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25 DE OUTUBRO DE 2023

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Não negando que a opção por um quadro de incentivos à aquisição de casa própria permitiu níveis inéditos

de acesso das famílias a uma habitação, e em condições financeiramente compatíveis com os seus rendimentos,

a verdade é que tal opção não salvaguardou uma política universal de acesso à habitação, nem parece ter

tornado a habitação – do ponto de vista do seu preço – menos onerosa e, nessa medida, mais acessível.

O que significa que, do ponto de vista dos apoios públicos (sob a forma de benefícios fiscais e bonificação

do crédito), se tratou no essencial de transferir, para o Estado, uma parte dos encargos de parte das famílias

com a aquisição de casa própria, sem que o preço da habitação, e os resultados do setor imobiliário, se tenham

alterado. Por outras palavras, as políticas de apoio à aquisição de casa própria contribuíram para um maior

acesso à habitação por parte das famílias, mas não asseguraram, como seria expectável, uma maior

desmercadorização desse bem, ao contrário do que sucedeu, a partir de 1974, com os setores da saúde ou da

educação.

Aliás, uma dinâmica idêntica, e que no essencial se limita ao financiamento público da oferta (sem que daí

resulte a redução de valores), tende a verificar-se também no caso dos incentivos e apoios ao arrendamento4.

2. Do «ajustamento» estrutural à nova crise de habitação

A crise financeira de 2008, cuja genealogia é indissociável da crescente imbricação, à escala global, entre a

habitação e o setor financeiro – pelas perspetivas que o imobiliário oferece em termos de rentabilização dos

investimentos e aplicação de fundos – teve um impacto assinalável nas finanças públicas e na dívida soberana

de diferentes países, conduzindo à implementação de programas de austeridade.

No caso português, e no que diz respeito ao setor da habitação, o memorando de entendimento assinado

com a troika5 estabeleceu um compromisso assente em três vertentes essenciais: a adoção de medidas

orientadas para a liberalização do mercado habitacional, o incremento da reabilitação e do arrendamento urbano

e a redução do endividamento privado que a aquisição de casa própria tinha alavancado.

Nestes termos, foram adotadas neste período quatro medidas essenciais. Por um lado, e visando um

aumento de colocação de fogos no mercado, a aprovação, em 2012, de uma reforma do Novo Regime de

Arrendamento Urbano (NRAU) e a redução das exigências na reabilitação do edificado (2013)6. Por outro, em

2014, a aprovação de legislação orientada para a liberalização dos usos da habitação (numa perspetiva de

enquadramento do alojamento local, para fins turísticos), a que acresce a criação de condições para a captação

de investimento estrangeiro no mercado imobiliário português, nomeadamente com o regime dos vistos gold e

o Estatuto de Residentes Não Habituais. O défice de oferta habitacional pública, que já na altura colocava

Portugal na cauda da Europa, não foi, portanto, encarado pela troika, por exclusão de partes, como um problema

e uma prioridade da política de habitação, num contexto de «ajustamento» estrutural.

O facto é que estas alterações contribuíram, a par das maiores dificuldades no acesso ao crédito neste

período e da intensificação posterior da procura – especialmente da procura estrangeira e turística, em particular

nas grandes cidades – para a tendência de aumento dos encargos com a habitação. Com efeito, se o respetivo

índice de preços regista uma descida até 2013, em boa medida explicado pelo contexto de crise e da retração

do setor, a partir desse ano inicia-se uma trajetória de subida que distancia o país, cada vez mais, do valor

registado à escala da União Europeia (UE27).

De facto, as dinâmicas de internacionalização do investimento no imobiliário (com políticas ativas de incentivo

a esse investimento), a par do impacto associado ao aumento da procura turística do nosso País,

desencadearam uma pressão sobre os preços que tornaria a habitação num bem cada vez menos acessível a

um número crescente de famílias. E isto sem que a resposta ao nível das políticas habitacionais, nomeadamente

as associadas à NGPH, cujos resultados são, por natureza, de tempo longo, pudessem começar a surtir o seu

efeito.

4 De que é exemplo, neste período, o Incentivo ao Arrendamento Jovem (IAJ), criado em 1992 e que seria mais tarde substituído pelo programa «Porta 65 – Arrendamento por Jovens», aprovado em 2007. 5 Cf. Memorandum of Understanding on Specific Economic Policy Conditionality (https://ec.europa.eu/economy_finance/eu_borrower/mou/ 2011-05-18-mou-portugal_en.pdf). 6 O NRAU tinha essencialmente em vista, mediante restrição dos direitos dos inquilinos, facilitar e dar celeridade aos despejos e, desse modo, dinamizar o mercado de arrendamento. Na mesma linha, a suavização das regras de na reabilitação do edificado tinha em vista, essencialmente, tornar as operações menos onerosas e menos morosas, incentivando a melhoria do parque habitacional e a disponibilização de fogos devolutos.