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9 | II Série A - Número: 008 | 30 de Setembro de 2010

características, consideradas relevantes, só tem valor e interesse para a sociedade em geral, sua destinatária principal, se esse mesmo registo estiver conforme à realidade. Se do registo constar algo que não tenha correspondência com a realidade, ele torna-se, em vez de um factor de estabilidade social, um elemento de conflito, porque enganoso. Acrescenta ainda que o que releva socialmente é o seu comportamento, o modo como se vê frente aos outros seres humanos, particularmente no domínio do relacionamento em função do sexo, e da forma como é visto pelos outros. E termina, afirmando: por não existir obstáculo negativo à mudança de sexo, para que o registo continue a cumprir o seu papel de dar publicidade aos factos relevantes da sã convivência social, por forma verdadeira, entende-se que se observa o espírito do sistema criando uma norma que permita a alteração do assento de nascimento, por averbamento, no que se refere ao requisito especial do sexo, sempre que ocorra mudança físico-anatómica do sexo da pessoa cujo nascimento foi anteriormente registado.
Segundo a exposição de motivos da presente iniciativa, o Tribunal da Relação de Lisboa salienta que tais princípios fundamentais estão presentes não só na Constituição da República Portuguesa, mas também nos textos internacionais a que Portugal se encontra vinculado, tais como a Declaração Universal dos Direitos do Homem9, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem10 e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos11.
A presente iniciativa visa criar um quadro jurídico que defina as condições de acesso à mudança do registo de sexo e do nome do registo civil. Para o efeito apresenta uma proposta de alteração dos artigos 69.º, 104.º e 123.º do Código do Registo Civil12 e, em simultâneo, uma proposta de aditamento ao mesmo Código dos artigos 104.º-A e 104.º-B.

Enquadramento do tema no plano europeu União Europeia O Tratado de Lisboa (artigo 6.º TUE) confere à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia o mesmo valor jurídico que aos tratados, sendo que aquela consagra no seu artigo 20.º o princípio da igualdade perante a lei e no artigo 21.º, n.º 1, que «É proibida a discriminação em razão, designadamente, do sexo, raça, cor ou origem étnica ou social, características genéticas, língua, religião ou convicções, opiniões políticas ou outras, pertença a uma minoria nacional, riqueza, nascimento, deficiência, idade ou orientação sexual».
Neste sentido, a jurisprudência13 do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias tem sustentado que o direito de não discriminação em razão do sexo constitui um dos direitos fundamentais da pessoa humana, cujo respeito incumbe ao Tribunal de Justiça garantir. Assim, o âmbito de aplicação das directivas relativas à igualdade de tratamento entre homens e mulheres não pode ser reduzido apenas às discriminações decorrentes do facto de pertencer a um ou a outro sexo. Com efeito, estas directivas destinam-se igualmente a ser aplicadas às discriminações que têm a sua origem na mudança de sexo.
No mesmo sentido, a Comissão Europeia entende que, apesar de não existir qualquer regulação específica sobre pessoas transexuais, a legislação europeia relativa à igualdade entre homens e mulheres se lhes aplica14.
Neste âmbito, o relatório sobre a avaliação dos resultados do roteiro para a igualdade entre mulheres e homens 2006-201015, da autoria da Deputada ao Parlamento Europeu Ilda Figueiredo, e aprovado em 17 de Junho de 2010 pelo Parlamento Europeu, requer a adopção de medidas específicas por parte do Conselho, da Comissão e dos Estados-membros da União Europeia, designadamente através de «uma campanha destinada a sensibilizar para a discriminação das pessoas transgénero e a melhorar o acesso das mesmas a vias de recurso».

Enquadramento internacional: A legislação comparada é apresentada para os seguintes países: Bélgica, Canadá (Québec), Espanha e Itália.
9 http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhuniversais/cidh-dudh.html 10 http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhregionais/conv-tratados-04-11-950-ets-5.html 11 http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhuniversais/cidh-dudh-direitos-civis.html 12http://arnet/sites/DSDIC/DILP/DILPArquivo/Notas_Tecnicas/XI_Leg/PJL/PJL_319_XI/Doc_Anexos/Portugal_1.docx 13 Cfr. Acórdão do Tribunal de Justiça de 30 de Abril de 1996 no caso C-13/94 (P.V.S./Cornwall County Council) in http://www.equalrightstrust.org/ertdocumentbank/Microsoft%20Word%20-%20P%20v%20S.pdf e Acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2006 (Sarah Margaret Richards/Secretary of State for Work and Pensions) in http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2006:143:0013:0013:PT:PDF 14 Nesse sentido, cfr. resposta da Comissão à pergunta n.º 3542/97 formulada pelo Deputado ao Parlamento Europeu James Moorhouse in Official Journal C 158, 25/05/1998, p. 0147 15http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+REPORT+A7-2010-0156+0+DOC+XML+V0//PT#title2