper se debruçar sobre esta problemática no campo estritamente europeu, convém referir que as causas nele apresentadas foram referidas na maioria dos estudos e documentos a que tivemos acesso) prendem-se principalmente com:
- A feminização da pobreza, estimando-se que o número de mulheres a viverem abaixo do limiar da pobreza seja de 1,3 biliões (Este número é avançado pela Deputada Odete Santos. Cfr. Diário da Assembleia da República, I Série - Número 23, VIII Legislatura, 1.ª Sessão Legislativa (1999-2000), sexta-feira, 7 de Janeiro de 2000);
- Os avultados lucros provenientes desta actividade que se prevêem ser de US7 Biliões anualmente (Lucros provenientes do tráfico de mulheres para exploração sexual) e com tendência para crescer;
- A proximidade entre países;
- O relaxamento na necessidade de vistos, principalmente na Europa;
- Aparência física semelhante, principalmente, entre mulheres europeias do ocidente e oriente, diminuindo a suspeita de imigração ilegal;
- Legislação permissiva, ou seja/a moldura penal deste tipo de crimes varia de país para país e por outro lado é menos gravosa do que aquela que recai, por exemplo, sobre o tráfico de estupefacientes;
Convém destacar que a razão principal de todo este fenómeno é a pobreza e a feminização da mesma. O subdesenvolvimento patológico dos países do grupo ACP; a transição