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II SÉRIE-A — NÚMERO 189

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b) Difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional,

ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência física ou psíquica;

c) Ameaçar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, ascendência,

religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência física ou psíquica; ou

d) Incitar à violência ou ao ódio contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica

ou nacional, ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência física ou

psíquica;

é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.»

Ora, deste preceito resulta que o crime de injúria racial só́ terá consagração legal se cumprir, como

previsto em relação às atividades de organização e propaganda, os requisitos de «publicidade» e

«incitação»8. Como também refere a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), «no que concerne ao

tipo de ilícito objetivo constante do n.º 2 do artigo 240.º, este começa por exigir que a conduta seja

tomada publicamente, através de um meio destinado à divulgação. Assim se exclui do âmbito desta

norma qualquer conduta que, mesmo preenchendo uma das alíneas do n.º 2 do artigo 240.º do Código Penal,

ocorra numa interação entre agressor e vítima que não seja em público ou que, tendo lugar em público,

não seja apta à divulgação». Isto é, uma declaração pública injuriosa não será suficiente para que sejam

preenchidos os elementos deste tipo de crime.

Nesse sentido, Teresa PIZARRO BELEZA afirmou que «o principal problema que se coloca em Portugal

nesta sede [a valoração dos comportamentos criminalizados a título de discriminação racial] é o da aplicação

efetiva das estatuições legais. Como em outros campos, as intenções legislativas não parecem ter grande efeito

prático. Os poucos casos publicamente conhecidos de acusação penal por discriminação racial ou

terminaram em absolvição dada a falta de prova de ‘intenção de incitar à discriminação’, ou levaram à

aplicação de uma pena meramente simbólica. (…) Dado que provar a intenção de incitamento à

discriminação envolve, em alguma medida, a prova do carácter racista de uma pessoa, a proteção das

vítimas através da ameaça penal fica diminuída de forma significativa – dado que em poucos casos será́

viável essa prova.»9

Esta complexidade probatória é particularmente inteligível quando consideramos a escassez de processos

que são julgados segundo o previsto no artigo 240.º do Código Penal, especificamente no que respeita à

discriminação racial. A primeira condenação em Portugal, relacionada com o incitamento à discriminação racial

por difamação, ocorreu em 2002 e teve como arguido o Presidente de uma Junta de Freguesia. A decisão, que

condenou o arguido a uma pena suspensa de nove meses de prisão por dois crimes de discriminação racial,

sustentou-se na Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial,

adotada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 21 de dezembro de 196510,

segundo a qual «a existência de barreiras raciais é incompatível com os ideais de qualquer sociedade humana».

Desde então, a jurisprudência a este respeito é praticamente inexistente. Entre 2017 e 2019 não foi proferida,

em 1.ª instância, qualquer sentença condenatória fundamentada no artigo 240.º do Código Penal11.

Uma paradigmática decisão judicial que revelou as falhas da lei portuguesa no que concerne à consideração

da motivação discriminatória ou de ódio do autor na prática de determinada infração criminal foi a decisão

proferida pelo Tribunal Coletivo do Juízo Central Criminal de Sintra em maio de 201912 (e posteriormente

confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa) quanto aos 17 agentes da Esquadra de Intervenção e

Fiscalização Policial (EIFP) da Divisão da Amadora da Polícia da Segurança Pública acusados pelos crimes de

injúria, ofensa à integridade física qualificada, sequestro agravado, denúncia caluniosa e falso testemunho, num

caso que ficou conhecido como «o caso da Esquadra de Alfragide». Oito dos arguidos neste processo foram

condenados por estes crimes, tendo apenas um sido condenado a pena de prisão efetiva, e os demais a pena

suspensa. Na sua acusação, o Ministério Público afirmou que, nas 72 horas que estiveram à guarda desta

8 Silvia Rodríguez Maeso (coord.), Ana Rita Alves, Sara Fernandes e Inês Oliveira, ob. Cit., p. 17. 9 Teresa Pizarro Beleza, Desenvolvimentos recentes da legislação portuguesa antidiscriminação, 2003. 10 Pode ser lida em: https://dre.pt/application/file/a/606789. 11 Informação extraída do «Memorando sobre o combate ao racismo e à violência contra mulheres em Portugal» da Comissária para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, março 2021. Acessível em: https://rm.coe.int/memorando-sobre-o-combate-ao-racismo-e-a-violencia-contra-mulheres-em-/1680a1e2ad. 12 Processo 29/15.4PAAMD do Tribunal Coletivo do Juízo Central Criminal de Sintra.