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20 DE AGOSTO DE 2014

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suas quotizações – a frustração da confiança das gerações mais velhas, beneficiárias atuais do sistema que

financiam, puder aparecer como questão constitucionalmente neutra, indiferente ou irrelevante, nenhuma

razão terão elas próprias (as gerações presentes de contribuintes) para confiar na subsistência do modelo

para o qual contribuem. Ainda por este motivo, a inexistência de uma tutela forte das «expectativas legítimas»

dos pensionistas à não redução do montante das suas pensões parece não ser de aceitar.

24. A redução definitiva do montante de pensões em pagamento é justificada, na exposição de motivos que

acompanhou a proposta de lei apresentada à Assembleia da República, precisamente pelas exigências

decorrentes do “contrato entre gerações”. E é-o a um triplo título: primeiro, porque, diz-se, esse contrato não

será cumprido se a disciplina orçamental a que está obrigado o Estado português não for satisfeita; segundo,

porque, diz-se, esse contrato não será cumprido se a questão da sustentabilidade do sistema de segurança

social não for, no presente, resolvida; terceiro, porque, diz-se, esse contrato não será cumprido se a geração

presentemente beneficiária do sistema (os atuais pensionistas) não contribuir ela própria, no momento atual,

para o financiamento do sistema. Assim se fundamenta portanto que a medida de redução definitiva das

pensões já em pagamento seja tida pelo legislador como uma contribuição de sustentabilidade.

O Tribunal não pode deixar de reconhecer o relevante peso que, à luz da Constituição, detém cada um

destes fundamentos. Se a consistência dos direitos afetados é, nos termos dos parâmetros aplicáveis,

acentuada, não o será menos a consistência da necessidade da sua afetação, dada a relevância dos direitos

ou interesses, também eles constitucionalmente protegidos, que, de acordo com a exposição de motivos

apresentada à Assembleia da República, a justificam. O ponto é determinante, uma vez que o método da

ponderação, atrás explicitado, não pode ser com rigor aplicado se se não tiver em linha de conta o peso

específico que possui cada uma dos elementos a ponderar. Sendo intenso o grau de não satisfação de um

princípio constitucional (neste caso, o princípio segundo o qual devem ser protegidas as legítimas expectativas

dos pensionistas ao recebimento de um benefício definido e adquirido ao abrigo de Direito anterior), mais

intensa terá ainda que ser a razão que justifica essa não satisfação. Quer isto dizer que a afetação dos direitos

dos pensionistas só poderá, neste caso e à luz da Constituição, ser desconsiderada, se se mostrar que ela é

necessária para satisfazer “direitos e interesses constitucionalmente protegidos que se devam considerar

prevalecentes”.

E não há dúvidas quanto à relevância constitucional que assume a imperatividade de realização de

políticas públicas que assegurem a disciplina orçamental, tal como esta última é imposta à República, desde

logo, pelo Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e pelo Tratado sobre Estabilidade, Coordenação

e Governação na União Económica e Monetária, bem como pelas demais normas de direito externo ao Estado

português e de direito interno que concretizam as obrigações implícitas à referida disciplina. Está em causa,

neste domínio, não apenas o cumprimento leal do dever, constitucionalmente assumido, de “empenhamento”

de Portugal “no reforço da identidade europeia” (artigo 7.º, n.º 5, da CRP), mas ainda o cumprimento leal do

dever que as gerações presentes assumem perante as gerações futuras, dever esse que se traduz em impedir

a existência de uma dívida pública que, onerando e pré-determinando as suas escolhas, diminua a capacidade

que não podem deixar de ter essas mesmas gerações de se conduzir nos termos prescritos, desde logo, pelos

artigos 1.º e 2.º da Constituição.

As exigências decorrentes deste último ponto, que diz respeito ao cumprimento leal do contrato entre

gerações que a subsistência da ordem constitucional portuguesa (como a de qualquer outra) pressupõe,

fazem-se sentir de forma ainda mais premente na necessidade, também invocada na exposição de motivos da

proposta apresentada à Assembleia, de encontrar soluções para o problema da sustentabilidade do sistema

de segurança social, sobretudo na sua vertente de sistema previdencial.

Na verdade, um modelo jurídico que rigidamente mantenha, neste domínio, as soluções pensadas pelo

Direito definido no passado, pode traduzir-se num trato injusto entre as gerações atuais de beneficiários do

sistema previdencial e as gerações que compõem, no presente, a população ativa portuguesa, e que, através

das suas “quotizações” e “contribuições”, garantem na atualidade o financiamento do modelo previdencial tal

como ele existe. Numa circunstância histórica em que constrangimentos de ordem económica (a perda de

receitas desse mesmo sistema, causada pelo aumento do desemprego e pelos fluxos migratórios) e

constrangimentos de ordem demográfica (o aumento de esperança média de vida e a diminuição da

natalidade) determinam o desequilíbrio financeiro de um sistema que foi concebido, enquanto sistema

harmonioso e justo, num diferente contexto, há que ter em linha de conta que a proteção da confiança