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II SÉRIE-A — NÚMERO 240

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longe de lhes reconhecer direitos de forma efetiva.

De acordo com um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade de Lisboa – «Literacia

em Saúde e Qualidade de Vida dos Cuidadores Informais – a realidade portuguesa» –, publicado

recentemente e realizado no âmbito do projeto «Saúde que Conta», 85 % dos cuidadores não beneficiam do

Estatuto do Cuidador Informal e 93,5 % não usufruem do serviço de descanso do cuidador. Mais de metade,

cerca de 51,1 % não recebe qualquer apoio.

A situação é insustentável. Sobrecarregar cuidadores informais até ao limite e permitir o aparecimento sem

regras do mercado, nomeadamente o clandestino, não é democraticamente aceitável. Do mencionado estudo

resultam estimativas que apontam para a existência de cerca de 827 mil cuidadores informais.

O Estatuto do Cuidador Informal, aprovado pela Lei n.º 100/2019, de 6 de setembro, pretendia dar algumas

respostas e garantir direitos a quem cuida e à pessoa cuidada. No entanto, o modo como está a ser aplicado

boicota o alcance desta política pública. Várias das dimensões previstas na lei – como o acesso em condições

especiais à Rede Nacional de Cuidados Continuados e Integrados, o reforço do apoio domiciliário para

descanso ao cuidador, o apoio psicológico, – nunca saíram do papel.

Por esse motivo, foi publicada uma iniciativa legislativa de cidadãos (ILC), promovida pela Associação

Nacional de Cuidadores Informais (ANCI), que tem como objetivo essencial promover a revisão do Estatuto do

Cuidador Informal.

Na exposição de motivos desta ILC são identificadas várias preocupações, como: «O reconhecimento do

estatuto de cuidador informal deixa de ficar dependente de a pessoa cuidada ser titular de complemento por

dependência ou subsídio para assistência a terceira pessoa; Reconhecimento do direito de descanso ao

cuidador não inferior a 58 dias úteis por ano; Dispensa do pagamento de taxas pela pessoa cuidada no

ingresso em unidades no âmbito do RNCCI, nos casos em que tal se destine a assegurar o descanso do

cuidador; O subsídio de apoio ao cuidador informal a tempo completo deixa de estar sujeito a condição de

recursos; Majoração do subsídio de apoio ao cuidador informal a tempo completo correspondente a 100 % do

valor das contribuições que incidem sobre o primeiro dos escalões relativos ao seguro social voluntário», às

quais o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda adere na sua totalidade.

O cuidado ainda não foi definido como um direito, nem como uma responsabilidade coletiva. Não foi criada

uma resposta democrática para o envelhecimento e para o aumento da dependência. O modelo de cuidados

em execução consiste numa externalização para as famílias e para instituições do setor social, sem que o

Estado assuma o seu papel na provisão de cuidados. É mantida uma colossal desigualdade de género neste

campo e um mercado que tem nos cuidados clandestinos uma das suas mais inquietantes expressões.

Na ausência de cuidados profissionais financiados pelo Estado, resta a quem tem menos recursos a

sobrecarga da família ou os lares clandestinos. Sucedem-se as denúncias da ausência de condições e de

cuidados a idosos em instituições privadas e que são reflexo de 1) um profundo vazio de políticas públicas

capazes de dar uma resposta pública adequada e 2) ao facto de o Estado ter permitido – através da delegação

de competências que são suas – a prestação de cuidados nos lares protocolados com o Instituto de

Segurança Social (ISS), cujos apoios públicos ascendem a vários milhões de euros por ano, o que conduziu

ao surgimento do negócio dos cuidados.

A área dos cuidados é das que mais tem criado emprego, mas num modelo precário. O Bloco de Esquerda

defende que se repense profundamente a política pública de provisão de cuidados. Para isso, propõe a

criação de um serviço nacional de cuidados, que garanta um serviço público de cuidados em todo o território,

com profissionais qualificados, com salários dignos, de acesso universal, financiado pela solidariedade

nacional através do orçamento do Estado.

Este serviço deve começar pela criação de respostas públicas nas tipologias que a lei já prevê (creches,

centros de dia, centros de noite, estruturas residenciais para pessoas idosas, apoio domiciliário, centros

comunitários, centros de atividades ocupacionais, unidades de cuidados continuados, equipas de cuidados

paliativos, entre outros), a partir da identificação das zonas com maior carência de resposta. Deve assegurar a

articulação entre os serviços de saúde, educação e a segurança social. O Serviço Nacional de Cuidados deve

ainda tutelar as respostas aos cuidadores e cuidadoras informais, concretizando todas as dimensões em falta

no Estatuto dos Cuidadores Informais e promover um plano de desinstitucionalização que passe pela

construção e pelo financiamento de novas respostas assentes na autonomia das pessoas e na sua associação

cooperativa, entre as quais, a criação de uma bolsa nacional de assistentes pessoais, com base no modelo de