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II SÉRIE-A — NÚMERO 97

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contribuir para que a mesma consiga pôr termo à própria vida (v.g., através do fornecimento de uma

substância letal, que é autonomamente ingerida ou injetada pelo próprio suicida). Também esta conduta se

encontra criminalizada em quase todos os Estados a nível mundial, embora existam ordenamentos jurídicos

que demonstrem uma maior tolerância relativamente a esta prática em comparação com a eutanásia ativa

(v.g. Alemanha, Itália, Suíça e, agora, na sequência da referida decisão do Verfassungsgerichtshof, também a

Áustria).

Por fim, importa ainda assinalar que existem outras realidades e conceitos que se encontram intimamente

ligados ao tema da morte assistida. Um deles é a ortotanásia (também conhecida como eutanásia ativa

indireta), referente às intervenções médicas que, embora se destinem a reduzir as dores do paciente,

apresentam o risco de provocar o encurtamento da sua vida. Por sua vez, a distanásia (também designada

como obstinação terapêutica) ocorre quando um paciente é mantido vivo de forma meramente artificial e

desproporcional, através de tratamentos médicos de suporte à vida que retardam uma morte que se afigura

inevitável.

17. Recorde-se que a norma do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto n.º 109/XIV, tal como entendida por este

Tribunal, versa sobre o que, para efeitos da lei, se considera antecipação da morte medicamente assistida não

punível, contendo, na sua estrutura completa, os elementos de previsão e estatuição já antes identificados.

Conforme também já referido, aquele preceito aloja diversas previsões normativas, passíveis de combinação

entre si, todas elas conducentes ao mesmo conceito – que o legislador designa como «antecipação da morte

medicamente assistida» – e todas elas submetidas ao mesmo regime – correspondente aos trâmites e

condições regulados no citado Decreto.

Tomando este quadro complexo por pressuposto, não pode deixar de se precisar que o citado artigo 2.º, n.º

1, configura na respetiva facti species, em alternativa, a antecipação da morte medicamente assistida não

punível i) praticada por profissionais de saúde; ou ii) ajudada por tais profissionais. O legislador, ao tratar e

valorar conjuntamente a vontade de antecipação da morte e os pressupostos em que a mesma pode ser

relevante, com total abstração, até quase ao termo de procedimento preparatório, do modo de execução do

concreto «ato de antecipação da morte» (a expressão surge no artigo 13.º do Decreto n.º 109/XIV), por via da

administração ou da heteroadministração de fármacos letais, tende a estabelecer uma parificação categorial e

normativa entre duas práticas de fim de vida, comummente designadas por eutanásia ativa direta e auxílio ao

suicídio. Na perspetiva legal, está em causa indistintamente o envolvimento do médico orientador e de outros

profissionais de saúde na preparação e na execução do ato de antecipação da morte.

Apesar das diferenças estruturais entre aquelas duas práticas, fundadas no «domínio sobre o ato que de

forma imediata e irreversível produz a morte» (assim, v., por todos, Costa Andrade, «Comentário ao artigo

134.º», §§ 18-24, pp. 105-109, em especial, o § 23, p. 108, in Figueiredo Dias (dir.), Comentário

Conimbricense do Código Penal, tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2012) – mas no regime contido no

citado Decreto, apesar de tudo, muito atenuadas por via da respetiva procedimentalização – , o legislador terá

optado por valorizar os momentos de comunicabilidade entre as mesmas, que também existem, e que, dados

os pressupostos previstos no artigo 2.º, n.º 1, do mesmo diploma, surgem reforçados:

«Estão em causa duas incriminações [– o Homicídio a pedido da vítima, no que se refere à eutanásia ativa;

e o Incitamento e ajuda ao suicídio, no caso do suicídio medidamente assistido –] em cuja área de proteção

parece irrecusável a presença inter alia do propósito de prevenir o perigo (abstrato) de uma decisão apressada

ou precipitada pelo termo da vida. Num caso e noutro sobra por isso problemática a punição do facto em

situações concretas em que aquele perigo perde plausibilidade. Isto é, naquelas situações concretas em que –

à vista da perda irreversível de sentido da continuação da vida, pela iminência irreversível da morte e pelo

caráter incontrolável e insuportável do sofrimento – o exercício da autodeterminação no sentido de pôr termo à

vida se afigura «objetivamente razoável». Em termos tais que o respeito pela dignidade pessoal postula o

respeito pela decisão compreensível do paciente» (assim, v. Costa Andrade, Comentário Conimbricense, cit.,

«Comentário ao artigo 135.º», § 12, p. 139).

Ou seja, desconsiderando em larga medida as diferenças normalmente apontadas, no Decreto n.º 109/XIV

opta-se por tratar e valorar indistintamente aqueles tipos de condutas como uma única modalidade de ação: a

antecipação da morte medicamente assistida.