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16 DE MARÇO DE 2021

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assistida não punível a que ocorre por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada,

séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento intolerável, com lesão definitiva de gravidade extrema de

acordo com o consenso científico ou doença incurável e fatal, quando praticada ou ajudada por profissionais

de saúde e concretizada mediante pedido que obedece a procedimento clínico e legal (previsto no Decreto).

Este recorte ou entendimento permite ao Tribunal analisar a conformidade de tal norma com a Constituição,

incluindo o parâmetro do direito à vida, consagrado no respetivo artigo 24.º, n.º 1, o qual o próprio requerente

não deixa de invocar quando, ao enunciar (negativa e positivamente) o objeto do recurso, refere «tratar-se de

matéria que se situa no core dos direitos, liberdades e garantias, por envolver o direito à vida e a liberdade da

sua limitação, num quadro de dignidade da pessoa humana»; e, outrossim, mais adiante, na conclusão, ao

fazer referência «à amplitude da liberdade de limitação do direito à vida, interpretado de acordo com o

princípio da dignidade da pessoa humana, conforme decorre da conjugação do artigo 18.º, n.º 2,

respetivamente, com os artigos 1.º e 24.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa» (cfr. o ponto 3.º do

requerimento e a conclusão); ou, ainda, quando afirma que a «insuficiente densificação normativa não parece

conformar-se com a exigência constitucional em matéria de direito à vida e de dignidade da pessoa humana»

(requerimento, ponto 9.º).

13. Também as concretas questões de constitucionalidade suscitadas pelo requerente – e sobre as quais o

Tribunal tem o dever de se pronunciar nesta sede – com base na alegação de uma insuficiente densificação

normativa dos critérios por si identificados em função de parâmetros como os princípios da legalidade e da

tipicidade criminal, consagrados nos artigos 29.º, n.º 1, e 112.º, n.º 5, da Constituição, só têm sentido à luz da

prescrição ínsita no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto: o grau de determinabilidade exigível aos conceitos

expressamente referidos na parte inicial do requerimento e ao longo da respetiva fundamentação – e, antes

disso, o próprio sentido e alcance normativo-jurídico dos mesmos – só é inteligível à luz da função dos

pressupostos ou critérios que tais conceitos visam exprimir. Ou seja, os mesmos só correspondem a

«critérios», porque estão associados à condição de produção de certos efeitos jurídicos (in casu, trata-se de

pressupostos essenciais da não punição da assistência à morte medicamente assistida; considerados como

meros enunciados linguísticos, os conceitos em apreço limitam-se a descrever a realidade empírica, sem

qualquer relevância jurídica. Por outro lado, na dogmática jusadministrativa – pertinente in casu, desde logo

em razão da intervenção necessária no procedimento clínico e legal de uma entidade pública, como é o caso

da CVA, mediante a emissão de parecer (cfr. os artigos 7.º, n.os

1 e 4, 23.º, 24.º e 25.º, n.º 1, todos do Decreto

n.º 109/XIV) – a indeterminação normativa decorrente da utilização de certas expressões é relevante para

efeitos de saber se o legislador pretendeu ou não atribuir uma margem de livre apreciação – e, em caso

afirmativo, quais os limites da mesma – e tal conclusão depende da interpretação da norma em que tais

conceitos se integram (cfr., por todos, Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. II, 3.ª ed.,

Almedina, Coimbra, 2016, pp. 93 e ss., maxime p. 100: só «em concreto, por interpretação da lei se pode

determinar a que tipo se reconduz certo conceito indeterminado»; e Marcelo Rebelo de Sousa e André

Salgado de Matos, Direito Administrativo Geral, tomo I, 3.ª ed., Dom Quixote, Alfragide, 2008, pp. 183 e ss.,

maxime pp. 190-193). Ou seja, o grau de determinabilidade exigível aos conceitos utilizados nos enunciados

linguísticos correspondentes a disposições normativas é função do sentido e alcance das normas em que os

mesmos se integram. Assim, no caso vertente, a determinabilidade dos conceitos expressamente referidos

pelo requerente implica o conhecimento da sua função no quadro da própria previsão da antecipação da morte

medicamente assistida.

B) O horizonte problemático da antecipação da morte medicamente assistida prevista no artigo 2.º,

n.º 1, do Decreto n.º 109/XIV

14. As considerações que antecedem permitem compreender o horizonte problemático em que a não

punibilidade da antecipação da morte medicamente assistida objeto do Decreto n.º 109/XIV se inscreve e torna

mais clara a estratégia argumentativa seguida pelo requerente, em especial no que se refere à intenção

expressa de não discutir «a eutanásia, enquanto conceito» e a questão de saber se a mesma «é ou não

conforme com a Constituição» (requerimento, ponto 3.º).

A verdade é que a antecipação da morte medicamente assistida implica a colaboração voluntária de