0008 | II Série A - Número 098S | 29 de Maio de 2003
PROPOSTA DE LEI N.º 66/IX
APROVA A NOVA LEI DA TELEVISÃO
Exposição de motivos
A presente proposta de lei da televisão vem dar corpo legislativo aos princípios enunciados nas "Novas Opções do Audiovisual" aprovadas em Dezembro do ano passado.
O regime proposto, mantendo globalmente alguns princípios já consagrados no actual ordenamento jurídico, designadamente em matéria de direitos de antena, de resposta, de réplica política e de rectificação, vem introduzir uma profunda alteração nomeadamente no tocante ao serviço público de televisão, às obrigações dos respectivos operadores e ao modelo da concessão.
Por outro lado, alarga-se o seu âmbito de aplicação à mera retransmissão de serviços de programas, nos casos em que tal retransmissão ponha em causa gravemente interesses fundamentais tutelados pelo presente regime jurídico; reforça-se a tutela da concorrência e da transparência; procede-se a um reforço acentuado da regulação de conteúdos tendo em vista a protecção de públicos particularmente vulneráveis.
Saliente-se ainda o estabelecimento de obrigações gerais que recaem sobre todos os operadores de televisão, bem como a instituição de um princípio de cooperação entre o Estado, os operadores privados e os operadores públicos, tendo em vista a prossecução de fins que devem ser comuns a todos nesta matéria.
Assim, e no tocante às principais alterações citadas, cumpre salientar o reforço das regras de defesa da concorrência no âmbito da actividade televisiva, estabelecendo-se, designadamente, que os acesso às redes de distribuição deve processar-se com respeito pelos princípios da igualdade, da transparência e da não discriminação, nomeadamente quanto a acesso e condições de remuneração, sem prejuízo de outras que se venham a revelar necessárias, que serão aprovadas mediante legislação específica.
Por outro lado, e sem prejuízo de se manter uma reserva de espaço de distribuição para os serviços de programas existentes, no âmbito da atribuição de licenças para a emissão digital terrestre, prevê-se legislação complementar em matéria de obrigações de transporte de serviços de programas.
Estabelece-se ainda que, em matéria de transparência da propriedade, passa a ser aplicável aos operadores televisivos o regime definido no código de valores imobiliários.
Refira-se o princípio de cooperação entre o Estado e os concessionários de serviço público e os demais operadores de televisão, na prossecução dos valores da pessoa humana, do Estado de direito, da sociedade democrática e da coesão nacional, da promoção da língua portuguesa e das necessidades de certas categorias de espectadores. Abre-se, assim, caminho à colaboração e intercâmbio entre operadores, designadamente no âmbito do fornecimento de conteúdos para os canais internacionais, no apoio à produção independente e na abertura de janelas de serviço público nos operadores privados.
Em lugar paralelo, é de realçar a estatuição de obrigações gerais para todos os operadores de televisão, sejam eles públicos ou privados e quer actuem ou não ao abrigo de concessão de serviço público de televisão.
Destas regras, ressalta para além da imposição do cumprimento das obrigações legal e constitucionalmente exigidas - v.g. as relativas a direitos de antena, réplica política, resposta e rectificação - aquela que deve ser uma pedra basilar da actuação de todos os operadores, ou seja, a da exigência de uma ética de antena consistente na sua programação que garanta, nomeadamente através de práticas de auto-regulação, o respeito pela dignidade da pessoa humana e pelos demais direitos fundamentais como protecção dos pontos mais vulneráveis, em particular das crianças e dos jovens. Ainda neste âmbito, importa salientar o reforço da regulação em matéria de conteúdos, tendo em atenção particularmente a livre formação da personalidade das crianças e adolescentes e a protecção de outros públicos sensíveis. Estabelece-se, assim, a proibição de toda a programação que incite ao ódio, ao racismo e à xenofobia ou que atribua relevo indevido à violência ou contenha conteúdos pornográficos em sinal aberto.
Por outro lado, e atendendo à necessidade de adequar a previsão legislativa à vivência comum da sociedade, altera-se para entre as 24:00 e as 6:00 o período em que é possível a difusão de outra programação que possa ainda assim influir negativamente os referidos públicos.
No tocante ao serviço público e às obrigações específicas que recaem sobre os respectivos operadores, respeitou-se o seu desenho o modelo constitucional, reafirmando-se a obrigação de o Estado assegurar a existência e funcionamento do serviço público de televisão, redefinindo-se as obrigações específicas que recaem sobre os operadores desse serviço, concretizando e actualizando a sua formulação, abrindo assim espaço para o rigor na sua implementação e para uma eficaz fiscalização do seu cumprimento.
Assim, e em articulação com o novo modelo de financiamento proposto, acompanha-se as preocupações da União Europeia em matéria de auxílios estatais ao serviço público de radiodifusão.
Cometem-se, pois, àqueles operadores especiais responsabilidades qualitativas, no tocante ao dever de assegurar uma programação de qualidade, equilibrada e diversificada, que contribua para a formação cultural e cívica dos telespectadores, promovendo o pluralismo político, religioso, social e cultural e o acesso de todos os públicos à informação, à cultura, à educação e ao entretenimento de qualidade.
Obrigações estas que são particularizadas e especificadas em relação a todos os aspectos em que se desenvolvem e que serão ainda mais afinadas nos respectivos contratos de concessão.
No que respeita à concessão de serviço público de televisão, a ideia central assenta na dicotomia concessão geral/concessão especial.
No que respeita à concessão geral de serviço público, a mesma é atribuída à Rádio e Televisão de Portugal, SGPS, S.A., e inclui, necessariamente, três serviços de programa: um serviço de programa generalista; um serviço de programa para telespectadores de língua portuguesa residentes no estrangeiro; e um serviço de programa para os países de língua oficial portuguesa. Ao lado destes, admite-se ainda a inclusão, nesta concessão geral, de mais dois serviços de programa, visando a transmissão do acervo documental proveniente dos arquivos da Rádio Televisão Portuguesa, S.A., e a transmissão de temas vocacionados para as comunidades regionais e locais. Estes serviços de programas serão explorados, directa ou indirectamente, pela RTP Serviço Público de Televisão, S.A.