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14 | II Série A - Número: 008 | 30 de Setembro de 2010

Segundo os Professores Jorge Miranda e Rui Medeiros, na sua expressão mais simples a protecção da integridade física e moral consiste no direito a não agressão ou ofensa ao corpo ou espírito, por quaisquer meios (físicos ou não). Consagra-se assim uma tutela constitucional firme, quer contra quaisquer ofensas à integridade física — independentemente da sua gravidade (Acórdão n.º 616/98) — quer contra violações do direito à integridade moral — consubstanciadas, designadamente, em quaisquer formas de denegrir a imagem ou o nome de uma pessoa ou de intromissão na sua intimidade, seja com fundamento em razões de ordem económica, condição social, nível de instrução seja ainda por razões raciais, profissionais, sexuais, religiosas, políticas ou outras3.
O artigo 26.º4 da Constituição da República Portuguesa consagra ainda outros direitos pessoais. O n.º 1 determina que a todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação5.
Efectivamente, no âmbito normativo do direito à identidade pessoal inclui-se o direito à identidade pessoal.
Os Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira, em observação em este artigo da Constituição, sublinham que é problemático saber se este direito consiste apenas no direito de conservar e proteger a identidade pessoal ou se consiste também no direito de mudar de identidade (caso de mudança de nome e de estado civil por efeito de mudança de sexo, etc.). Não é líquido, porém, o direito do indivíduo que mudou de sexo ao «carácter secreto da transmutação», proibindo-se qualquer menção do facto no registo de nascimento6.
De referir também, ainda sobre este artigo, as observações dos Professores Jorge Miranda e Rui Medeiros: a identidade pessoal é aquilo que caracteriza cada pessoa enquanto unidade individualizada que se diferencia de todas as outras pessoas por uma determinada vivência pessoal. Num sentido muito amplo, o direito à identidade pessoal abrange o direito de cada pessoa a viver em concordância consigo própria, sendo, em última análise, expressão da liberdade de consciência projectada exteriormente em determinadas opções de vida. (»). A identidade pessoal protege também a identidade civil. Existe certamente um direito ao nome.
Poderá perguntar-se se haverá também um direito a mudar de nome e quais os seus limites. Têm-se levantado, a este respeito, problemas específicos nos casos em que houve uma modificação anatómica do sexo através de operação. Nesses casos, o nome pelo qual a pessoa se identifica não coincide com o género da pessoa. A identidade civil só será uma expressão da identidade pessoal se com ela coincidir. Na ausência de razões contrárias atendíveis, o direito à identidade pessoal parece postular que se possa mudar de nome, não sendo admissível que uma pessoa com um determinado sexo tenha que se identificar civilmente com um nome do sexo oposto7.
No Acórdão de 22 de Junho de 20048, proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, pode ler-se: compreende-se perfeitamente que a Lei Registal Civil tenha elevado à categoria de requisito especial, entre outros, o sexo. Ora, o registo, enquanto forma de dar publicidade a certos factos, deles constando certas características, consideradas relevantes, só tem valor e interesse para a sociedade em geral, sua destinatária principal, se esse mesmo registo estiver conforme à realidade. Se do registo constar algo que não tenha correspondência com a realidade, ele torna-se, em vez de um factor de estabilidade social, um elemento de conflito, porque enganoso. Acrescenta ainda que o que releva socialmente é o seu comportamento, o modo como se vê frente aos outros seres humanos, particularmente no domínio do relacionamento em função do sexo e da forma como é visto pelos outros. E termina, afirmando que à guisa de conclusão dir-se-á que, por não existir obstáculo negativo à mudança de sexo, para que o registo continue a cumprir o seu papel de dar publicidade aos factos relevantes da sã convivência social, por forma verdadeira, entende-se que se observa o espírito do sistema criando uma norma que permita a alteração do assento de nascimento, por averbamento, no que se refere ao requisito especial do sexo, sempre que ocorra mudança físico-anatómica do sexo da pessoa cujo nascimento foi anteriormente registado. 3 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo I. Coimbra Editora, 2006, págs. 268 e 269.
4 http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx#art26 5 O artigo 26.º da Constituição da República Portuguesa sofreu alterações introduzidas pela Lei Constitucional n.º 1/82 (que também alterou a numeração, tendo passado de 33.º a 26.º), Lei Constitucional n.º 1/89, Lei Constitucional n.º 1/97, e finalmente, pela Lei Constitucional n.º 1/2004.
6 In: CANOTILHO, J.J. Gomes e MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada - Volume I. Coimbra Editora, 2007, pág. 463.
7 In: MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada – Tomo I. Coimbra Editora, 2006, pág. 285.
8 http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/0/2334dbc0a7d80b7d80256f7100530dcc?OpenDocument