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II SÉRIE-A — NÚMERO 180

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sexuais.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 25 de janeiro de 2023. Foi admitido a 26 de janeiro e, por

despacho do Presidente da Assembleia da República, baixou, na fase da generalidade, à Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª). O seu anúncio ocorreu na reunião plenária do dia 1 de

fevereiro de 2023, tendo a signatária deste parecer sido designada como relatora.

O projeto de lei foi apresentado nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156, do n.º 1 do artigo

167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea b) do

n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). A iniciativa cumpre

os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Em 1 de fevereiro de 2023, foram solicitados pareceres ao Conselho Superior do Ministério Publico, ao

Conselho Superior da Magistratura, à Ordem dos Advogados e à APAV, podendo ser consultados a todo o

tempo na página do processo legislativo da iniciativa, disponível eletronicamente. Até ao momento foi apenas

recebido o parecer da APAV.

I. b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

Nos exatos termos da nota técnica, «a presente iniciativa, não obstante a abrangência do seu título, visa

alterar a natureza do crime de violação, tornando-o crime público, e, complementarmente, atribuir mais direitos

às vítimas no âmbito do respetivo procedimento criminal.

Os proponentes citam o Relatório Anual de Segurança Interna, constatando que, em 2021, se verificou um

aumento de 26 % dos crimes de violação — num total de 397 —, ultrapassando a média anual dos últimos sete

anos, e elencam os demais dados estatísticos relativamente a este ilícito penal, nomeadamente que 94 % das

vítimas são mulheres, que em 77 % dos casos existia uma relação de proximidade com o agressor — familiar,

laboral ou relacional — e que, de acordo com um inquérito realizado em 2014, a nível europeu, 86 % dos casos

não são denunciados.

Aludem ao entendimento da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) quanto às razões que podem

explicar o diminuto número de queixas: o núcleo delicado da intimidade pessoal, o receio de descrédito pelo

sistema judicial, pelas estruturas de apoio e pela família e a desvalorização social da violência sexual patente

na culpabilização da vítima e na desresponsabilização parcial do agressor.

Mencionam ainda a conclusão de um estudo, de 2016, divulgado pelo Eurobarómetro da Comissão Europeia,

segundo o qual 29 % dos portugueses inquiridos considera justificável o sexo sem consentimento nos casos em

que a vítima está sob efeito de álcool ou drogas, veste algo «revelador», tem múltiplos parceiros e/ou circula

sozinha à noite, constatando os proponentes que ainda há um longo caminho a percorrer em matéria de

igualdade de género e salientando a importância de se reforçar a proteção das vítimas do crime de violação

como forma dissuasora da sua prática.

Assim, entendendo que tal teria consequências positivas ao nível da prevenção geral e especial, apontando

que o prazo de seis meses para apresentação de queixa não se coaduna com o tempo de que as vítimas

necessitam para se sentirem capacitadas para o efeito e invocando o dever de o Estado português dar

cumprimento à Convenção de Istambul1, a qual ratificou, propõem que se consagre a natureza pública do crime

de violação, previsto e punido pelo artigo 164.º do Código Penal (CP), alterando, para o efeito, os n.os 1 e 2 do

artigo 178.º do CP, retirando-o do elenco dos ilícitos penais cujo procedimento criminal depende de queixa.

Adicionalmente, tendo em vista conferir uma maior proteção às vítimas do crime de violação, em concreto

com o intuito de evitar a sua revitimização, propõem a consagração:

− da faculdade de a vítima requerer a suspensão provisória do processo, alargando, para o efeito, o regime

especial previsto no n.º 8 do artigo 281.º do Código de Processo Penal (CPP) a propósito do crime de violência

doméstica ao crime de violação;

− da obrigatoriedade de prestação, no decurso do inquérito, de declarações para memória futura sempre

1 Em conformidade com o disposto no seu artigo 27.º: «As Partes tomarão as medidas necessárias para encorajar qualquer pessoa que testemunhe o cometimento de actos de violência cobertos pelo âmbito de aplicação da presente Convenção, ou que tenha razões sérias para acreditar que tal acto pudesse ser cometido ou que são expectáveis novos actos de violência, a que os assinale às organizações ou autoridades competentes.»